Minutos

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A TRAPAÇA DO DEDO DURO

CONTO: A TRAPAÇA DO DEDO DURO
AUTOR: LOU POULIT

Do outro lado da prateleira de livros, um rosto. Um belo rosto, de uma bela mulher. Chamava-se Afrodite, mas ele ainda não o sabia. No entanto sabia ser a mesma que procurava sempre, durante o horário de almoço. E para seu contido contentamento, volta-e-meia a encontrava vagando de uma lojinha a outra dentro do shopping. Era de tez trigueira, roliça, mas sem ser gordinha, seios fartos e comportados, gestos calmos e imensos olhos de mel claro, sobre os quais havia sempre uma parte da franja dos seus cuidados cabelos castanhos-escuros e ondulados. Além da estética, mostrava uma característica talvez ainda mais sedutora: Era muito delicada, tal como uma flor.
Sansão ainda não se decidira a abordá-la. Parecia-lhe preciosa demais para que se precipitasse. Difícil reconhecer que não se sentisse muito seguro. Era um homem bem mais velho, cinqüentão, com certeza quase o dobro da idade dela. Sansão era um tipo machista de viúvo-feliz, de bem com a vida, inconfessavelmente rico para as mulheres e meio sovina para os seus funcionários. Barrigudo? Não... Bem, só um pouquinho. Sempre dizia que sua barriguinha era o suficiente para que fosse confortável. Ao seu ver era um charme.
Distraído pela visão da mulher, ao puxar um dos livros derrubou vários outros no chão da livraria. No susto, havia conseguido pegar apenas dois, os demais fizeram uma barulheira danada. Abaixou-se rapidamente, para esconder o seu constrangimento e recolher os volumes, mas ao reerguer-se, com um sorriso talhado no rosto especialmente para ela, já não a encontrou mais do outro lado. Seu olhar desesperado a buscou pela loja, depois pelos corredores, porém em vão. Ela havia sumido. E lhe deixara mal consigo próprio, com uma sensação de perda. Queria ter aproveitado a oportunidade de se desculpar com ela, embora não o houvesse feito com o dono da loja.
Várias semanas se passaram sem que ele a reencontrasse, apesar do esforço que fez para isso. Seu ânimo começara a ceder à idéia de que nunca mais a veria e se culpava por isso. Aos poucos uma tristeza tenaz, e cada vez mais inconformada, ia e vinha, tomando seu coração de assalto e fazendo, à noite, com que demorasse a pegar no sono. Porém, como os homens pensam saber sempre, toda mulher desejável é apenas uma questão de tempo e sempre acabará vindo, eis que, finalmente, a sorte lhe sorriu pela mais simples natureza das coisas.
Sansão estava prestes a voltar para casa. Havia sido mais uma noite infrutífera de peregrinação pelos corredores do shopping. Mas resolveu fazer um lanche antes de sair e assim, sem saber, propiciou que se manifestasse a natureza das coisas. De longe, reconheceu Afrodite vindo para a praça externa de alimentação. Observou que ela procurava uma mesa para si, preferindo ficar protegida pelo toldo. Vendo que atrás dela havia outra mesa vaga, ele apressou o passo para que ninguém chegasse antes. Ela estava de costas, mas Sansão sentia uma enorme felicidade. Ao menos ela estava bem ali, a poucos centímetros. Na verdade era uma situação inusitada, ela nunca estivera ao alcance da sua mão carinhosa. Entretanto, ele dizia a si mesmo que precisava se conter. E ajeitou-se na cadeira para observar melhor aquela mulher que tanto lhe seduzia.
Numa mesa ao lado, dois garotos tomavam refrigerante. Procurando uma forma de criar uma situação em que pudesse abordá-la, ele viu, do lado oposto à sua mesa, que uma senhora idosa e faladeira havia amarrado a correia do seu irrequieto cãozinho à própria cadeira, enquanto comia um sanduíche enorme, para espanto da sua amiga. Sansão sentia o tempo escorrer rapidamente. Tinha que fazer alguma coisa e talvez não dispusesse de muitos minutos. Subitamente teve uma idéia arriscada para um senhor da sua idade, mas ele se decidiu a pô-la em prática. Na primeira oportunidade em que as velhotas olhavam para o lado, ele soltou a correia do cachorro, que saiu em disparada e sem direção. As velhotas não perceberam e Sansão apressou-se em alertá-las.
A dona do cãozinho começou um escândalo desesperado, para que alguém se prontificasse a ajudá-la. Olhava para Sansão, já que a tinha alertado, mas ele se limitava a assistir. Não tinha mesmo a menor intenção de sair do seu lugar, pois esperava o momento para o próximo passo do seu plano. E não demorou. Aproveitando-se da balbúrdia reinante e da oportuna piedade de Afrodite para com a velhota, Sansão trocou o copo de refrigerante de sua pretendida com o de um, já vazio, dos garotos da mesa ao lado. Depois sorriu para si mesmo satisfeito. Fora arriscado, mas havia conseguido realizar a parte mais difícil. Ajeitou-se novamente, com mais conforto em sua cadeira e esperou pelo momento certo.
Com tanta gente apiedada da senhora, o cachorro não conseguiu ir muito longe. Logo um dos guardas do shopping veio trazê-lo, mas na ponta dos dedos, porque o bicho protestava tentando mordê-los. Voltando todos à calma, Afrodite finalmente se deu conta de que o seu refrigerante havia sumido do copo. Como não era mulher de escândalos, matutava olhando em volta, procurando uma resposta para aquele mistério. Quando viu-se vazado pelo olhar desconfiado da mulher, Sansão não teve dúvida e prontamente apontou para o garoto, que ainda tentava entender como o seu refrigerante havia reaparecido dentro do seu copo. Ela a princípio duvidou, mas como os garotos aparentavam seriedade pela surpresa, acabou convencida de que eles haviam feito aquela travessura. Afrodite não tinha filhos mas adorava meninos, porque em sua família só houveram meninas. Sansão sentiu-se decepcionado ao ver que ela não quis ralhar com os garotos, mas achou que era tarde demais para desistir do seu plano. Chamou um dos garçons e pediu dois outros refrigerantes, um para ela, sem que percebesse.
Quando o garçom retornou e Afrodite se mostrou surpresa, Sansão finalmente pode lhe dirigir algumas palavras educadas: Me desculpe, mas não vai terminar o seu sanduíche a seco, vai? Por favor, aceite antes que perca o gelo – disse a ela. E não perdeu a calma quando ela rejeitou sua oferta lhe agradecendo. Ora, por favor... Trata-se apenas uma pequena gentileza. Vamos, aceite de bom grado, veja, também gosto... Afrodite mostrou-se indecisa e ele se aproveitou para sentar-se à mesa com ela, antes que pudesse dizer alguma coisa. Posso? Meu nome é Sansão... Afrodite não respondeu de imediato e ele manteve a pressão sorrindo: Seu nome é algum tipo de segredo?... O meu é Afrodite... Afrodite?! Uma deusa, somos ambos de origem divina...
Só então ela compreendeu que aquilo era uma cantada e, recapitulando o que houvera acontecido ali, desconfiou que talvez fora tudo uma trapaça dele!... Seu primeiro instinto foi o de recusá-lo. Porém, como nunca se precipitava, começou uma vertiginosa avaliação de outros aspectos. O homem mais lhe parecia um tipo de garanhão em fim de carreira e sua reduzida experiência com esse tipo havia sido desastrosa. Se ao menos já se conhecessem seria mais fácil, mas julgava nunca tê-lo visto antes. Sempre dissera que não gostava de homens carecas mas, naquele momento, tentava admitir que ele não era tão careca assim. Também lhe parecia barrigudinho demais, de pouco preparo físico e tônus muscular, entretanto... Bem, mudando o ângulo de visão, ele tinha um rosto forte, fora com certeza um belo rapaz. Testa alta, indício de inteligência. Olhar contundente, mas também algo meigo. Mãos grossas, tivera origem humilde e seria trabalhador. Era um homem grande, talvez um metro e noventa centímetros... Boa perspectiva. Simpático, bem vestido, culto, relógio de ouro autêntico, do tipo que sempre pensa saber de tudo... Por que não? Olhando bem... Era um belo homem!
Ao apagar das luzes, ainda na praça, Sansão insistiu em levá-la para casa e, assim, descobrir onde ela morava. Porém ela decidiu que era a hora de começar a estabelecer limites. Ele não conseguiu convencê-la. Também não conseguiu marcar um encontro no fim de semana, já que ela alegou que iria viajar. Ficou olhando o ônibus se afastar levando embora sua nova deusa. Mas lembrou-se de algo que pusera no bolso. Era um cartão de um escritório de advocacia... Pondo o óculos devassou cada letra dos poucos dizeres que nele havia. Um número de telefone! E de um bairro bem próximo. Eis uma coisa muito importante naquela situação. Aquele número era o único elo, um simples resquício do encontro, mas sentiu-se capaz de jogar fora todos os demais cartões e anotações que tinha consigo. Era o cartão de uma deusa! Sansão não gostava muito de mulheres advogadas, mas adorava as adjuntas. Dizia aos amigos que adjuntas não são advogadas, ainda não têm seus vícios. Pois, deve-se aproveitar, antes que venham a tê-los.
Afrodiiiiiiiiite!!! Não acredito que você vai fazer isso de novo, garota. Você sabe que isso não dá certo. Você já tentou antes, viu no que deu. A não ser que você queira simplesmente dar um golpe do baú!... Diana! Você sabe que não é bem assim... A irmã mais velha pôs as mãos na cintura e olhou para Afrodite erguendo uma das sobrancelhas, hábito que herdara do pai desaparecido. Afrodite se atirou no sofá choramingando, sempre virava uma menininha frágil quando tinha que enfrentar Diana.
Viviam juntas havia há bastante tempo. O pai de Diana fora o primeiro homem de sua mãe, mas nunca ficava muito tempo. Vinha, se instalava, mas em pouco tempo sumia de novo. Num desses retornos encontrou a futura Afrodite ainda na barriga da mãe. Então, esbravejou, xingou e praguejou contra a mulher que, pessoa muito simples e curtida da sua vida sofrida, a tudo suportava. E ainda serviu ao seu homem um verdadeiro repasto de rei, para as parcas disponibilidades da época. Ele comeu como um boi e foi-se embora como um cavalo. Entretanto três anos depois, ficou sem dinheiro e reapareceu, como se nada houvesse acontecido. Sem saber como enfrentá-lo, a mulher acabou concordando em que ficasse até que se arrumasse. No dia seguinte ele já dava as ordens em casa. E na noite de sexta-feira Diana arrastou a pequena Afrodite para sua cama. Hoje você não vai poder dormir com a mamãe – Disse à irmã, que não entendia os gritos abafados e os urros desvairados que se ouviam pela porta entreaberta do quarto.
Ele ficou, dessa vez por quatro anos e inexplicavelmente a vida ficou melhor durante esse tempo. A mãe conseguiu boa freguesia para as suas costuras. O proprietário do apartamento, doente e no fim da vida, desistiu de se aproveitar dela e, por admirar a sua fibra mais do que o seu traseiro, acabou por lhe entregar uma escritura definitiva do apartamento, por uma soma simbólica. Contudo, nem isso foi capaz de conter o instinto inquieto do pai de Diana. Justo quando Afrodite já se afeiçoara, já o tinha como referência de homem, ele saiu para beber no bar e nunca mais voltou. Pois para a bela e doce menina dos olhos de mel, a irmã ocupou esse lugar.
Meu amor... Pare de se fazer de vítima. Você sabe o que a mamãe dizia, “quem gosta de velho é fundo de rede”. Você tem mania de super-heróis. Por que não arranja um mais novinho, Afrodite?... Então, Diana, o Sansão é muito mais bem conservado que aquele grosseirão da banca de jornal. É educado, culto, generoso... É, velho, careca e barrigudo – Completou Diana... Ah, não dona adivinha, barrigudo ele não é não, você nunca viu, como pode saber?... Vai me dizer agora que ele não tem nem um pneuzinho... Ah, um pneuzinho? Tem, mas é fofinho... Depois não venha choramingar no meu colo, não diga que não lhe preveni... Ah, ele é tão grandão e tão gentil. Bem que pode ser o meu super-herói... Não sei, Afrodite. Mas se você gosta, pode ser, otimistamente, o seu homem-borracha... Diana foi para o seu quarto. Oh! – Afrodite fez-se de ofendida – Você é que é a mulher-látex! Do quarto, Diana arremessou o travesseiro, que foi parar na cozinha, e as duas irmãs riram-se uma da outra.
...
As manhãs de sábado eram de faxina geral. Afrodite herdara da mãe o mérito dos temperos, porém, como trabalhava fora, nos fins de semana a cozinha era território só seu, o que incluía a limpeza. Diana lavava, pelo lado de fora, a porta que dava para o corredor, assobiando uma música para dar ritmo ao esforço. Sem conhecer o lugar e com um embrulho generoso de flores nas mãos, Sansão abriu a porta do elevador cuidadosamente. Tinha a esperança de fazer uma surpresa para sua deusa, mas foi surpreendido pela visão do traseiro de Diana, que se curvara para dar brilho no metal da maçaneta.
Ao ouvir o falso pigarreado do homem, Diana voltou-se de um pinote. Ia começar uma espinafração para dissimular o seu constrangimento, porém, vendo aquele homem grande com um sorriso respeitável por trás das flores, conseguiu se conter por alguns segundos, enquanto refletia. O suficiente para ele olhar mais uma vez as anotações em um papel de bloco e tomar a iniciativa da conversa: É aqui que mora a Senhorita Afrodite?... Diana não respondeu de imediato, mas já não tinha dúvida sobre quem era o grandalhão à sua frente. Ele correspondia às descrições, trazia flores e tinha na mão um papel com figuras aguadas de anjinhos, tal e qual o bloquinho de anotações que a irmã usava. Então, deduziu, a danada não lhe contara a estória toda. Já estivera com ele uma outra vez... Pelo menos.
Quando resolveu que lhe daria uma resposta séria, para mostrar que aquilo não era a casa-da-sogra, Afrodite antecipou-se, pelas suas costas, cumprimentando-o com meiguice, sua arma mais fatal: Oi, Sansão... Que lindas, meu anjo!... E logo apresentou sua irmã Diana. Todo derretido pelo sorriso carnudo irrecusável de Afrodite, Sansão quis ser gentil também com a outra, de cuja existência ainda não sabia: Meus Deus, mas que sorte a minha! Trouxe flores para duas deusas belíssimas... Afrodite aceitou a partilha com bom humor, mas Diana preferiu levantar novamente uma das sobrancelhas, mas sem deixar de ser simpática. Afinal, conhecia sua irmã, sabia que ela estava pondo seu plano em prática, e que já era tarde para tentar interrompê-lo. Saiu da frente da porta e ele entrou, puxado pela mão por Afrodite.
O almoço avançou rapidamente. Depois da canja com muitos miúdos, do filé de frango à parmegiana, salada de legumes e arroz branco, a sobremesa foi apresentada com pompas. Afrodite lhe fizera contar qual seu doce predileto, e trouxe para a mesa um enorme pavê de chocolate, que deixou o homem com os olhos arregalados. Depois de satisfeita a sua gula, Sansão não comeria nem mais uma cerejinha, pela mais absoluta falta de espaço. Afrodite sugeriu que se acomodasse no sofá e, descontraídos, foram os três. Suas pálpebras lhe pesavam, porém, cercado por duas deusas que gostavam tanto de vinho, o homem não admitia a idéia de dormir. Deliciava-se observando todos os detalhes. Quando ria, os seios de Afrodite tremiam sedutoramente. Diana, agora completamente à vontade, não tinha o sorriso luminoso da irmã, mas ganhava dela no traseiro imenso. Era bem branquinha e, vez por outra, mostrava belas e pouco comportadas coxas. Passaram a tarde conversando e brincando como três adolescentes. Quando uma saía, para o banheiro ou para a cozinha, ele aproveitava para atiçar o fogo da outra. Entretanto, estava acontecendo algo que ele não percebia naquele momento e não perceberia, até que não soubesse mais o que fazer.
Já à noitinha, Afrodite se fazia algo compenetrada. Sem mostrar sua preocupação, levantou-se e foi à cozinha anunciando que iria preparar um cafezinho bem forte. Mas do fogão, enquanto esperava a água ferver, de vez em quando esticava os olhos para espiar os dois no sofá. Aquela não era uma situação nova. A seu ver, Diana sempre acabava se jogando para cima dos seus namorados. Essa era uma questão antiga, que vinha desde o tempo em que elas eram bem mais novas. À medida em que seus corpos se definiam, a diferença de idade ficava cada vez menos importante. Como, nessa época, Diana era tida como feinha e tinha jeitão de menino, não fazia seu gosto seduzir os garotos como a irmã. Mas depois sempre arrumava um jeito de tentá-los. Depois que os julgava mais confiáveis e mais fáceis de controlar. Isso já dera panos para muitas mangas, algumas escaramuças mais sérias. Parecia tudo esquecido, coisas do passado. Porém, agora Afrodite sentia seu sangue esquentar. As lembranças voltavam a galope. Por isso serviu o cafezinho e arranjou argumentos, para fazer com que ele sentisse que estava na hora de se retirar. E ele se foi, feliz da vida.
...
“Afrodiiiiiiiiite!!! Não acredito que você vai fazer isso de novo, garota...”, não foi assim que você me disse? Agora eu é que lhe digo, Diaaaaaaana!!!... A outra mostrou-se indignada: O que foi que eu fiz, posso saber?... Você sabe muito bem do que eu estou falando, sua sonsa. Não é a primeira vez. Eu vi você beliscando o Sansão bem no sofá, no sábado passado... Euuuuu, Afrodite?!... Sim, você!... Mas foi ele que me beliscou primeiro!... Ahaaa! Eu já imaginava. Eu não vi não, mas tinha quase certeza. Você acabou de admitir que beliscou o meu namorado... Não tendo mais como negar, Diana mudou a estratégia: Ora, mana, foi só uma brincadeirinha... Eu conheço as suas brincadeirinhas há muitos anos... Depois, ele não é bem seu namorado ainda, que eu saiba...
Ela sabia ser aquele um argumento definitivamente decisivo. Por pior que fosse, Diana tinha razão. Afrodite sabia exatamente o que a irmã queria dizer. Enquanto sua relação com Sansão não se consumasse, Diana seria uma concorrente, uma inimiga no ninho. Precisava afastar o homem de casa. Ou não? Bem, pensando melhor, enquanto estivessem os três juntos, fosse onde fosse, seria mais fácil controlar o velho garanhão. Se continuasse saindo a sós com ele, até que ele se decidisse, Diana teria também esse direito. Resolveu então que a melhor maneira de controlar as coisas era as duas fazerem um acordo. Pois já tinha uma proposta para a irmã.
Diana estava sentada na sua cama, remexendo na velha caixa de costuras, que fora de sua mãe, chamada Heralda e tratada por Hera. Aqueles apetrechos, linhas e retalhos, pareciam guardar na caixa muitas lembranças da “Velha” que, entretanto, morrera moça, levando para o túmulo apenas alguns cabelos brancos e um coração que nunca fora realmente amado por homem nenhum. Além da caixa, herdaram o apartamento e as traquitandas que ninguém quisera comprar. Com a venda dos móveis as duas haviam pago as últimas despesas do tratamento e do enterro. Restaram também alguns livros antigos, dentre os quais um velho volume sobre mitologia grega, de cujas ilustrações a Velha ria e se admirava, como se houvesse entendido profundamente o que se esforçava tanto para ler.
Hera trabalhara muito para criar as filhas sem marido. Mas já fora muito sofrida, desde antes, quando adolescente morria de medo do padrasto, e por ele fora inclusive molestada. Ele fora o capataz da fazenda onde Hera nascera. Um homem que sabia se mostrar meigo quando queria, mas que, noutros momentos, era extremamente violento. Diana o odiava, a partir do que Hera lhe contou, e qualquer homem que a fizesse lembrar dele era para ela igualmente odiável. Desde mocinha sentiu vontade de capá-lo à faca, queria ter tido uma oportunidade para fazer isso. Tinha o mesmo desejo em relação aos seus poucos e inocentes namorados, mas nenhum deles ousara o bastante. Não queria sofrer como a mãe, nas mãos de homens bem servidos que, entretanto, não valiam nem a comida que comiam. Já tinha sua própria experiência e achava que havia sido suficiente para saber que os homens são todos iguais. Entregara-se ao último deles por amor sincero, mas não durou muito tempo porque descobriu que teria que dividi-lo, ou pior, capá-lo.
Afrodite interrompeu suas lembranças e a surpreendeu novamente, fazendo uma proposta bastante interessante: Sansão ficaria com aquela a quem ele próprio escolhesse. Mas então – Diana quis esclarecer – quer dizer que você lhe perguntará a quem escolhe?... Não, Diana. Isso aqui não é uma loja comercial oferecendo promoções... Então, como saberemos com certeza?... Afrodite parou para pensar e Diana completou: ganha aquela que primeiro perder com ele a virgindade!... Está louca, Diana? Sabe que você não é virgem... Mas ele não sabe disso... Mas ele não vai perceber?... Digo que meu hímen é complacente... Não! Sua trapaceira! Como você poderia saber disso antes de ter uma experiência?... Digo que fui molestada pelo meu ginecologista... Mas que coisa sórdida! Que lembrança mais infeliz... Qual o problema? – No caso da mamãe não foi um médico educado e nem de mãos limpinhas. Depois, ele ficará com peninha de mim, Afrodite, até terá um sentimento de proteção, muitas mulheres tiram partido disso... Não era você que não suportava mentiras?... Afrodite, ele não sabe de nada e você não vai bancar a dedo-duro dessa vez... Eu? Dedo-duro, Diana?... Você mesma, sempre me delatou desde criança... Mas que mentirosa... Você sabe muito bem, Afrodite. É apenas para efeito desse nosso trato. Ah sim, outra coisa, isso terá que acontecer aqui em casa, noutro lugar não vale. Deixemos que ele faça a escolha livremente. Combinado?
Não era bem esse o acordo que Afrodite imaginara, contudo, pelo menos agora havia um acordo. Sentia-se em desvantagem. Caso Diana o convencesse de que é virgem, isso poderia pesar na sua decisão a favor dela. Os homens dão muito valor a isso. Afrodite vinha evitando encontrar-se com Sansão desde o último sábado. Achava agora que ele era tão sem-vergonha quanto Diana, porém queria primeiro acertar as coisas com ela, torná-la mais previsível, para depois poder ficar com ele. Bem, já no dia seguinte ao do acordo, foi encontrá-lo no shopping durante o horário de almoço. Entretanto, ele não estava lá. Começou então a telefonar, mas a ligação caía na secretária eletrônica. Será que estava com Diana? Telefonou para casa, Diana atendeu e disse que não... De jeito nenhum... E agora? Precisava voltar para o trabalho – Afrodite sentiu um princípio de desespero. Esforçou-se para controlar a agonia. A tarde passou muito lentamente e assim que pode ela se despencou para casa. Ao chegar tentou agir normalmente, porém prestando atenção em cada detalhe, na expectativa de encontrar algum indício de que ele estivera ali durante o dia. Mais tarde estava aliviada, porque não havia visto nada de diferente. Contudo, estranhava o bom humor da irmã, algo exagerado.
Nos dias que se seguiram tudo se repetiu. Não o encontrava, não conseguia fazer contato e nem descobria nenhum indício em casa, a não ser Diana, que dera para assobiar mais que de costume. Ele havia sumido sem dar uma palavra e isso era o mesmo que futucar uma ferida antiga. Trazia a lembrança do sofrimento de sua mãe. Então queria perguntar à Diana por que isso não a incomodava. Ao contrário, parecia mais feliz. Mas sempre deixava essa pergunta para depois. Preferia absorver o acréscimo de agonia que vinha a cada dia. Na sexta-feira de manhã, enquanto Diana foi se banhar, ela sentiu uma vontade quase incontrolável de fuçar as coisas da irmã. Mas demorou a se decidir, depois achou que não daria mais tempo e acabaria chegando atrasada no trabalho. À noitinha, já voltando para casa, era só desânimo. Nem se alimentou direito e foi dormir cedo, com o coração pesado demais. Porém, não chegou a entrar em estado de sono profundo. Foi despertada pelos gritos desesperados de Diana, que vinham sufocados pela porta fechada do banheiro: Afrodiiiiite!!!... Ai! Afrodiiiiite!!! A tocha!!!... Afrodiiiiiiiiiiite, me acuuuuuda!!!... A tocha!!!...
Muito à contra-gosto, por Diana ter interrompido seu sono tão difícil de conseguir naquela noite, Afrodite foi se arrastando para o banheiro. Já sabia do que se tratava. A válvula do aquecedor de gás estava com defeito havia algum tempo. Por duas vezes o faxineiro do prédio já viera consertá-la. Levava algum dinheiro, mas o problema reaparecia, o gás vazava e fazia um fogaréu. Bastava fechar o registro na parede e esperar um pouco, mas tomada de pavor, Diana não era capaz de fazê-lo. Afrodite fechou o registro e voltou para a cama resmungando. E agora, Afrodite, vou ter que me enxaguar com água fria?... Da cama ela respondeu: É bom, Diana. De vez em quando é bom pra lhe aliviar do seu próprio fogo...
Quando Diana voltava para o seu próprio quarto parou na porta do quarto de Afrodite. Mas ela fingiu que já estava dormindo novamente. Era noite de sexta-feira, porém não tinha ânimo nenhum. Pensou que naquele instante o shopping e os bares deviam estar borbulhando de gente se divertindo. Mas seu coração estava triste demais. Se resolvesse se vestir e sair? Talvez encontrasse Sansão em algum lugar. Mas, o que faria então? Não... Não era uma boa idéia. Isso podia por tudo a perder de vez. Esforçava-se para ouvir os ruídos que Diana fazia no seu quarto, e deduziu que ela se preparava para passar creme no corpo. Imaginou então a irmã fazendo isso, mas com o pensamento em Sansão. Afrodite sentiu um tremor de raiva lhe percorrer o próprio corpo e enfiou a cara no travesseiro. Queria dormir e rápido. Precisava afastar esses pensamentos da mente. De súbito algo lhe sacudiu o coração: E se Diana contasse a ele sobre o trato que haviam feito? Não se considerava mais delatora do que a irmã. Remexendo a memória, achava que eram duas delatoras quando alguma competição o justificava. Dedo-duro? Eu que sou a dedo-duro? Pois sim, a mim ela não engana – Afrodite adormeceu inquieta.
...
“Afrodiiiiiiiiite!!!... Venha ver quem está aqui!... Afrodite chegou às pressas, para confirmar a intuição que havia desprezado desde que se levantara da cama. Lá estava novamente aquele sorriso por trás do embrulho de flores, embora dessa vez nem tantas. Mas eis que, enquanto trocavam olhares, Diana se antecipou e trouxe Sansão para dentro pegando-o pela mão. Nesse momento, Afrodite se convenceu definitivamente de que seus planos estavam sob sério risco. Precisava dissimular que se sentia roxa de ciúme. Lembrou-se então de que naquele sábado tinha o compromisso de ir ao escritório, para fazer a pró-forma de um contrato importante para a empresa, de modo que estivesse nas mãos do cliente na segunda-feira antes do almoço. Mas qual, essa devia ser a razão dos constantes assovios de Diana. Ela devia saber que teria várias horas a sós com ele.
Afrodite precisou fazer um esforço muito grande, mas conseguiu se controlar. Preparou um cafezinho, e começou uma conversa descontraída. Para diverti-lo, contou a estória do defeito na válvula de gás e do desespero da irmã. Entretanto o tempo era mesmo curto. Deixou o almoço adiantado e foi para o escritório, mas não sem antes exigir dele a promessa de que esperaria por ela. Ao passar pela porta, olhou para a irmã com seriedade, e percebeu que ela dissimulava um sorriso sarcástico de quem dizia: Não tenho culpa... Diana não quis perder nem um minuto. Pela janela deu um até-loguinho para Afrodite e, assim que ela virou a esquina, foi logo sentando no sofá ao lado dele, ou melhor, quase no seu colo. De short curto e blusa de malha, podia perceber que Sansão seria facilmente seduzido. Alguns minutos depois já estava sentada de fato no seu colo. Porém, achando que ele estava menos ousado do que devia, Diana alegou que a janela da sala estava aberta e o levou para o quarto. Então o homem pôs de lado a timidez e começou a despi-la, e ela a ele. Já deitados na cama, Sansão sentiu seu próprio sangue se multiplicar. Diana era uma mulher bela, apesar de não ter a simpatia da irmã. Ele admirou seu corpo por alguns instantes, sua pele muito clara, e viu que alguns músculos tremiam involuntariamente. Ela era um poço de desejo. Mas quando ele começou seus carinhos o telefone tocou. Diana não queria atender, pensava ser uma trapaça da irmã, mas Sansão, que não desconfiava, insistiu. Argumentou que podia ser algo sério e que eles tinham bastante tempo.
De má vontade Diana foi à sala atender. Depois voltou furiosa, dizendo que se tratava de um homem desconhecido, perguntando se aquele telefone era do açougue. Sansão desfez a zanga dela com alguns toques certeiros e ela correspondeu. Os minutos passavam rápidos para ela, mas ele não demonstrava nenhuma pressa. Seus carinhos vinham e voltavam aos mesmos lugares, mudava e tornava a mudar a posição dela, porém nada além de carinhos. Diana então achou que ele não podia continuar no comando, e passou a tomar a iniciativa. Porém, no instante em que ia consumar sua conquista postando-se sobre ele, ouviram o som da campainha. Algum miserável estava na porta - disse ela a si mesma, fingindo não ter escutado. De novo a campainha tocou e Sansão perguntou se ela queria que fosse atender. Diana estava a ponto de explodir de raiva, mas controlou-se para não tornar as coisas ainda mais difíceis. Levantou-se, tirou do armário um quimono atoalhado e foi para a sala, abrindo a porta abruptamente e fazendo cara de poucos amigos.
Da cama, onde permanecera, Sansão ouviu Diana dizer que ele voltasse noutro dia, que não poderia consertar coisa nenhuma naquele dia. Era um funcionário e tentava explicar a ela que haviam pedido o conserto, telefonando para a empresa que o contratara. Se o serviço não fosse feito naquele dia, então quem pagaria a sua diária? Ela entrou no quarto bufando, pegou sua bolsa e dela retirou dinheiro suficiente para despachar o “senhor consertador do gás”, mas Sansão interferiu de novo. Para convencê-la, alegou que o problema do gás era muito perigoso e que o conserto sairia mais caro do que comprar outro aquecedor. Calma, temos tempo... – repetiu ele para desespero dela.
Duas horas depois, justificando-se pela pressão que ela fez para que fosse mais rápido, o homem deu o serviço por terminado, tendo feito uma limpeza geral e trocado a válvula defeituosa por outra já usada, mas que, como podia ver, funcionava perfeitamente. Diana sentiu que aquela não era uma boa solução, mas tinha outra prioridade no momento e tratou de se livrar do inoportuno. Quando o homem foi-se embora ela olhou para Sansão, sentado no sofá esfregando com a mão a própria barriga, e deduziu o óbvio. Ele estava com fome, ela teria que servir o almoço e deixar a sua prioridade para depois. Ela ainda perguntou para confirmar se havia entendido bem o gesto, numa tentativa de protelar. No entanto Sansão confirmou que já estava sentindo fome, e mais uma vez lhe disse que tinham muito tempo, “só tenho pressa para o que não gosto de fazer...”. Diana respirou profundamente e foi para a cozinha, tentando manter um bom ânimo para não demonstrar a sua raiva.
Ela tentou fazer com que Sansão terminasse rapidamente a sua refeição, porém ele não teve pressa para isso também. Comeu e repetiu, elogiando os dotes de cozinheira de Afrodite. Nesse dia não havia pavê de chocolate para a sobremesa, porém havia metade de um melão na geladeira e, como ele disse que adorava melões, Diana não conseguiu tirar o fruto do cardápio. Sansão comeu toda a metade do melão sozinho. Diana olhava para o homem empanzinado de tanto comer e para o relógio, que ficava sobre a prateleira da sala. Ele lhe parecia uma criança. Para um homem da sua idade comia demais. Quando Sansão finalmente terminou, ela tratou de aconselhar que se deitasse um pouco, na cama, que seria mais confortável. Ele aceitou e ela voltou à carga, tomando novamente a iniciativa dos carinhos. Porém, bastou que ela fosse ao banheiro por alguns poucos minutos, para que Sansão pegasse num sono profundo. Meia hora depois, sentada na cama ao lado dele, ela se perguntava onde havia errado, e ele roncava sem nenhuma cerimônia.
Quando, mais tarde, Diana tomou coragem e decidiu acordá-lo, antes que fosse tarde demais, o telefone tocou novamente. Ela alegrou-se por ele ter despertado, mas logo perdeu a esperança. Era Afrodite, avisando que já estava voltando, mais cedo do que imaginara. Normalmente, ela levaria vinte minutos no trajeto entre o escritório e o apartamento, mas Diana sabia que, naquela situação, chegaria bem antes. Talvez já estivesse dobrando a esquina. Desanimada, ela disse que Afrodite já estava chegando e Sansão pediu para tomar uma chuveirada bem rápida, só para tirar a lombeira.
Quando Afrodite chegou usou a sua chave para abrir a porta, contudo encontrou os dois fazendo um lanche à mesa. Com algumas poucas trocas de olhares desconfiou e, pela receptividade dele convenceu-se, de que o pior não havia acontecido. Que alívio! Sentiu-se tão feliz que se jogou nos braços dele como nunca fizera antes. Depois tentou se recompor, mas não evitou a raiva da irmã, que dirigiu-se ao banho sem conseguir dissimulá-la. Afrodite disse a Sansão que não se preocupasse, que ela era assim mesmo e que depois de um bom banho voltaria ao normal. E foram os dois trocar afagos no sofá. Porém, embora pudessem ouvir o som do chuveiro, pelo buraco da fechadura Diana os observava. Quando percebeu que ele já acariciava o seio de Afrodite, não pensou duas vezes. Tratou de terminar o falso banho e saiu de repente do banheiro para o seu quarto, enrolada na toalha, para provocar a irmã. Como resposta, Afrodite convenceu Sansão a ir com ela fazer um passeio no shopping. Ele perguntou à Diana se ela não gostaria de ir também, mas dessa vez foi Afrodite quem se antecipou, dizendo que ela nunca ia ao shopping e não haveria de resolver ir justamente quando estava chuviscando, “não é mesmo, mana?”. Ao saírem na calçada, Sansão olhou para o céu da noitinha, em que já despontavam as primeiras estrelas, e perguntou a ela pela chuva. Quando saí do escritório estava caindo um chuvisco, explicou ela. Ele olhou então para o chão, completamente seco e sem poças, mas preferiu não perguntar mais nada. Afinal, que diferença fazia?
Em casa, deitada na cama, Diana roia as unhas. Trapaceira que você é, Afrodite... – dizia consigo – Primeiro arrumou alguém para ligar perguntando por outro número, e logo pelo número do açougue! Depois telefonou para pedir o conserto do aquecedor... Com certeza escolheu a empresa mais trambiqueira da lista. Ah, maninha, você me paga... Mas no shopping ela não poderá conseguir nada, o trato é que tudo se decida aqui no apartamento. Depois, ele só virá novamente no próximo sábado... Bem, agora quem tem tempo sou eu. Terei uma semana para estudar isso com muita calma.
Na praça de patinação, enquanto se divertiam com os tombos dos que se arriscavam, Sansão perguntou se ela havia ligado durante o tempo em que esteve no escritório. Afrodite explicou que estavam fazendo uma nova instalação e todo o prédio estava sem sinal telefônico. Portanto, por mais que precisasse não poderia telefonar. Mas não ligou para pedir o conserto do aquecedor? – Insistiu ele. Não, Sansão. Quando saí, perguntei na portaria pelo faxineiro, que costuma fazer esse serviço. O porteiro disse que ele havia sido demitido, mas que procuraria o número de uma firma, que já havia feito isso em alguns apartamentos. Só que ele poderia demorar um pouco a chamar, porque há alguns anos não ligava para essa firma e não sabia de cabeça onde estava o caderno antigo de telefones. Mas por que essa pergunta sua?... Por nada, aliás foi muito bom. Mandaram alguém lá consertar. Precisava mesmo, esse tipo de problema é muito perigoso... Afrodite, apenas balançou a cabeça, mas já ficou imaginando como estava a cabeça de Diana.
...
Afrodite chegou do escritório bem mais cedo do que de costume. Havia almoçado junto com todos os funcionários no pequeno restaurante que ficava no andar térreo do mesmo prédio. Comemorava-se o aniversário do dono do chefe, um velho e bem sucedido advogado, e seu filho, também dito homem das leis, criou o evento porque viu nele uma boa oportunidade para, mais uma vez, tentar convencer Afrodite a ser mais que uma simples secretária. Porém ela, além de já tê-lo recusado inúmeras vezes, por pura intuição só pensava no momento de voltar para casa. Para não fazer desfeita, foi e almoçou, mas muito rapidamente. Ela sabia que o velho não gostava muito dessas ocasiões e não se demoraria a ir embora. Pois logo depois que ele passou pela porta, de saída, foi ela a se despedir de todos. Para desespero do seu preclaro admirador.
Entrou no apartamento, como vinha fazendo, em silêncio, usando a própria chave. Entretanto, para sua surpresa, estava vazio. Foi ao quarto da irmã e logo deduziu que ela havia saído. A julgar pelos cabides que ficaram vazios no guarda-roupa, fora bem vestida. Um resto do perfume ainda estava pelo ar, retido pela janela fechada, e o sapato de salto novo não estava na caixa. Já convencida de que eles haviam saído, Afrodite teve vontade de gritar, o que não era do seu temperamento. Sentia que aquele homem era realmente importante. A expectativa de perdê-lo lhe parecia algo terrível, e a de ter que conviver com os dois debaixo do seu nariz era ainda muito pior. Sempre dizia que sua intuição nunca falhara.
Tomou um banho morno e demorado para tentar relaxar. Vestiu uma camisola fina e confortável, e foi para a cozinha. De tanta ansiedade quase esvaziou a geladeira, fazendo um lanche que seria capaz de saciar até mesmo a Sansão. Pensava que sua irmã, por vezes, parecia ter razão em coisas absurdas. No caso, Afrodite remexia na faca de pão e se lembrava da fixação da outra por capar alguém. Começou a achar que alguns homens bem que podiam merecer mesmo. Ainda estava à mesa quando a porta abriu e por ela passaram os dois. O primeiro impulso de Afrodite foi explodir com Sansão. Mas vendo que Diana passou emburrada para o seu quarto, sem dar nem ao menos um “boa tarde”, preferiu esperar um pouco. Vendo-a com cara de açougueiro, passando o polegar no fio da faca, embora estranhando Sansão veio todo dengoso.
Em tom baixo ela exigiu umas respostas, antes de qualquer outra coisa. E ele prontamente começou a descrever a própria versão do que havia acontecido. Não, Diana não havia telefonado. Ele sim, para deixar o recado de que teria de viajar novamente no fim-de-semana, porque ninguém atendia no telefone do escritório. Então Diana lhe dissera que dava o recado, mas que queria conversar e marcou um encontro no shopping. Foi só isso, meu amor... Afrodite olhava dentro dos olhos de Sansão, fazendo expressão de quem não acreditava muito. E do shopping, vocês foram para onde?... Lugar nenhum, minha deusa... Sansão... – Ela remendou mostrando sua impaciência... Ora, só fomos assistir o filminho do dinossauro pra passar o tempo. Mas por que está achando que fizemos alguma coisa de mais?... Porque você não tem vergonha nessa cara... Euuu? ... – Sansão levantou-se da cadeira, surpreso com a atitude dela, fazendo-se de vítima... Porém, olhando para a calça que ele vestia, ela completou vitoriosa:... E porque sua braguilha está manchada... Sansão, que dinossauro mais guloso esse!!!
Enquanto ele pensava numa saída para aquela situação, Diana passou do quarto para o banheiro, ainda dando os bofes para ele. Não abre demais o gás! – Disse Afrodite assim que a irmã fechou a porta. Sansão começou a contar o que certamente seria uma mentira deslavada, mas Afrodite achou que já estava tudo bastante claro. Pegou o homem pela mão e praticamente o arrastou para o seu quarto. Empurrou o seu corpo imenso para que caísse de costas na cama e começou a soltar o cinto. Novamente surpreso, ele ia argumentando alguma coisa, porém ela lhe disse que calasse a boca, com o tom de uma ordem, e prosseguiu a despi-lo sem cerimônias. O homem não estava acostumado àquilo, era para ele inusitado, porém... Pensando bem, por que não? Afinal de contas, não era o que vinha desejando havia tanto tempo? Muitas vezes imaginara uma viagem bastante semelhante, com a diferença de que ele estava na poltrona do piloto.
Diana nem se dava conta da água que deslizava abundante e quente pelo seu corpo, ainda trêmulo, mas agora pela raiva que ela sentia. Como Afrodite pudera adivinhar o dia e a hora com exatidão? E por que Sansão se demorara tanto a decidir trazê-la de volta? Quis ver a porcaria daquele filme até o final, a ponto de urinar nas próprias calças, antes de chegar ao mictório do cinema! Ele adorou saber seu segredo mais precioso, de que era virgem, porém nem assim quis sair até que passasse a última cena. Ela precisava pensar em alguma coisa rapidamente. Cada minuto era uma perda enorme de tempo. Mas, sob tensão, nada lhe ocorria que pudesse fazer.
Na cama, Sansão parecia estar no paraíso. Afrodite era mesmo uma mulher e tanto, uma deusa da beleza e da sensualidade. Suas formas eram esculturais, sua pele deliciosa e cheirosa, seus gemidos e sussurros bem medidos arrancavam das cavernas da sua ancestralidade um indomável instinto de animal macho. Ele só raciocinava o suficiente para retardar a consumação. Queria que fosse o melhor de todos, o mais belo himeneu desde a Grécia antiga. Entretanto, para Afrodite, nada disso era necessário. Bastava sair-se vencedora, depois disso ele poderia entrar do jeito que bem entendesse. De tudo ela fazia para que, na iminência de um orgasmo, ele se apressasse a enfim fazê-la mulher e feliz. Contudo Sansão era um homem experiente. Se o hímen tivesse um limite de tolerância matematicamente calculável, ele saberia fazer essa conta com a mais absoluta precisão.
Diana diminuiu a vazão do chuveiro, enrolou-se na toalha e abriu a porta do banheiro cuidadosamente. A porta do quanto de Afrodite estava fechada e Diana não resistiu à tentação de olhar pelo buraco da fechadura. Não dava para ver muito, mas aquele traseiro branco e grande se remexendo só poderia ser do Sansão! Então a sua intuição estava certa, Afrodite estava jogando duro, uma cartada decisiva. Diana entendeu que: ou fazia alguma coisa em pouquíssimo tempo, ou não adiantaria mais. Entretanto, fazer o que? Sua irmã estava rigorosamente dentro do trato. Diana buscava uma forma de interromper a brincadeira daqueles dois sem quebrar o acordo que haviam feito. Além disso, tinha torcer para que o homem fosse tão controlado com ela quanto fora consigo.
No ninho das suas delícias Sansão mantinha o controle. Porém isso também se devia a certo escrúpulo por parte dela. Durante aqueles minutos de idílio, apesar do grito preso na garganta, Afrodite se recusara duas vezes a por em prática uma idéia ousada. O homem que, bem maior e mais forte, sobre e entre as coxas dela julgava ter absoluto domínio da situação, sequer imaginava o que passava naquela cabecinha. Como os homens sempre acham, a mulher era uma simples coadjuvante e apenas ele tinha o poder de decidir o momento da consumação, conforme melhor aprouvesse. Afrodite gemia, pedia, implorava, porém ele só ia até o limite. Então recuava e dizia a ela que tivesse calma, ponderava que esperasse um pouco mais, que ainda não era o momento. Apesar de estar quase enlouquecendo, ela esperou estrategicamente e logo ele voltou a pressionar. Foi no exato momento em que se ouviu um pequeno estrondo e em seguida os gritos sufocados de Diana: A toooocha!!!... A tooocha!!!...
Assustado, Sansão levantou a cabeça, olhando na direção da porta. Fez menção de se levantar, porém Afrodite havia trançado as pernas nas suas costas. Lá do banheiro Diana pedia socorro e gritava: A toooocha!... Enquanto, agarrada ao corpo dele, Afrodite lhe implorava: Atoooocha, meu amor... Bem, ao menos por bom-senso, devemos admitir que mesmo um homem experiente, tem o direito de parar para refletir. Pois no caso, antes não o tivesse. Foi justamente nesse exíguo instante de reflexão, que Afrodite cedeu à idéia que lhe perseguia os escrúpulos. Sabia que aquela gritaria era mais uma trapaça de Diana. Pois haveria de ser a última. Sentindo-se na iminência de perder sua melhor chance, de um só golpe, certeiro e contundente, enfiou o dedo médio no traseiro do amante que, no susto, rompeu afinal o limite... Que isso, mulher? Ficou maluca?... Ah, meu amor, você conseguiu, estou tendo um orgasmo orgulhosa de você... – Ela mentiu com um sussurro suplicante... E como os homens sempre pensam saber que têm a verdade nas mãos, e também noutras partes, e que isso lhes dá poder sobre o certo e o errado, ele cedeu cavalheirescamente: Então atoooocha!...

Foto de sweet_angel

Se beberem...não conduzam..para a vossa segurança e a segurança dos outros...OBRIGADO!

"A Triste Realidade

Eu fui a uma festa, mãe.
Eu lembrei o que você disse.
Você disse para eu não beber e eu não bebi.

Eu me senti orgulhosa de mim, como você disse que eu me sentiria .

Antes de dirigir, eu não bebi, mãe, embora alguns amigos insistissem para que eu bebesse.

Eu agi certo, mãe, e sei que você sempre esteve certa.

A festa foi acabando, mãe, e os amigos foram saindo.

Quando eu entrei no carro, eu acreditei que logo chegaria em casa e inteira!

Isso por causa do jeito responsável e doce que você me criou.

Eu dei partida, mãe, e assim que entrei na avenida, um outro carro não me viu, bateu forte e eu fui lançada para fora.

Aqui no solo da avenida, enquanto o socorro não vinha, eu escutei um policial dizer que o outro motorista estava bêbado, mãe, e agora sou eu que pago por isso.

Estou morrendo aqui, mãe.

Eu gostaria que você chegasse logo.

Como isso pode me acontecer, mãe?

Minha vida simplesmente se queimar como um balão?

Ha sangue por toda parte, mãe, e a maior parte é o meu sangue .

Eu agora escuto o médico dizer que morrerei em poucos minutos.

Eu só queria lhe dizer, mãe, jurar que eu não bebi!

Os outros, sim, mãe.

Eles não pensaram.

Aquele que me atingiu, provavelmente estava na mesma festa.

A diferença, mãe, e que ele bebeu e eu e que vou morrer.

Por que ha gente assim, mãe?

Eles não percebem que podem arruinar a própria vida?

Estou sentindo dores agudas, mãe.

O cara que me atingiu esta andando e eu não consigo achar isso justo.

Eu morrendo e tudo que ele faz e ficar parado me olhando.

Diga ao meu irmão para não chorar e para o papai não ficar bravo comigo.

E quando eu partir, mãe, ponha flores do campo no meu sepulcro.

Alguém deveria ter avisado esse cara para não beber antes de dirigir.

Se ele não tivesse bebido, eu ainda poderia continuar viva !

Minha respiração esta enfraquecendo, mãe.

Estou ficando com medo.

Por favor, não chore por mim, mãe.

Sempre que eu precisei, você não falhou. Eu só tenho uma última pergunta, mãe, antes de me despedir:

Eu não bebi antes de dirigir, então por que sou eu a morrer?

Este é o fim, mãe.

Eu gostaria de poder olhar nos seus olhos para dizer estas palavras finais:

Eu te amo ...e... adeus ...

VERÍDICO: Palavras anotadas numa avenida. Se você foi tocado por esta mensagem, divulgue esta pagina o mais que puder, quem sabe assim as pessoas tomarão um pouco mais de consciência antes de cometerem atos que acham que só afetam a eles mesmo "

Foto de Sentimento sublime

Tua Ausencia! Osvania

Tua ausência!

Que me deixou hoje de ti
Com tamanha carência.
M'alma na maior eloqüência.
Vive por você a suspirar.
Bateu uma saudade imensa
No meu coração a rondar.
Levando-me ao portão.
Deixando-me a imaginar.
Que por um pequeno momento
Você viesse ali chegar.
E ao meu amor se entregar.
Fazendo-me a mulher mais feliz,
Acredite!
Minhas lágrimas sem que eu perceba
Começa em meu triste rosto rolar.
Ao sentir que jamais você aqui.
Um dia meu amor poderá voltar.
Lágrimas que molham m’alma
Não sei se de alegria ou saudade
Tenho que voltar a realidade
Porque a minha maior felicidade
Com certeza seria junto de você estar.
Foi somente uma miragem, uma ilusão.
Desse pobre coração
Que por ti não se cansa de esperar.
Continuarei vivendo de ilusões
De sonhos de canções de poesias.
De lindas e mágicas recordações.
Que você veio um dia
Em minha memória plantar.
Quero dizer-te enfim.
Que por mim você foi muito amado.
Não ficará somente em meu passado guardado
Porque as lembranças que tenho de ti
Ficou em um cd gravado
Em minha memória, baixado.
Triste, quieto, calado.
Quem sabe um vulcão em extinção.
Pronto a entrar em erupção.
Ao ouvir as batidas de teu coração.
Perto do meu chegar
Levar-te-ei comigo por onde quer que eu vá.
Já que meu amor não sabe nunca esperar
E quando em mim a saudade de ti
Quiser meu peito sufocar.
Apertarei somente o play da memória
Nosso filme eu verei passar.
Momentos em que estivemos juntos.
Irei nosso amor recordar.
O teu corpo como magia.
No meu corpo a tocar
A tua boca em minha boca,
Meus lábios a molhar.
A tua língua em minha língua,
Unidas entrelaçar.
Assim seria minha felicidade
Um paraíso na verdade
Não sei quando e se um dia
Meu sonho tornará realidade.
Contento-me em relembrar
Nossos belos e mágicos momentos
Em que você em meus braços por minutos
Pude tê-lo para amar.
Descrevo aqui meus mais puros e reais sentimentos.
De que consciente com tua ausência
Tenho amor que me acostumar.
Nunca se esqueça por um segundo
Que o amor maior do mundo
Está em meu peito guardado.
Sempre pronto pra te amar.
Em qualquer hora, tempo ou lugar.
Osvania

Foto de Maria Flor e Rabiscos

Vestida de Vermelho...

Pelas ruas estreitas da madrugada
perdida nesta bruma incompleta
do sonho e da meditação
meus passos arrastados
respiram minutos de solidão.

Vestida de vermelho e nostalgia
a ternura cálida
de um amor ausente.

Sinto-me só
nesta madrugada fria
sem o calor dos teus lábios ardentes
só, sem o delírio dos teus braços
sem o suspiro do teu corpo.

Queria ser vida!

Que esta saudade madrasta
as horas da noite arrasta
em milênios de reflexão.

Meu corpo cansado
indiferente aos sorrisos
de lábios comprados
mas é o seu que tão distante deseja.

Num murmúrio escaldante
teu nome desenho sem tinta nem papel
apenas amor basta.
Amor que é teu
porque apenas tu
em paixão o transformas-te.

Vestida de vermelho
na madrugada que arrasta
esta saudade
e não tem fim...

Foto de Dirceu Marcelino

ERAM DOIS AMIGOS INSEPARÁVEIS

Dois meninos.
Moradores da mesma cidade.
Um de olhos azul outro verdes.
Eram orgulhos da cor de seus olhos?
“_Ah! Meninos vaidosos”.
Falava nossa professora, Dona Marta.
Foram poucos os episódios de que um não participou na vida do outro.
Um deles ainda no “parque infantil”, neste ainda não haviam se encontrado.
Foi quando o de “olhos verdes” fora expulso da escola em face de se envolver em uma briga juntamente com seu irmão de três anos.
Não aceitaram a justificativa do menino de cinco anos e naquela época ele não sabia se defender.
Vamos pular vários episódios, pois, o objetivo deste conto é apenas justificar o porquê da carta-poesia postada aqui e endereçada ao primeiro depois de muitos anos.
Mas, tem fatos marcantes que precisam ser mencionados:
Tal como a apresentação para incorporação ao Exército Brasileiro.
Lembra-se: Todos nós bem arrumados. Você com um terno que parece que fora tirado do baú de seu pai, o mesmo com que ele viera da Espanha.
Eu, com uma roupa esporte.
Na rua um comboio de mais ou menos vinte caminhões do Exército Brasileiro e no ponto de ônibus do Mercado Municipal não parava de descer jovens cabeludos, muitos naquela época queriam imitar os “Beatles”.
Lembro-me que no momento de subir no caminhão meus cabelos longos caíram na testa e meu pai com os olhos lacrimejados dizia:
_ “Pare com isso. Você agora vai ser soldado!”.
Sinceramente, só fui entender isso depois que já estávamos na barbearia do quartel.
Justamente, quando via os que estavam na fila saírem de “coco pelado”.
Cerca de oitocentos jovens com dezoito anos de idade deixavam caídos ali no chão da barbearia madeixas de vários tipos de cabelo, dava-se para perceber que pouca era ruiva, outras loiras, mas a maior parte de cabelos negros e castanhos escuros.
Como os meus. Os seus eram loiros.
Quanta recordação poderia falar do quartel, ei!
Lembra-se daquele que ocorreu dias depois dos cortes de cabelos.
Sabe que como “cabo da guarda” soube por ele próprio que fora uma vingança, pois, não se conformava com o fato de lhe cortarem os cabelos.
Com ele aprendi que cadeia não regenera ninguém, o pior é que ele dando baixa do quartel, entrou em outra corporação importante e a desonrou, pois cometeu um crime maior: “latrocínio”. Justamente contra um industrial alemão que instalava uma indústria em nossa cidade. Esse não é assunto para comentarmos aqui. Muito grave.
Mas eu tenho que mencionar nossa viagem para aquela pequena cidade vizinha, onde participaríamos do desfile comemorativo de aniversário da municipalidade, quando um comboio de seis caminhões nos levou.
Você dirigia um deles e eu estava na carroceria.
Você teria com certeza condições de narrar melhor o acidente ocorrido, pois via a frente uma estradinha de terra batida, o aclive acentuado e a curva à esquerda. Eu na carroceria só pude ver e pressentir o caminhão que derrapava, empurrado pelo obus 105 mm, peça de artilharia muito pesada que ao mesmo tempo servisse para segurar o veículo não o deixando que caísse abruptamente o tombava, devagarinho, dando-me tempo de pressentir a metralhadora ponto 50, tombar e seus ganchos inferiores caírem sobre meu pescoço, mas eu o colocar como um “boxista” entre os ferros e evitar ser atingido.
Salvo desses fomos para o desfile.
Você dirigindo aquele caminhão com a frente amassada e o vidro dianteiro quebrado e eu como sempre na carroceria, com mais dez soldados.
Lembro-me que conforme treinamento feito durante semanas no quartel todos os soldados deveriam descer e depois sob a ordem do comandante todos deveriam subir rapidamente, dando-se às mãos, o que lhes proporcionava subir com facilidade, mas eu, como sempre ficava isolado, sozinho, pois era o “cabo serra fila”.
A que dificuldade foi subir naquele caminhão, primeiro que me desconcentrei ao ver entre os assistentes que se acotovelam uma linda morena de “olhos verdes”.
Ela me olhava de tal modo que me atraía, me seguravam, me dominavam, mas acredito que quando ela percebeu que eu iria passar vergonha pois os caminhões já estavam sendo acionados, ela me liberou e então em movimento mágico pulei e não sei como já me vi segurando os guidões da metralhadora.
Sim. Espécie de guidões, semelhantes ao de uma bicicleta.
E, naquela posição o comboio circulou por toda a praça e ao retornar, novamente, eu vi ali defronte ao cinema, mas sobre a calçada da Praça Rodrigues de Abreu aquela musa.
Alguém poderá perguntar, mas como ele sabe o nome da praça se aquela era a primeira vez que tinham ido aquela cidade. Bem, aí é outra estória, a ser contada no capítulo II do “menino que queria ser maquinista de trem”.
Antes de perseguir o objetivo deste conto, ainda tenho de contar mais uma breve estória, pois ela está registrada nos anais da história do Brasil.
Refere-se ao período ditatorial, mas sobre um episódio no QG do II Exército época de subversão e quando alguém soltou da porta do ginásio de esportes do Ibirapuera um veículo carregado de bombas que adentrou pelo acesso do quartel semi-subterrâneo e explodiu espetacularmente, matando uma das sentinelas. Sua foto consta de arquivos da internet.
Com esse episódio o jovem de “olhos verdes” acabou sendo promovido a sargento.
Posteriormente, terminado o período do serviço militar obrigatório, nos separamos por vários anos, mas outra vez, o destino nos uniu.
Fomos nos encontrar em Campo Grande – MS.
Em uma academia e depois designados para trabalhar na região da tríplice fronteira entre os Estados de Mato Grosso do Sul, Paraná e Paraguai. Esta região ainda fazia fronteira com uma parte do Estado de São Paulo.
Sei que em contos não se devem por nomes. Mas o faço, pois é um conto baseado em fatos verdadeiros.
Verdadeiros mas desconhecidos das autoridades responsáveis, dos chefes, dos governantes.
Talvez, saibam eles de alguns dados estatísticos, do número de carros furtados que são levados para o Paraguai, interessante, ainda hoje da mesma forma que acontecia há vinte anos.
O “menino de olhos verdes” agora se transformara no Delegado Regional e o “menino de olhos azuis” no Delegado de Polícia da cidade mais importante da sub-região. Mas a deste ficava exatamente na confluência da tríplice fronteira.
Este episódio ocorreu em porto Caiuá, local onde estava sendo construída uma usina hidrelétrica no Rio Paraná e a estrada se delineava exatamente sobre a barreira de contenção.
A operação consistia na abordagem dos veículos suspeitos ainda sobre as balsas que faziam travessia dos veículos do Estado do Paraná para Mato Grosso do Sul.
Na primeira incursão foram apreendidos quatro carros, dois Del Rey e dois Monza, furtados na cidade de São Paulo, no dia anterior, cujos veículos eram conduzidos até as pequenas cidades do Paraná, e ali permaneciam aguardando o momento adequado para serem atravessados. Depois faltariam cerca de cem quilômetros para alcançar uma das inúmeras cidades fronteiriças “Del Paraguay”.
Logicamente, desconhecíamos no que consistia esse “momento adequado”.
Outro fato interessante, mas, por favor, não dêem risadas, más é verdade, os presos eram levados para a única cadeia da cidade e ela era de “madeira”. Aliás, a maioria das casas daquela cidade era de madeiras, naquela época. Não sei hoje.
Só viemos, a saber, na segunda operação, quando afoitos em realizar um trabalho maior escalamos doze policiais que deveriam agir em duplas.
O Delegado Regional chefiava, mas também fazia parte de uma dupla operacional, seu companheiro era um Agente de Telecomunicações. Este tinha a incumbência de se comunicar com os demais componentes e transmitir-lhes as ordens operacionais.
Mas que operação, pois, logo após a descida dos carros da balsa, quando tudo deveria estar concluído, o que vê o Delegado Regional, cada grupo de seus agentes, sim, perto dos carros apreendidos, mas aos seus lados, também, outros homens armados, desconhecidos e entre eles ainda teve a chance de reconhecer um famigerado bandido procurado justamente por ser famoso nesse tipo de tráfico de veículos.
O que restou ao delegado regional, ao ver aqueles homens armados caminhando em sua direção, a não ser, lembrar-se do brocardo:
-“Pernas para que te quero”.
Subir então no veículo que acabara de aprender, praticamente, obrigar o preso e o Agente de Telecomunicações a adentrarem no veículo, tomar o assento no banco de motorista, acelerá-lo e arrancar provocando muita poeira e deixar atrás de si uma nuvem.
Acredita que essa ação os deixou momentaneamente desorientados, pois já estava a uma distância de 40 ou 50 metros quando os viu subindo em suas camionetes, alguns na carroceria e começavam a acioná-las e em comboio a persegui-lo.
Poderia dizer que foi uma delícia, se não fosse trágico, mas lembra-se como se fosse agora do ronco acelerado do Monza, vermelho, lindo... “Vrrooouuummmmmmmmmmm” e o chiado dos pneus nos pedregulhos do chão de terra batida “tchuaaaaaaaaaaaaaa”.
A corrida do carro que batia a “Kart” e assoalho em algumas saliências irregulares da estrada que na verdade era a barreira da futura hidrelétrica.
Olhando para trás via que se formava uma nuvem de poeira que com certeza inviabilizava a perseguição dos bandidos e desse modo foi possível ao término da barreira, adentrar em solo pedregoso sem deixar rastros e desse modo adentrar num paiol e enfiar o veículo sob um monte de feno, que parece que ali fora adrede preparado para esconder o veículo como vemos nos filmes americanos.
O feno cobriu o veículo, desceu do mesmo cuspindo capim, o bandido com um monte enroscado em sua algema, o agente reclamando de estar sujando seus equipamentos.
O delegado regional puxou o preso pela algema, praticamente o arrastou e com palavras de ordem obrigava o agente de telecomunicações a segui-lo e assim subiram em um morro, onde em local alto e camuflado, se assentaram. Dali se podia ter uma visão geral da planície formada pelas margens do grande rio e da estrada que se descrevia agora sinuosa para o oeste.
Dentre os veículos perseguidores três camionetes Ford e duas de marcas Chevrolet, além de um Fiat 147.
Sorte que coube aos dois ocupantes do Fiat fazer a verificação neste paiol, onde o Monza estava escondido. Negligentes os bandidos, deram uma espiada e sequer tiveram o cuidado de cutucar com varas o monte de feno. Depois de alguns minutos também seguiram para o Oeste.
E, nós ali.
Passadas cerca de seis horas viu-se ao longe sobre a barreira o ônibus interestadual que se dirigia para a cidade sede da sub-região, dando tempo de escrever, em uma caixa de bala CBC, um bilhete pedindo ajuda.
Entre as dobras da caixa colocou o Delegado Regional outro bilhete, que teve tempo de redigir, afinal ficou ali várias horas.
Depois de mais algumas horas chegou o reforço, o pior, que entre eles retornavam alguns dos mesmos policiais que tinham participado da nefasta operação.
Mas agiam como se nada tivesse acontecido.
Posicionou-se o Delegado Regional adequadamente de modo que pudesse reagir com armas, mas logo percebeu que tudo aparentava certa normalidade, iria fazer o jogo deles, talvez fosse naquele instante a estratégia adequada.
E, assim, retornaram para a sede.
O “bandido” foi autuado por receptação. Presidiu o flagrante o Assistente do Delegado Regional que foi o condutor.
Ah! Que trabalho em vão, o “cidadão” autuado, no dia seguinte foi posto em liberdade por ordem judicial.
Mas, tudo isso se repetiria depois, quando convidado para uma pescaria o ingênuo Delegado Regional foi e lá depois de ter pescado um grande “serubim”, que ajudou a limpar, no momento de saboreá-lo começaram a lhe contar a estória do “Delegado Bigode”.
Bem, esta estória, será narrada em outro conto, talvez, até o término do concurso, logicamente, se esta for bem recebida.
Ah! Sim.
Vocês querem saber por que contei tudo isso.
É simples.
Só quis justificar porque não entreguei a poesia ao amigo ODAIR ANTONIO ORTIZ, diretamente a ele e naquela época.
Justamente, porque, ela a carta-poesia, fora o bilhete que escrevera em um papel de revestimento de maço de cigarros e a introduziu, entre as frestas da “caixinha de balas CBC”. A mesma caixinha e papel que tem guardada em seus arquivos.
Normalmente, esqueço-me do teor das poesias que escrevi horas antes.
Aconteceu recentemente.
Escrevi para “baianinha” e perdi em meus escritos no próprio computador.
Espero encontrá-la. Mas ainda ontem quando não conseguia revisar este texto, em razão de erro de formatação, reescrevi a poesia “Baininha”, mas exatamente, no momento em que falava com ela pelo MSN.
Amigo com tudo isto estou lhe querendo dizer, que da mesma forma que tenho amigas, musas, você foi uma pessoa importante na minha vida, veja, fiz uma poesia, pensando que iria morrer.
Imaginava que você continuasse naquele Estado, como outros de nossos colegas continuaram.
Mas o destino não quis assim, outra vez nos encontramos aqui em nosso Estado, trabalhamos novamente juntos, divertimos em alguns momentos, trocamos nossas confidências e até fomos confundidos com buques de flores que mandamos.
Finalizando, para corroborar nossas brincadeiras, veja como fiz para você tomar conhecimento da poesia que ainda tenho aqui guardada em casa, no papel celofane, revestimento do maço de cigarros e da caixa de balas CBC, que a recuperei, pois afinal. Eu era o Delegado Regional. E, finalmente, desejo lhe dizer que tivemos a oportunidade de acabarmos com Defensores, pois sempre quis sê-lo, como quis quando tinha apenas quatro anos de idade e não conseguia dizer à minha Diretora que agira em “legítima defesa de terceiro” de meu irmão que contava apenas três anos e eu mais velho: cinco.

Foto de Nennika

Palavras...!!!

As vezes achamos que não precisamos dizer certas coisas...Que elas parecem tão evidentes que dispensam palavras...
Que depois de eternas juras de amor...Sabemos tudo um do outro...
E acreditamos que tudo esta perfeito...Não questionamos a felicidade e nos prendemos as cobranças...
E são tantas...
Mas às vezes nos arrependemos quinze minutos depois e não voltamos atrás nunca...
Assim com erros e acertos vamos escrevendo nossa história, que com certeza não é a mais perfeita...
Mais é a nossa história...
E quando eu paro e vejo tudo que vivemos quero acreditar que ainda tenho tempo...
Tempo para te falar o que ainda não falei...
Descobri que as palavras são necessárias que estava enganada...
Elas vêem renovar e reafirmar um compromisso de respeito que assumimos...E eternizar em nossa história esse sentimento tão dificil de ser compreendido...
O amor que eu sinto !!!

Foto de Paulo Gondim

Nossa Música

NOSSA MÚSICA
Paulo Gondim
23/02/2006

Não há como ouvir essa música sem pensar em ti.
É impossível disfarçar o pensamento, desviar a atenção
Todos os acordes, todas as notas me levam para ti.
Como se fosse um rio, uma onda, um oceano,
Que me transportam a teu sorriso, tua paz, tua alegria.

E aí, eu mergulho nesse mundo de fantasia
Que são meus dias longe de ti, eternos, sem fim...
Mas que se tornam breves, pois te sinto perto
Ali, bem juntinho, na minha lembrança
Pois também sei que vives a pensar em mim

E me conforma a certeza desse amor maior
Esse amor só nosso, lindo, puro e verdadeiro
Um amor intenso, porém calmo, sincero
Cheio de paixão, com gosto de um amor primeiro

Por isso ouço essa música, a nossa música!
Sem pressa, baixinho... Só, mas na tua companhia
Que fica na minha lembrança, como criança
Que dorme feliz e sonha com um novo dia

E ouço e repito, várias vezes, essa música mágica,
Encantadora, suave, para compensar a tua ausência
Que me toma por inteiro, que me deixa triste
Pois tua saudade persiste nesta insistência

E, assim, passo os dias que me separam de ti
Desde que nos amamos pela penúltima vez,
E ouço nossa música, por vezes repetida
Na espera ansiosa de que virá a próxima vez

E nessa espera longa, conto os dias, os minutos
E meu coração se deixa levar pelo som
E bate no compasso de cada acorde dessa música tão bonita
Escuto-a novamente, repito-a e continuo a pensar em ti
E tenho mais certeza dessa paixão tão infinita.

Foto de Carmen Lúcia

Diante dos fatos, não há argumentos...

Tentei arrastar-me até a cama...
A nossa cama...irremediavelmente gélida,
Sair do chão, secar as lágrimas...tétricas.
A escuridão da noite, soturna, penetrava o local,
As cortinas acenavam um triste adeus mortal,
Denunciando janelas ainda abertas. desertas...
Um sopro de brisa tocava meu corpo,
Tênue como eu, fraco como eu, triste como eu...
Há quanto tempo ali permanecera?
Minutos, horas, dias? Por que esmorecera?
Aos poucos, as últimas cenas ressurgiam...
Como as de um filme registrado em minha mente
Transtornada pelo eco de palavras eloqüentes
A me acusar, me reprovar, me condenar...
Levantei-me e acendi a luz...Titubeei...
Dentro de mim o negrume de um breu sem fim...Cambaleei...
Relutei para afastar as marcas do que houvera,
De meus rastros pelo chão ao implorar perdão...
De seu fatídico não, olhar de condenação:
-Quem ama não trai! Imperdoável a traição!
Fui fraca, volúvel, não mereço perdão!
Agora... secar o pranto, estancar a ferida,
Encarar de novo a vida,
Recomeçar do ponto de partida.
Retirar dos destroços uma lição vivida!

Foto de elcio josé de moraes

QUERIA TE DESVENDAR.

Eu queria te entender,
Desvendar os teus mistérios,
Como um livro que eu pudesse ler,
E reler até te decorar.

Queria saber o que você pensa,
Em teus minutos de silêncio.
E gostaria muito que fosse,
As mesmas coisas que eu penso.

Sobre a vida, a paz e o amor.
Que a muito eu tenho dado valor,
E é o que tem valorizado a mim.

Que é um sentimento tão puro,
Que a você meu amor eu juro.
Que não tem começo, meio e nem fim.

Escrito por elciomoraes

Foto de Luana Carla Ribeiro

PENSE

A vida passa
Cabelos ao vento
Vem pensamenos
Tempo deixou

As horas passam
Fim do Tormento
Tempestade ao fundo
Tempo de dor

Minutos passam
Que coisa não?!
Vejo você
Tempo parou

Segundos ficam
Instantes momentos
Sinais do caminho
Tempo de amor

Me vejo assim
Sorrindo sozinha
Dedicando versos
Pensamento sem fim

O dia é assim
Começo belo
Duração curta
Noite apagou

Em um arco-irís
Vejo beleza
Sinto a tristeza
Partir em fim

Assim como sou
Sozinha e perdida
Amiga escondida
Solidão acabou

A estrada continua
Vida ingrata
Feridas marcadas
Amor curou

Penso no fim
Com muito pesar
Felicidade limitada
Momentos eternos

Lembranças são assim
Vem e vão
Vem com alegria
Vão com lamento

Tristeza não me faz chorar
Alegria sim
Tristeza somente...
Fortaleza ao alvorecer

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