É PAU, É PEDRA, É O FIM...
Sempre que chegava em casa, ligava a TV por assinatura, onde já estava sintonizado o canal de áudio “Bossa Nova”. Hoje não foi diferente! Só que desta vez, invadia o ambiente, e seus ouvidos, a música “Minha Namorada” de Vinícius e Carlinhos Lyra: - “Se você quer ser minha namorada... Ah, que linda namorada...”
Ainda mais saudoso dos seus olhares, beijos e abraços, tudo o que Cabeça realmente mais queria no momento era exatamente o que Branquinha menos desejava: estar juntinho outra vez. Separaram-se por causa das frases malditas do último sábado e que, toda vez que isso acontecia, ele não conseguia digerir.
Surgiu, então, uma névoa na relação. Ela dizia-se cansada, confusa; ele parecia cachorro caído do caminhão de mudança: totalmente perdido. Por isso, a cada telefonema, a cada convocação dos amigos, ninguém mais o encontrava, nem mesmo ele. Era o telefone tocar que já iam atendendo e logo dizendo: - Ele não se encontra!
Depois do último tête-à-tête e algumas ligações malsucedidas com Branquinha, juntou todos os porta-retratos da sala que revelavam seus melhores flagrantes juntos, além da beleza e do sorriso dela, colocou-os raivosamente um contra o outro, escondendo-os onde a visão não alcançava: na gaveta do armário do último quarto do seu apartamento, um lugar ermo que mais parecia um depósito de entulhos.
Outras tentativas foram feitas sem sucesso, pois sua voz não era ouvida, seus pedidos não eram atendidos, muito menos sua dor arrefecida. – Vamos voltar, vamos ficar juntos, rastejava Cabeça, insistentemente. E Branquinha, apesar de ligar quase todo santo dia, só conseguia repetir aquela estarrecedora frase: - Estou confusa! E rapidamente desviava o assunto, partindo para amenidades.
Dia após dia era assim: ela, perdida, vivendo seus momentos de confusão; ele derramando-se em infusão: chá de camomila, hortelã ou erva-doce para acalmar o sofrimento; chá de boldo para as agruras e os nós no estômago... mas a única coisa que deu resultado mesmo foi o sofrido chá de cadeira que estava tomando dela.
A essa altura do campeonato, mesmo depois de milhões de declarações, ele queria mais era tomar chá de sumiço: suas palavras continuavam sem forças, sem encontrar eco no coração de Branquinha! E se o coração não ouve mais, babau!
Apoderando-se do verso oportuno de “Chega de Saudade” que tocava, ao telefone, Cabeça insistiu sua derradeira vez: - Amor, chega de saudade: não quero mais esse negócio de você longe de mim, disse aos prantos. Como não era profunda conhecedora da obra de Tom e Vinícius, suas palavras não a sensibilizaram e, do outro lado da linha, o silêncio era total: o telefone estava mudo, ela não atendia ao seu chamado, afinal, nada já tocava seu coração.
De repente, a aflição invadiu o peito dele: a linha caiu, rompendo definitivamente a ligação que existia entre os dois. E o que se ouvia naquele instante eram apenas os seus soluços misturando-se aos versos de Águas de Março: - É pau, é pedra, é o fim do caminho...