Meninos

Foto de Francis Raposo Ferreira

Simples Letras

Simples Letras

Ouves palavras nos sinos,
interpretando-as à tua maneira,
tal qual os meninos
quando andam em brincadeira.

As letras te dão carinho,
ajudando a vencer distancia,
um humano quando está sozinho,
escreve sobre a sua infância.

Não importa o que escrever
quando são bons os poetas,
o importante é reviver.

A escrita é boa companhia,
melhor se forem simples letras,
juntas a formar poesia.

Francis Raposo Ferreira

Foto de Carmen Vervloet

Nasceu uma Constelação

Eram jovens! Tão jovens!
Viviam o apogeu dos seus sonhos,
construíam castelos tão altos
e tão belos!
Mas a vida é tão frágil!...
E num breve momento
deixaram a leitura interrompida,
os cadernos incompletos,
o Brasil perplexo e
estes versos caindo como lágrimas
sobre um mar de dor!
O Brasil lamenta a viagem sem despedida...
E os meninos num vôo encantado
chegam ao céu de Santa Maria
e formam uma constelação que brilha
e sinaliza as irresponsabilidades
dos homens da terra!

Foto de Carmen Vervloet

Meus Meninos

Busco sob uma pitangueira,
(Ela já nem existe)
seis pezinhos sujos de poeira
que eu beijava mesmo assim...
E amava tanto, tanto, tanto...
Que chegava a doer em mim!
Foi um tempo que passou
rápido demais!
Que se perdeu entre
horas encantadas,
muitas alvoradas,
o cantar da passarada,
quebra potes e um jardim!
O cheiro da inocência
exalava das noites enluaradas,
num lar onde a harmonia
fazia sua morada.
Mas a infância é fugaz
e o tempo a sorveu, voraz!
Hoje eu busco este tempo
num jardim que não existe,
em lembranças que persistem
gravadas no coração.
Meus meninos cresceram,
mas o ouvido continua
a ouvir aquela canção de ninar.
“Dorme neném do meu coração”...

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Muito Além da Rede Globo - Capítulo 22

Hoje, eu acordei às seis da manhã e fui trabalhar. Depois, lá pelas três, fui buscar o meu parco salário mínimo com o qual pago as contas e a mistura aqui em casa. Da Lapa fui para o Lauzane, para o shopping, onde o banco para o qual ainda devo o cartão de crédito que usei enquanto estava desempregado funciona até às oito da noite. Lá, eu vi um pequeno circo que me chamou a atenção. Estava em cartaz o curioso e gratuito espetáculo do Big Brother.

Dentro de um domo de plástico se encontravam seis jovens. Todos belos, sadios e arrumados. Uma pequena fila se reunia ao entorno da barreira transparente, e os transeuntes saudavam os até então desconhecidos, que efusivamente retribuíam os agrados conforme a sua energia abundante possibilitava.

Ao ver os jovens glamourosos, do alto de um lucro anual de quatrocentos milhões de reais, me senti ao mesmo tempo empolgado e constrangido. Empolgado, pois em poucas vezes na minha vida vi tamanha comoção midiática por esses lados distantes da Zona Norte. Pensei na rua Friburgo, no Peri, no povo todo que vive abaixo da visão da silenciosa Pedra Branca. Pensei nas crianças do Flamengo, insolentes e quase inocentes. Pensei em Mariporã, no Horto, em todas as coisas simples e bonitas que já vi nesse matagal sem fim. Pensei na minha mulher e em Minas, no estado que ela fala com tanto carinho e o qual não conheço nem a sombra de dúvida.

No entanto, fiquei empolgado, mas constrangido. Lembrei que larguei o Serviço Social por migalhas. Lembrei que esses moços muito mais capazes do que eu, e podiam estar fazendo alguma coisa mais útil, nem que fosse uma matéria doando sangue. Lembrei do nióbio que passa debaixo do pano, das pessoas que vi morrer nos corredores, e nem me mexi, do apagão que a Dilma insiste em dizer que é desnecessário, mesmo com o país gastando o dobro da luz que usava há dez anos e sem construir uma usina sequer, nem a polêmica do Belo Monte. Lembrei que não se fala mais do PCC desde que o Corinthians foi campeão. Lembrei do Boninho e do Bial. O Bial, o poeta Bial, o que viu o muro cair e falou com o Mick Jagger.

Da jaula do Lauzane, aquele zoológico, aqueles meninos nem fazem ideia que um operador de telemarketing pensou neles como humanos, e não os bichos que eles pareciam dando tchauzinhos para os maloqueiros.

Espero que a Globo também me dê um milhão.

Foto de poetisando

Porque se entra na solidão?

Ninguém entra na solidão porque quer ou deseja, embora haja excepções. Quem entra na solidão muitas das vezes é porque foram rejeitados, ou pelos próprios pais que os despejaram ainda em bebés e deixaram de os acompanhar, fosse a ir visitá-los, a ir buscá-los para passarem uns dias com os pais, essa criança ficará sempre com magoas por ver os outros meninos a serem visitados pelos pais ou levados a fim de passarem umas ferias com eles, quem já passou por isso sabe o que dói ver isso, e vai acompanhar-nos pela vida inteira, é certo que também varia de pessoa para pessoa, mas estas crianças despejadas em instituições são mais vulneráveis, não é fácil esquecer. Temos também namoros ou mesmo casamentos interrompidos ao fim de por vezes anos de relacionamento, aqui a pessoa entra normalmente 1º numa tristeza digo eu “quase profunda” que lhe é difícil sair dela sozinha, precisa de amigos, amigos de verdade que a ajudem a atravessar essa fase, que a ouçam que estejam ao seu lado, que a incentivem a seguir em frente. Esta última que me refiro fica a maior parte das vezes sozinha, os que ela pensava serem amigos afastam-se, e quando não dizem coitada/o ficou maluco/a por ter perdido o marido, ou o namorado caso namorasse, como se não houvesse por aí mais mulheres ou homens, nestas alturas a pessoa prefere isolar-se a falar seja com quem for a desabafar, o que a pode até levar á depressão. Dou um conselho a todas/os que estão a atravessar uma situação destas, gritem chorem mas nas suas casas, o gritar e chorar também nos faz bem mas não se isolem não chorem ao pé dos outros, porque afinal quando vocês precisaram desapareceu toda agente que vocês tinham como amigos/as esses/as, se vos verem a chorar, são as/os 1º a dizerem que vocês são malucos, ou na “melhor” das hipótese, começam a ver-vos como umas coitadinhas/os. Não tem companhia para sair? E quem disse que precisamos de uma companhia que vai com agente só para fazer frete? Saiam se puderem viajar, viajem, se gostam da natureza porque não ir descobrir a natureza? Ou se morarem perto de praias, vão até á praia escolham sítios na praia que dê para vocês desabafarem, vão ver que o mar faz muito bem, aqui falo por experiência própria faço-o até muita vez. Sei bem que não é fácil ultrapassar essa fase, são dores muito fortes que só quem as viveu é que sabe o que custa ultrapassá-las, e fica sempre a cicatriz, como eu digo a uma amiga muito especial, eu coloco pedras em cima, mas de vez em quando as pedras caem, mas já consigo viver com as mágoas, com as dores do passado.
De: António Candeias

Foto de Rosamares da Maia

MENINO DE PERIFERIA

Menino de Periferia

Sonhando sonhos de menino-homem,
Dorme obscuro nas noites das periferias,
Cama de papelão e lençóis de jornal,
Pesadelo em cada esquina feia e fria.

Mas um menino tem o direito de sonhar!
Precisa de estímulos para sonhar – filosofia.
E não deve chorar porque foi ignorado,
Chamado Homem de segunda classe.
Substrato de pó de trac, de pó e crack.

Políticos pedem verbas, acusam, apelam,
É preciso muito para salvá-lo da perdição!
Resgatá-lo das drogas, de ser soldado!
Mas ele é somente um número, mais um,
Consolidando a estatística da miséria.

Construímos cadeias para a ressocialização.
Não sonhamos os sonhos da educação,
Dos meninos de barriga cheia e limpa
Da Fome pacificada, sono sem sobressaltos.
Dos meninos com cadernos nas mãos.

Um Homem tem direito a sonhos mínimos,
Foge, viaja na sua forma de respirar liberdade,
Reencontrar e resgatar a sua dignidade,
Varrida para baixo do tapete, no lixo comum.

Se ele for subproduto da mestiçagem,
É pardo? Certamente sem boa expressão.
Sua fé será medida, sua alma será pesada.
Quanto vale? Sem tradição. Quem dá mais?

Finalmente realiza sonhos na cela trancada,
Fundas verdades, no fundo, bem caladas.
Fome, preconceito, abandono, omissão.
Para a sociedade, não é nada, nunca foi nada.

Ele não será nada, só mais um elemento.
Mais um, que não soube ser cidadão.
Sonha menino. Capricha na dose,
Até uma over dose. Liberdade menino!
Sua alma está pacificada sua fome é pacifica.
Liberdade passiva - Já não podes respirar.

Rosamares da Maia
22/11/2005
Monografia – Puc RJ

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Muito Além da Rede Globo - Capítulo 18

Essa lei que vocês inventaram e não seguem, essa lei que lhes dá armas e munições, essa lei que protege o próprio e individualiza o público, que generaliza, que almiranta, que inflaciona os narizes cheio que vocês desfilam madrugada afora, essa lei que discrimina em se fazer de vítima aquele que destrói, aquele que é doente em ser doente, aquele que faz sentido e coloca o alheio na reta, que suga os farelos e lambe os escapamentos, essa lei que obriga o vício, o sevicio, a democracia obrigatória e militante, a ditadura dos costumes, das repetições, de cada garrafa e cada cilindro, e cada pino ou pavio, conforme o seu vapor conformista, mutante continuísmo, egoísta, fascista em se olhar em espelhos que nunca se quebram mesmo sendo de vidro, a sua cocaína e as suas igrejas universais não me convencem do contrário, que vocês insistem em alegar favorável, eu não vou comprar um lugar nos seus camarotes, não vou recrutar mais meninos para a morte precoce, de não aproveitar a vida de forma simplória, descarregada, desencanada, desembriagada, a vida simplória de se saber que não é necessário encará-la dopado, que seu desempenho é o seu melhor, sem broxantes olimpíadas de masturbação coletiva, sem coleira e cartões de crédito, sem importâncias, sem barreiras para mostrar quem é certo e quem é errado.

Eis aqui minha plenitude.

Foto de Gideon

A Dança No Escuro

A dança no escuro

Às vezes a poesia não vem em palavras,
Simplesmente dá uma vontade louca de dançar...
Isto mesmo, dançar...
Olho-me na câmera de meu vídeo,
E pergunto-me, com semblante zombeteiro....
Mas você com esta cara de sério, vai dançar?

Não respondo e começo logo a dançar...
Não, não, não é uma dança qualquer,
De um louco mexendo-se sem um ritmo determinado..
Balançando o corpo ao sabor da loucura...

É uma dança planejada.
Dias destes puxei uns vídeos do Youtube
Com um professor de dança do outro lado...
Sigo os seus passos... claro.. que escondido..
Em meu quarto, trancado...
E com o headphone remoto preso às orelhas...

Fecho os olhos e viajo na linha tênue,
Equilibrando-me no tempo de volta à juventude...
E vou lembrando dos amores, dos beijos,
Dos abraços, dos sorrisos, das mãos dadas,
Da família que se foi...
Dos gritinhos dos meninos
Puxando-me pelas pernas jogados ao chão...
Na brincadeira de super homens..

A dança segue o ritmo do professor do Youtube...
Não sei se estou no passo certo.. estou no meu..
O som do headphone apenas serve para guiar-me
Pelo meu devaneio neste iô-iô da vida..
Que balanço em minha mente...
De olhos cerrados.

Ah, quantos enganos, quantas esperanças
Que mostraram serem fumaças apenas...
O meu quarto está escuro.. o vídeo acabou..
Mas eu continuo dançando na escuridão de minha mente...

Agora sentado ao sofá.. registrando esta dança...
Gideon Marinho Gonçalves

Foto de janie

MAE...SEM EXCEÇAO...IMENSIDAO!

a pele da mao enrugada
aspereza que nunca sentiu
prazer de uma mao cuidada
Creme e esmalte nunca viu!

tristeza estampada no rosto
sulcos de desilusao!
rugas na pele cravadas
e lagrimas no coraçao!

destino foi duro demais
amor foi desilusao!
Partiu, deixando incumbencias
Filhos e decepçao!

Maezinha pobre na palhoça
socando sempre seu pilao!
cidade grande nunca viu!
Seu sonho e uma televisao!

Nunca um cabelo cuidado!
Nunca um belo vestido!
Cuidar de todos os meninos
e so o que lhe faz sentido!

Visivel o que ja sofreu!
sofrimento alem do normal!
disfarça pra que nao vejam
mas lagrimas banham o avental!

Finge tao bem a tristeza
esconde suas agruras mil!
a vida passou tao depressa
tao depressa que ela nem viu!

Foto de Rosamares da Maia

Produtos da Fome

Produtos da Fome

Das sombras emergem criaturas medonhas,
Amontoam-se e escondidas, defendem-se,
Prontas para atacar, mostram seus dentes,
Ainda brancos dentes de leite – Por pouco tempo.
Em breve, serão caninos cariados, afiados.
Espúria maternidade! Profana, sem sentido.
Impunidade que certamente será cobrada ao futuro.
E o tributo amealhado em vidas.
Hediondas criaturas. Agora pulam das sombras,
Povoam as ruas, como lhes fosse um direito.
São matilhas solitárias, que solidárias,
Caçam e dividem o produto da sua pilhagem.

Mas não são cães, nem ratos!
- São produtos da miséria e da fome.

Nasceram bebês, foram crianças, meninos e meninas,
Se ainda ousam sonhar é difícil saber.
Têm nos rostos mal definidos, olhos de dor.
Agasalham a realidade sob os viadutos, entre jornais,
Espiam verdades varridas para baixo dos tapetes vermelhos.
Mastigam em sua fome, decisões e providências inúteis.
Meu Deus! Não são cães, nem ratos.
Amontoam-se em uma matilha humana,
Formam a horda dos que têm nome.

- São chamados de h o m e n s.

Rosamares da Maia

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