Bolsos

Foto de Arnault L. D.

Sementes nos bolsos

Eu trago sementes no bolso,
nos lábios, alguns assovios.
Acordes abertos e esparsos
das músicas que à mente ouço.
Soam preenchendo os vazios
do cotidiano que esgarço.

Na guitarra, as notas trago,
que ainda não foram tangidas;
na língua o sabor das palavras,
sal, açúcar, acidez, que trago
dos falares e nas bebidas
no degustar do corpo trava.

Preso de mim, em mim se encobre.
No potencial sem uma trilha.
Sou um desconhecido íntimo,
minha fina pele a carne cobre.
O espelho d água o céu espelha,
e o céu lhe guarda a profundidade...

Mergulhado, imerso as entranhas,
nos bolsos a vestir as mãos.
Olhando nas poças o luzir esboços,
assoviando canções estranhas,
desconhecidas, e minhas são.
Eu trago sementes nos bolsos.

Foto de Jardim

ando pelas ruas molhadas

ando pelas ruas molhadas
sob a noite fria.
a cada passo o peso
das histórias mal resolvidas
e dos sonhos deixados para trás.
o toque da noite é frio,
futuro mutilado, metades perdidas
que eu arrasto pelas ruas.
ausência de cores, sonhos impossíveis,
um sorriso forjado no rosto.
contagem lenta e regressiva
dos dias, fome infinita do destino.
no túnel escuro das madrugadas
as mãos geladas nos bolsos furados,
contemplo sombras que gemem,
ouço os lamentos do vazio,
o amor em lençois encardidos.
os loucos não mentem.

Poema do livro Diários do Desassossego
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Foto de P.H.Rodrigues

A vontade

Me dê um pouco mais do teu olhar.
Imóvel, como uma foto em cima do móvel.
Renovo, minhas molduras.
Reformo, o meu guarda tesouro.

Prevejo o incerto, na certeza de que,
o certo, acontecerá na incerteza,
que motivará, e, anunciará,
a chegada do previsto.

Revistando meus bolsos em busca da bussola,
ou olhando para o céu,
sigo o céu teu nos olhos meus,

Na vontade de navegar em teus lábios,
recém chegados, desconhecidos, bem moldados,
corados com tom de aventura.

Foto de Rute Mesquita

(Des)pedaços da vida

Sou um velho pensador,
caminhando sobre a saudade
carregando o pudor
da outrora vaidade.
Tudo o que me rodeia
nada me diz.
Só o trigo e a centeia
que para a minha família
jazia da raiz.

Hoje, não tenho nada
nem ninguém
sou apenas eu e esta estrada
que me leva ao além.

Já fui um homem honrado,
já fui agricultor
mas, hoje aqui me encontro irado
por ter perdido aquele amor.

Caminho… de mãos nos bolsos
de cabeça baixa
aparentando olhar os meus passos
vejo-me nos reembolsos
daquela caixa
em pedaços.
Hoje, é tudo o que tenho,
cartão onde me abrigo.
As recordações não detenho
pois só elas tardam o meu castigo.

Foto de betimartins

Controvérsias!

Hoje, não existe mais o dever cívico
Nem muito menos o respeito e a moral
Certamente ainda a plena responsabilidade
Seja dos pais, dos dirigentes e dos governantes...

Ninguém é culpado, na terra de ninguém
Os ladrões roubam e saem para a rua
Os violadores violam e saem para a rua
Os traficantes traficam e saem para a rua...

Estamos em falsa democracia, moribundos, sobrevivendo
Os países são o que julgam ser e não são nada de nada
Os governantes apenas governam e como governam
Tudo o que não sabem é governar, ficam impunes...

Os filósofos perderam até a coragem de voltar a filosofar
Investigadores perderam até a vontade e fé de pesquisar
Os alunos já sabem demais e não precisam aprender
Os professores esses sim é que precisam aprender...

Países fazem reuniões com altos representantes
Onde segundo eles, dizem traçam metas e seus objetivos
De quem enche melhor os bolsos e suas vaidades, superadas...

Neste mundo de faz de conta, todos berram e ninguém, tem razão
Porque existem bocas famintas e onde ninguém ainda leva o pão
O velhinho é menosprezado, se tem dinheiro é bem tratado
Se não o tem, é despejado ao esquecimento e a cela da solidão...

Os agiotas agitam o mundo na falta demagogia e na falsa paz!
E eu aqui a desabafar, o que ainda pode vir a ser salvado por nós
Humanos que nós somos, onde ainda existe caráter e dignidade
Vamos lá tomar vergonha na cara e serem homens de verdade...

Foto de Leidiane de Jesus Santos

Que Deus, Nos Ajude!

O que o dinheiro significa para você?
O quanto ele é importante para você?
Do que adianta ter dinheiro
Sem amor e respeito no coração.
Pra que condenar sua vida
Coisa tão preciosa
Dando tiro
Tirando a vida de outro irmão
Por um sapato
Por um trocado
Eu sei que não é fácil
Que hoje em dia
A imagem é tudo
O que você tem
Fala mais alto
Eu sei também que falar é fácil
Mas se ninguém diz nada
Continua a mesma palhaçada
Tô de saco cheio
De toda essa vaidade
De toda essa luxuria
De todo esse egoismo
Que matam
E asassinam por nada
Me diz
Quando o ser humano
Perdeu tanto
O valor?
Só sei que estou cansada
Você não?
De ser engando
De ser roubado
Por todos os lados
Com os nossos bolsos
Contando centavos
Sendo esvaziados
Por esses politicos corruptos
Enquanto os bolsos deles
Estão cheios de dólares.
Que contradição
Vivemos numa sociedade democratica
Onde democrácia está em extinção
Onde temos nossas vidas
Controladas
Como se fossemos fantoches
Onde a lei
não significa mais
sinônimo de princípios
E justiça
Não significa mais
Sinônimo de honestidade.
Bom!
Enquanto Eles ficam de plateia
Rindo da nossa cara
Bebendo seu Wisk com pedrinhas de gelo
Nós vamos vivendo
Na frieza da realidade
Fazendo a nossa parte
Sem matar
Sem roubar
Sem enganar
E Mesmo com a integridade
Violada
Mantendo viva
a Esperança
Tentando sobreviver.
Que Deus...
nos ajude!!!

Foto de Allan Dayvidson

CRIME

Nós dois sabemos bem o que aconteceu
e não sou o único suspeito.
Nós tinhamos planos infalíveis, mas incompatíveis,
Achei que você caberia em alguns dos meus.

As sirenes estão ligadas, alguém lê seus direitos
e você já sente as algemas.
Qual é o peso de toda essa culpa em seu peito?
Será que isso seria um problema?

É, cometemos um crime que jamais iremos esquecer,
só que por razões assustadoramente diferentes.
Começou sem expectativas, levando tudo na esportiva.
Deveria ter sido um álibi simplesmente estar contente.

A preciosidade daqueles momentos sem gravidade
foi roubada por todas as suas leis.
Debaixo de nossos narizes,esvaziam nosso bolsos,
destruindo tudo o que não tivemos de vez.

Uma última palavra, algo que precisa ser dito,
antes que tudo seja perdido:
não estou nem um pouco arrependido.

Outra coisa antes da execução de nós dois:
é criminoso o que você nos fez e depois...
simplesmente esqueceu...
simplesmente...
esqueceu...
Como consegue esquecer?

Foto de Leonardo André

A princesa e o plebeu

Da janela do meu quarto te observo calado...
Sobre a cadeira branca, alva, deitas teu corpo, bronzeando-te à beira da piscina.
Massageias teus braços e pernas com cremes... cheirosos (imagino)...nem notas minha presença... afinal, meus binóculos podem te ver de longe... mas nem te passa pela cabeça a idéia de me conhecer.
Lembro-me de ter visto tuas fotos em revistas de "famosos"... linda, esguia, bela como fosse um modelo.
E eu aqui... sentado sobre a laje de um "palacete assobradado"... sem acabamento, sem decoração, sem móveis finos...
Um simples plebeu... a te amar... calado... catando trocados nos bolsos... fumando um cigarro amassado... introspecto... eternamente platônico.

Foto de betimartins

Carta a Deus

Carta a Deus

Se eu fosse capaz aqui te dizer quanto a minha alma sofre, quanto ela sente a dor, a iniqüidade, a injustiça do ser humano que sempre erra sem parar para refletir.
Às vezes eu penso que tu és um sonho que eu sonhei um sonho lindo de amor, sentindo a tua presença em mim, deixando a minha alma leve, alegre, feliz por nunca se sentir sozinha. Claro que tu DEUS, és único, eu tive a sorte de te descobrir em mim, dentro de mim, mas e os outros? Será que um dia eles vão poder se descobrir?
Eu olho a televisão, por minutos vejo quanta mentira, quanto engano, quanto tempo desperdiçado em nada, nada mesmo apenas mais um ponto para a escuridão de cada um... Vejo, governantes, uns atrás dos outros mentindo, enganando, iludindo, enchendo seus bolsos, vejo pastores pegarem em crianças e iludindo a fé de cada um, aproveitando da ignorância e dor, para seus bolsos encherem a cada dia mais e mais.
Vejo igreja tentando reparar erros, irreparáveis, pois lesaram crianças em abusos e no engano, da fé e da confiança depositada neles, aqueles pais que julgavam os seus filhos seguros...
Vejo os desrespeitos dos filhos aos pais, uns largando os velhos como sacos de lixo humano a si mesmos ou então os colocando em lares ao abandono. Filhos jovens que mandam calar os pais, alguns batendo, insultando que futuro serão eles aqui na terra?
Os novos corruptos da terra, que desrespeitam o ser humano e toda a natureza...
É DEUS, estaria aqui iludindo dizendo que tudo vai melhorar tudo vai ficar bem, mas não vai não, tu e eu sabemos que não vai ficar bem.
Vejo a riqueza avançar, a pobreza aumentar, a fome a reinar, o desprezo a espalhar, vejo que pouco se pode fazer não existe mais mãos fortes aqui para mudanças.
Recordo grandes almas iluminadas que passaram aqui na terra que poderia as citar, mas que iria adiantar? Não mudaria aqui nada neste desabafo lembro de uma celebre frase Osho (o caminho do amor) que diz: “Traga luz ao quarto escuro e a escuridão desaparecerá”... “Conheça a via e a morte desaparecerá...”.
Quando estará o ser humano preparado para entender isto? Será preciso mais um Jesus na terra e ser crucificado na cruz para que todos acordem de novo na humanidade?
Vejo as tempestades, a revolta do tempo pelo desrespeito do ser humano, vê que podemos realmente morrer como dizem as escrituras, mas será que já não estaremos quase mortos? Inertes e impotentes?
Será, que ninguém vê a beleza que todos os dias somos premiados ao abrir de novo nossos olhos descansados de mais uma noite de sono, ver o dia clarear, os cânticos dos passarinhos, o sol com toda aquela força e beleza trazer a luz do dia e deixar a noite mais uma vez descansar um pouco.
Nas Trevas estão as nossas almas, mergulhadas na ignorância, somos profanos na tua obra, ignorando-te e ignorando as tuas leis e bases do amor.
Eu queria escrever uma linda carta, cheia de esperança, cheia de glamour, mas na certeza que estaria projetada nos sonhos de uma criança e essa criança sou eu.
Que ainda chora e reza nos seus pés da cama, pedindo transformação nos meus irmãos e amor em todas as coisas (visíveis e não visíveis)...

Foto de Evandro Machado Luciano

Jazidas Aluvionais

Um estampido acorda a madrugada
Predizendo na aurora, os homens do rei
Fardados, gritando: - Vigésima Brigada!
Trazendo nas mãos, o sangue da lei

Nos bolsos cheios de ouro
Choram anjinhos perdidos no céu
Nas patas vermelhas do pingo crioulo
A herança da triste ganância cruel

Mal sabem que a volta é mais curta
Para os que traçam intricados caminhos
Quando notarem a barba hirsuta
Estarão jazidos sob o ouro – sozinhos.

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