Blog de João Victor Tavares Sampaio

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Aninha/Nicoly

Se eu sou adulto e confiante
Se eu sei de tudo e mais um tanto
Então seria mais constante

Posso contar do meu espanto
De encontrar em meu durante
O que depois será recanto

Se eu sou adulto e relevante
Se já perdi o meu encanto
Vou procurar sem ser distante

Doce menção ao acalanto
Minha criança nesse instante
É verdade que garanto
Ser importante

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Muito Além da Rede Globo – Capítulo 16

Domingo. Tempo ensolarado. Dia de jogo na cidade grande. O time local enfrentava uma equipe de menor expressão, promessa de goleada garantida. As famílias se aprumavam sem receio de vestir a camisa de seu clube de preferência. Não havia risco de confusão. Nada sairia do planejado naquele dia. Nenhuma briga tomaria as manchetes de jornal da segunda-feira.
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“Lá vem Armando com a bola, vem na boa, passou pra Lima, voltou, no meio de campo, domina Barbosa, abriu na direita para Patrício, ele avança, tabela com Lima na ponta, segura o lance, caiu, na linha de fundo, cruzou! Pra Luís Maurício de cabeça...! A bola vai entrando...!”

“(GOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOL...!)”
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- E aí vêm saindo os times... Ô, Joel, vem aqui dar uma palavinha pra gente...

O jogador do time pequeno atende a solicitação do repórter.

- Só uma perguntinha, Joel. – o repórter fita com certa maldade velada seu entrevistado derrotado – Como é que você, sendo um profissional do futebol, agüenta todas essas derrotas e humilhações, jogando em uma equipe sem grande tradição, que não conta com os patrocinadores de um grande time, com um plantel limitado tanto no plano técnico como no financeiro, e uma estrutura para o trabalho bastante aquém do aceitável?

O jogador dá um suspiro pelo ofegante do jogo e da questão.

- Olha... Amor e sentimentos não são coisas que se dizem apenas com essas palavras... Por trás de todos esses esforços existe o empenho de muitas pessoas que acreditam no trabalho honesto e na simplicidade da vida... Se os resultados não são tão bons ou nossas possibilidades não são tão grandes, o que importa mesmo é ter dignidade para apostar numa vitória que mesmo sendo improvável pode vir se não dermos um passo maior que a perna... Eu não estou nem aí de perder pelo resto dos meus dias, contanto que eu honre essa verdade... Dando certo ou não, é válido... No final da minha vida eu vou morrer mesmo... Então se eu vou morrer quero morrer sendo feliz, ou tentando...

O repórter desliga o microfone e a transmissão continua normalmente.

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Minha Elis – Parte 2

Passaram-se quase três meses desde que escrevi a primeira parte dessa homenagem à Elis Regina. Não mudou muita coisa na minha vida. Continuo o mesmo. Para os americanos, a expressão “loser” serviria para designar o atual momento pelo que passo. O equivalente ao termo em português brasileiro seria “trouxa” ou “vacilão”. Pois bem, eu que me lasque. Quero falar da minha cantora favorita, que nunca terei a oportunidade de encontrar, mas que eleva minha condição e compreensão além das possibilidades naturais. Elis morreu em 82. Não ligo para o tempo. Sua expressão se faz influente e positiva, como artista brasileira, que soube mostrar nossa identidade em uma obra curta, mas consistente.

Voltemos ao ano de 2008. Lá, o bicho pegou um pouco para o meu lado. Eu tinha dois trabalhos, estudava, cuidava da minha irmã e ainda escrevia. Vínhamos de um despejo e da recente morte de um parente próximo. Nada parecia promissor, o que não se difere muito da situação atual, mas quem me dava força era Elis. As pessoas que se lembram da novela “Ciranda de Pedra”, versão de uma novela da Rede Globo de 81, sabem que a nova abertura era a música “Redescobrir”, composição de Gonzaguinha. Tanto ele como Milton Nascimento e Ivan Lins tornaram-se parte do meu gosto musical por influência da saudosa gaúcha. O que escrevo foi orientado de maneira decisiva pelas construções desses artistas. Algo que não tem preço, que tem valor inesgotável e inestimável.

Mas Elis morreu cedo, em demasia. Aos trinta e seis anos. Vítima do abuso de drogas. Da mesma causa faleceu Amy Winehouse, nascida em 83. Era muito talentosa também, a inglesa Amy. Então me pergunto: como seria Elis se estivesse viva? Ou melhor: como seria o Brasil se Elis estivesse viva? Elis, que vendia menos discos que uma Gretchen ou um Sidney Magal, na ocasião de sua partida, provocou uma comoção muito forte, recordada não apenas por seus fãs. Elis provavelmente teria participado dos movimentos de abertura política, dos quais já era simpatizante. Mas será que manteria a condição de mito? Se uma Elza Soares, cantora de nível parecido tem o reconhecimento internacional significante, seguiria Elis o mesmo caminho? Ou iria ao caminho dos tropicalistas, que se envolveram ainda que timidamente com o governo e hoje recebem algumas críticas severas por seu comportamento? De qualquer forma, ficam os vazios da carreira interrompida e do exemplo questionável. A obra de Elis é indelével, seu talento indiscutível, mas seu final foi trágico. Logo essa interrogação se torna mais delicada, tal como a da artista inglesa, o que transforma o paralelo em questão atual, em como o tempo passou, mas a situação da alteração de consciência não foi sequer tocada, frente ao que se

decorre disso. Dói saber que a morte de Elis podia ter sido evitada. Dói saber que isso influencia que outras pessoas também se deixem levar pelos vícios e excessos. O mesmo vale para Amy, e para tantos outros.

Elis Regina, na sua arte, passava uma postura ao mesmo tempo melancólica e otimista, emocionada e realista. Copio, por assim dizer, esse estilo. O subtexto encaixado nas metáforas características da produção da década de 70 é bastante parecido com o que tento apresentar hoje nas minhas linhas. Já Allan Sobral, meu amigo abençoado e crente, que sempre cito pela espécie de rivalidade camarada que nutrimos, vai por uma trajetória totalmente divergente, embora também muito digna e mais interessante. Allan Sobral é um tórrido romântico, tão apaixonado que quase já o admite. Seu estilo de escrever vai diretamente de encontro à proposta do site Poemas de Amor. É um fã confesso de Casimiro de Abreu, e adora o samba mais clássico, de Noel, Cartola e Paulinho. Outro dia, diz ele, sonhou com o João Nogueira. E no sonho recebeu o que todos esperam ter de um grande ídolo: Allan foi agraciado com um dessas bênçãos que só quem merece muito recebe. Ele abraçou o João Nogueira, falou com o João Nogueira. Desnecessário dizer que isso me deu uma inveja daquelas. Ainda assim, fiquei feliz: meu amigo ganhou um presente que nunca podia imaginar. E se ele pode, porque eu não? Tudo bem, o Allão é um grandíssimo poeta, sabe o que faz e vocês o conhecem. Mas, sei lá, a sorte também pode vir para o meu lado, se bem que a Elis deve estar muito ocupada, cantando para Deus enquanto Ele escolhe se teremos seu perdão ou não...

Bom, o que eu quero dizer mesmo é que sempre devemos lembrar-nos de Elis e seu canto. Basta ter a sensibilidade de ouvir sua mensagem, tão brilhante em vida. Se Elis se foi pelo mal, isso não anula o bem que ele nos deixou. Tenho certeza que é isso que ela me diria, se me encontrasse.

(Continua...)

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Só os belos podem amar

“Pouco importa, formosa Daliana,
Que fugindo de ouvir me, o fuso tomes;
Se quanto mais me afliges, e consomes,
Tanto te adoro mais, bela serrana.

Ou já fujas do abrigo da cabana,
Ou sobre os altos montes mais te assomes,
Faremos imortais os nossos nomes,
Eu por ser firme, tu por ser tirana.

Um obséquio, que foi de amor rendido,
Bem pode ser, pastora, desprezado;
Mas nunca se verá desvanecido:

Sim, que para lisonja do cuidado,
Testemunhas serão de meu gemido
Este monte, este vale, aquele prado.”

- Soneto IX (Cláudio Manuel da Costa)

Eu tento e invento de não amar
De ignorar o preço, em vida e verso
De transformar o bem em algo perverso
E assim me modificar

Persisto a cada dia em ludibriar
Esse mentir que melancólico desconverso
Esse lugar da qual a paz sempre disperso
Para não ter que aventurar

Se só os belos podem, logo eclodem
Ruídos de insatisfação
Dos âmagos que se recolhem

Em abafar a força e a feição
Em apagar as manchas, se recordem
Que amor de fato vem sem permissão

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Brasil?

Brasil:
Qual o seu nome
E a sua idade?

Qual a sua cara, Brasil?
De onde você vem?

Você tem filhos, Brasil?
Tem sonhos
Aspirações
Metas a conquistar?

Qual a sua verdade, Brasil?
Qual sua mentira?

Qual sua cor
Sua religião
Seus gostos e virtudes
Situação e opinião?

Você é bom, Brasil
Ou é mau?
O que tem a me dizer de Oswald de Andrade
E todos os seus artistas?

Brasil, qual a sua profissão?
Você é um poeta
E nos seus versos contém as respostas
Do que pergunto?
Você é ladrão, Brasil, é puta?
É auxiliar de escritório
Ou auxiliar de necrópsia?

Diz aí qual é que é a tua, Brasil?
Qual é sua marca?

Você é homem ou mulher, Brasil?
É bicha?
É maconheiro?

Você é seu povo
Sua visão romântica
Seu julgamento realista?

Você é sério, Brasil
Ou piadista?

Você é rico, Brasil
Terra de ouro, mata e mar
Imersa na miséria?

Você já achou uma justificativa, Brasil
Desculpa ou coisa parecida?

Você é lindo, Brasil?
Afinal, você é amoral
Ou imoral?

Você tem regras, Brasil
É apenas para profissionais?

Me diz, Brasil
Se te amo ou te deixo
Se me calo ou me queixo?

Se você quiser eu te ajudo.

Foto de João Victor Tavares Sampaio

A Flor do Desespero

“Para dizer a verdade, não nasci nem do Caos, nem do Orco, nem de Saturno, nem de Japeto, nem de nenhum desses deuses rançosos e caducos. É Plutão, deus das riquezas, o meu pai. Sim, Plutão (sem que o leve a mal Hesíodo, Homero e o próprio Júpiter), pai dos deuses e dos homens; Plutão, que, no presente como no passado, a um simples gesto, cria, destrói, governa todas as coisas sagradas e profanas; Plutão, por cujo talento a guerra, a paz, os impérios, os conselhos, os juízes, os comícios, os matrimônios, os tratados, as confederações, as leis, as artes, o ridículo, o sério (ai! não posso mais! falta-me a respiração), concluamos, por cujo talento se regulam todos os negócios públicos e privados dos mortais; Plutão, sem cujo braço toda a turba das divindades poéticas, falemos com mais franqueza, os próprios deuses de primeira ordem não existiriam, ou pelo menos passariam muito mal; Plutão, finalmente, cujo desprezo é tão terrível que a própria Palas não seria capaz de proteger bastante os que o provocassem, mas cujo favor, ao contrário, é tão poderoso que quem o obtém pode rir-se de Júpiter e de suas setas. Pois bem, é justamente esse o meu pai, de quem tanto me orgulho, pois me gerou, não do cérebro, como fez Júpiter com a torva e feroz Minerva, mas de Neotetes, a mais bonita e alegre ninfa do mundo. Além disso, os meus progenitores não eram ligados pelo matrimônio, nem nasci como o defeituoso Vulcano, filho da fastidiosíssima ligação de Júpiter com Juno. Sou filha do prazer e o amor livre presidiu ao meu nascimento; para falar com nosso Homero, foi Plutão dominado por um transporte de ternura amorosa. Assim, para não incorrerdes em erro, declaro-vos que já não falo daquele decrépito Plutão que nos descreveu Aristófanes, agora caduco e cego, mas de Plutão ainda robusto, cheio de calor na flor da juventude, e não só moço, mas também exaltado como nunca pelo néctar, a ponto de, num jantar com os deuses, por extravagância, o ter bebido puro e aos grandes goles.”

- O Elogio da Loucura (Erasmo de Roterdã)

Louçã
A filha da morte
Mãe dos desencontrados
A Loucura, quente frieza
Tem a razão;
A Loucura assim em clareza
É pura escuridão

Esqueçam de cobra ou maçã
Pecados
De um raciocínio consorte
Falso cristão:
A simbiose, que é doce ilusão
O educar do prazer
A realidade do reproduzir
Não tem efeitos comprovados;
Se alguém tentar introduzir
O dever
Ou outra asneira em semelhança,
Se lembre de quando em criança
O mundo que nos parece acolher
Trai-nos em manso
Em lento avanço
De sermos adultos e suficientes
Sábios e clarividentes

Em ser injusto e imperfeito
O mundo que soa ideal
Passa longe de satisfeito;
Ou seja:
No final da vida é o final
Ao invés do que se almeja
Que se encontra ao natural;
Sem moral ou solução
Sem nexo de orientação;
Sendo a falha em seu ardor
A máquina em seu labor;
Eis o humano enfim descrito
Pequeno e frágil ao infinito;
Entregue
Ao destinar que lhe carregue;
Sendo insano por lutar
Por nadar em naufragar;
Pois isso explica a loucura
E o amor:
Nada mais que a abertura
O botão da semeadura
De um desespero em flor

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Pequeno - Parte 4

Deus não precisa existir, e sim a fé nele. O mesmo vale para o amor.

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Pequeno - Parte 3

O amor é egoísta. Eis o que os românticos não contam.

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Pequeno - Parte 2

O mundo é gigantesco. Não posso ser ingênuo de tentar explicá-lo.

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Pequeno - Parte 1

Sonhar? Só acordado.

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