Satã

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Satã

Ei-lo, obumbra a sânie lisa,
Míngua de soluços dolorosos,
Corno dos exórdios chorosos
Soluços pitorescos que giza.

Contemplativas, ó sacrílego,
Formidolosas contemplativas,
Idéias, compêndios, inativas
Castas, extremoso coligo...

Conglobadas noções pitorescas,
Ah Funesto pancalismo imundo,
Débil, ó sentimento inundo
D'áurea elegíaca funambulesca.

Ó formas, figuradas felozes
Que fanam, fulgurando fiéis
Formas fúlgidas, felosas féis
Formas flamejantes, ferozes.

Indefiníveis flébeis de rasa,
Choro, lamúrias indefiníveis,
Augusto da insânia, eiveis
A'çucena ao mefítico que vaza.

Ah! Horrorosa, esquisita, feia,
Magnífica, avultada, linda,
Tantas formas, formas qu'inda
Pálpebras duvidam sobre teia¹.

Palavras que abismam medonho,
Fracas, fortes, sorumbáticas,
Teogonias imagináveis, áticas,
Escuros, leis, parvo tardonho.

Caveiras, defuntos, fantasmas,
Sarau imprescritível de beleza,
Lésbia lamentosa, delicadeza
De lamentos lesbianos, asnas.

Préstito solene d'um ressupino,
Defeitos, belos e feios defeitos
Criados, vis, molemente feitos
Da ingenuidade, cantos de hino.

Cantante da crença reclinada,
Ululadas por padres idiotas,
Professores da burrice, rota
Abismada e d'cadência assinalada.

Que céu, que inferno, que afã,
Pugilato da fé e pululante,
Que entoada, que desgastante
As limitadas litanias de satã.

Risos, gargalhadas réprobas
Da chafurdaria, gargalhadas,
Ó ridículas, ó exorbitadas
Cachinadas anátemas de probas.

Ó insânia, doudice da doudice,
Tomada p'la lúgubre orbe maldita,
Ó Sofreguidão bonita, bendita
Vida medonha, como a bela dixe².

Ah! Pungente vida fulgente
Purgada. Ah! Vida pungente!
Pungida. De figuradas entes.
Vida, vida punida fedente.

Clamores ridículos do futuro,
Futuro ridículo de clamores,
Ante a fé, de medonhos amores
Molestados do frágil aturo.

Ah finito, finito glorioso,
Eflúvio de essência infinita
Do que é zimbório, que incita
O ímpeto abstruso, lamentoso.

A calma, raiva, interrogações,
Quantidades acerbas, tratadas
De limitações treplicadas...
Languidez, ah! Lamentações

Lamentações lânguidas, funérea.
Sacrossantos versos belizes,
De rimas nevoentas, infelizes,
Pavorosos, de idéias férreas³.

Genuíno de métricas falazes,
Oh podridão falaz, cautelosas
Elocuções verrinas, chorosas
De sentimentos, audazes.

Que nesse entendimento, vã.
Onde tudo vai, onde passa
A esboroada forma da graça
Empunha. Ah! Que seja sã.

Ah! Nas Noutes, nos luares,
Nas formas, na calmaria,
Na felicidade, na melancolia,
No medonho, no degredo de ares.

Na reza embutida de quimera,
Quiméricas palavras sofridas.
Sofrimento d'enganações lidas.
Ilusões bonitas, do que não era.

Evangélicas ubérrimas d'opaco,
Labutas da religião fedorenta,
Oh! Oh! Imaginação lazarenta
D'áurea combinação. Ataco!

Atacante da crença, o tuteles
Da negridão, de idéia suspirada
Por ditas idéias conspiradas.
Assim como eu, tu, Mefistófeles.

Abastados da burrice mórbida.
'Inda gerados da fatuidade;
Maldade, maldade, maldade.
Quanta desagregação, hórrida.

Quando no préstito andar torto,
Defuntos, fantasmas e caveiras
Nela terão fé, na traiçoeira
De tudo que está vivo, morto!

________________________
¹- s. f.
²- s. m.
³- fig.

Comentários

5
Foto de Vera Silva

Gostei do poema e da tua escrita. Parece que te sai tudo fácil!
Confesso que não é um tema que eu goste muito, mas comecei a ler e não consegui parar! Gostei dessa força que colocaste no poema.

Beijinhos

Vera Silva

Vera Silva

http://www.poemas-de-amor.net/blogues/vera_silva

Foto de Stacarca

Oi Vera, obrigado pelo seu comentário genti,l fico feliz que tenha gostado desse meu poema que, tentei mudar um pouco meu estilo, algo parecido com Cruz e Souza, que sem dúvida é e sempre será a minha maior influência. Abraços...

Foto de sunseteli

Meu caro Fábio, há algum tempo não lia uma obra sua porém digo que valeu a pena esperar pois pôde nos legar uma obra "Satã", no caso, muito bem feita e de grande virtuosidade verbal. Belissimos jogos de palavras e rimas, num conteúdo onde você, autor, sugere as coisas sem entregar diretamente, o que dá aquele suspense e faz prender o leitor. De fato, um poema Neo-simbolista, estilo que lembra o nosso Cruz e Souza, mas para chegar num estilo do Grande poeta negro não é muito fácil, e parabenizo-o por ter chegado lá, tenha certeza disso. Parabéns e saudações, um abraço deste admirador de suas poesias, Godi.

Foto de Stacarca

Oi Godi, puxa, muito me contenta ver essa comparação, o cisne negro sempre foi meu poeta favorito, e ver que meu poema o fez lembrá-lo me deixa orgulhoso, obrigado pelo seu comentário. Abraços...
Stacarca

Foto de Salome

Confissões, lamentaçãoes, nos afogando em sua plena escuridão... mas ao mesmo tempo versos intoxicantes que nos hipnotizam com sua audácia...

Fiquei sem folego... Parabens!
Salomé

Salomé

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