Dinheiro

Foto de Zaruquita

Minha infância

Minha infância

Comecei de pequenina,
A enfrentar o destino,
Ainda eu era menina,
Ainda quase não tinha tino.
Era frágil e indefesa,
Para viver em conflitos,
Mas resisti à tristeza,
Com meus irmãos pequenitos.

Tinha sete anos de idade,
De manhã ia pra escola,
Depois na parte da tarde,
Tinha de ir pedir esmola,
A minha mãe trabalhava,
Mas mesmo assim não chegava,
Para nos dar de comer.

Meu pai nos abandonou,
A mim e mais três irmãos,
A minha mãe nos criou,
E educou como cristãos.
Meu irmão mais velho tinha,
Oito anos, coitadinho
Como para a escola não vinha,
Arranjou um trabalhinho.

Mal vestido e com pés nus,
Por entre matos e tojos,
Andava a guardar perús,
Por esses matos a rojos.
Lembro quanto ele ganhava,
Só quinze escudos por mês,
O patrão,comer lhe dava,
Minha mãe,aos outros três.

Eu era tão pequenina,
E como era rapariga,
Ia pedindo a esmolinha,
Para encher a barriga.
A minha mãe trabalhava,
Do nascer do sol ao pôr,
Parece que não se cansava,
E nos dava todo o amor.

Foram três anos assim,
Mas todos sobrevivemos,
Mesmo com a vida ruim,
Muito ou pouco nós comemos.
Muito tempo não tardou,
Sem que meu pai regressasse,
Minha mãe o aceitou,
Na esperança que ele mudasse.

Meu Deus,como se enganou,
Logo andou em desacatos,
Desde que em casa ele entrou,
Começaram os maus tratos.
A nós ele maltratava,
Sem ter dó da nossa pele,
O pouco que trabalhava,
Ou ganhava ,era para ele.

Se a minha mãe lhe pedia,
Dinheiro ele resmungava,
E se ela um pouco insistia,
Dois ou três murros lhe dava.
Com tanta força batia,
Que ela ficava a sangrar,
E depois,no outro dia,
Não se queria levantar.

A minha mãe coitadinha,
Lá ia para a sua lida,
Não parava a pobrezinha,
Para ganhar a comida.
Desde que o meu pai voltou,
A vida não melhorava,
E mais um filho arranjou,
Era assim que ele ajudava.

Esse filho veio trazer,
Para mim muita alegria,
Porque afinal veio a ser,
A irmã que eu tanto queria.
Já eu tinha onze anos,
E aquela criancinha,
Foi nesta vida de enganos,
A boneca que eu não tinha.

Arlete Anjos

Foto de Athayde

Velho Caduco

Ah,prazer em tê-lo,
Nesse ensaio...
Após a fábula,
Eu deito ou caio
Aqui na esquina,
Vem sentar!

Mas me perdoe
Caro ouvinte,
Só a experiência,
É meu requinte
E a praça o meu lar...

Pra que dinheiro nessa terra?
Tenho comigo a minerva,
E você a me escutar!

Mas ainda não!
Não se levante!
Minha história é triunfante!
Só ter paciência
E esperar...

Agora sim,você mais calmo...
Não se afaste nem um palmo!
Do que tenho a declarar...

E a família,como anda?
Algum caso de vingança?
E hoje,chove ou vai nevar?

Não!Espere meu bom moço!
Seu tempo é curto,
Eu sempre ouço...
Já vai embora!?
Eu ia contar...

Iria dizer pra mim mesmo,
Que a juventude vai,
Nem vejo...
E a solidão é só pesar..
E esperar...
É amar...

Foto de Edson Milton Ribeiro Paes

"IMPOTENCIA EXISTENCIAL"

“IMPOTÊNCIA EXISTENCIAL”

Quem sou eu???
O que faço neste mar de lama???
A impressão que tenho é que o mundo esta acabando.
Os valores morais já não mais existem.
Se meu Pai estivesse vivo eu ia duvidar de seus ensinamentos.
Tenho a nítida certeza que estamos nas mãos de uma grande quadrilha muito organizada, e que de dois em dois anos temos a obrigação de escolher entre eles quem é que vai ser o chefe da “gang” e quem vai ser o encarregado, mas sempre os mesmos da mesma quadrilha. Parece uma grande historia de ficção, mas não é, isso esta acontecendo no Brasil, onde Parlamentares são pegos por desvios, roubos, abusos de toda espécie, improbidade administrativa ,e são absolvidos por seus comparsas.
Não há em todo território Nacional um único homem publico que não esteja envolvido com o crime organizado, até aqueles que por anos nós admirávamos como esteio de uma classe falida como a dos políticos, hoje nós os vemos na vala comum, seus crimes estão ai aparecendo para quem quiser se enojar.
Sinto-me órfão, desamparado, os impostos que somos obrigados a recolher, cada vez mais caros, vão para os cofres de ladrões inatingíveis por nós pessoas comuns, a Policia não pode fazer nada, não há no Pais órgão superior que possa puni-los, e quem de direito deveria fazer também esta no mesmo barco.Não é possível mais viver assim, onde um Senador da Republica é pego por dezenas de crimes e seus pares o absolvem pois estão todos envolvidos, e nós que sustentamos esta quadrilha???O que fazemos???
O voto???
Uma grande piada.
Só temos o direito de optar por qual dos ladrões vai comandar a quadrilha, não temos em hipótese alguma a possibilidade de mudar este quadro.
Não vejo como reverter este quadro, nossos filhos estão vivendo este momento, vivendo esta mentira, também vão ser criminosos como todos.
Vejo a degeneração da raça humana quando assisto parlamentares grunhindo palavras desconexas em prol de suas pretensas honestidades, me dá nojo ver o que esta acontecendo em Brasília, a mídia também pensa que somos todos retardados, aceita como normais os fatos que estão acontecendo por todo Pais. Parlamentares flagrados em desvios de verbas, em negociatas, em superfaturamento de obras são convidados a entrevistas em programas de grande audiência como se fossem arautos da Nação. Não é mais inteligente ser honesto, os honestos deste Pais são fáceis de detectar, estão todos com os nomes nos institutos de créditos, Serasa, Ceproc, SPC, pois não roubam para poder viver, e como são explorados por um governo corrupto e desumano acabam se complicando.Quem tem valor no Brasil são traficantes, policiais corruptos que tem mansões caríssimas, Parlamentares ladrões, O cidadão de bem, aquele que realmente faz acontecer, aquele que acorda cedo, enfrenta um ônibus lotado pois os donos da empresa são achacados por políticos e fiscais, e por estes motivos não consegue aumentar sua frota e melhorar as condições do transporte, este cidadão que representa a realidade do povo Brasileiro, aquele que produz o PIB do Brasil, este cidadão é encarado como sub-gente, como pedaço de carne putrefata, criado só para produzir consumo e riquezas para este monte de ladrões que transitam por Brasília.
Deixo aqui minha revolta, sei que não é uníssona, mas reconheço que perdemos, não dá mais para voltar atrás, os ladrões ganharam, que fiquem com o Brasil, que fiquem com todo meu dinheiro ( que é pouco), só não vão é levar minha anuência a seus roubos, a suas ações criminosas, eu os desclassifico da escala evolutiva, eu os classifico como VERMES!!!

Escrevi isso depois de ver o desfecho do caso Sarney onde seus pares o absolveram depois de mais de uma dezena de provas cabais contra o Coronel do Maranhão.

Sarney não é único.
A Vergonha é geral.

20/08/2009

EDSON MILTON RIBEIRO PAES.

Foto de Vágner Dias

"O Homem Que Elas Querem"

"O Homem Que Elas Querem"

Elas querem um homem de verdade!
Que seja macho...mas não seja machista,
Que saiba falar...mas que esteja disposto a ouvir,
Que seja firme e decidido...mas que também saiba ser flexível,
Que queira conhece-las por inteiro...e não apenas o seu corpo todo,
Que seja romântico e mande flor...mas que saiba ser safado na medida certa na hora de fazer amor!

Elas querem um homem que as amem!
Que as respeitem...em todos os sentidos,
Que as aqueçam...com beijos quentes,
Que saiba oferecer carinho...e não apenas fazer carícias,
Que as protejam...sem querer dominá-las,
Que saiba conquistar e seduzir...não apenas na hora do sexo!

Elas querem encontrar num homem 7 qualidades!
Não apenas um namorado...mas também um amigo,
Não somente músculos...mas também neurônios,
Não apenas alguém que tenha dinheiro...mas também que tenha " caráter ",
Não somente promessas vazias ou juras apaixonadas...mas também manifestações de amor,
Não apenas um exterior atraente...mas também um conteúdo surpreendente,
Não somente alguém que saiba fazer cenas de ciúmes...mas também alguém que saiba atuar em lindas cenas de amor,
Não apenas alguém que fale bem ou escreva bonito...mas um homem que sobretudo contribua para que a vida faça sentido!

Foto de gilsanjes

TRABALHADOR OCIOSO

Desabafarei meus prantos
Meus lamentos pelos cantos
Minha algoz situação
Estou desempregado
Meu crédito esta fechado
No armazém do seu João
Vivo as broncas da patroa
Dizendo que sou atôa
Que não quero trabalhar
Consultei os classificados
Andei por todos os lados
Não consegui me empregar
Acordei de madrugada
Coloquei o pé na estrada
Fui direto pra estação
O trem chegou lotado
Todo mundo sufocado
Dentro de cada vagão
Dona Maria no aperto
Dizendo que não tem jeito
Que falta solução
Em casa a nega já acordou
Recordando o que sonhou
Que é morar numa mansão
Não tenho dinheiro
Nem pra pagar o peixeiro
Que de esperar já desistiu
O portuga da padaria
Me excluiu de sua freguesia
E se irritou com meu perfil
Acho que vou ao carteado
Com a sorte do meu lado
Arrumarei um trocado
Com fé em Deus vai melhorar
A quem devo, vou pagar,
Trabalhando ocioso.

Foto de pedro felipe

Vende-se um amor

Meus sentimentos já não cabem em meu ser
Já não sei onde eles vou colocar
Que tal pegar eles e vender
A uma pessoa que realmente queira amar

Ando muito diferente
Pois não consigo me sustentar
Mas tenho em minha mente
Que meus sentimentos alguém irá comprar

O preço ? é você quem dá !!
Dinheiro? Isso nem pensar
O que eu quero é retribuição
Um amor que sustente meu coração

Um pouco de carinho, um pouco de amizade
São os documentos que preciso
Te garanto que é de qualidade
Um amor de carinho e lealdade

Foto de Fernanda Queiroz

Poemas de Amor divulga oportunidades - Concurso Literário em Minas Gerais

Prefeitura de Belo Horizonte abre inscrições para o Concurso Nacional de Literatura
Publicado em 03/07/2009 15:14:13

Revelar novos talentos e promover a literatura são propósitos do Concurso. Este ano, os vencedores, além do prêmio em dinheiro, terão a obra publicada

A Literatura contemporânea brasileira tem seu destaque na cidade de Belo Horizonte. Mais uma vez, a Prefeitura da capital mineira lança o Concurso Nacional de Literatura com o prêmio “Cidade de Belo Horizonte”, que este ano contempla três categorias Ensaio, Poesia – Autor Estreante, Dramaturgia e o prêmio “João-de-Barro”, destinado à literatura infantil. As inscrições estão abertas e podem ser feitas até o dia 07 de agosto. Os regulamentos e fichas de inscrição dos prêmios, que estão entre os mais importantes e tradicionais do país, podem ser encontrados no site www.pbh.gov.br/cultura. A realização do Concurso Nacional de Literatura é da Prefeitura de Belo Horizonte, por meio de sua Fundação Municipal de Cultura.

Prefeitura de Belo Horizonte abre inscrições para o Concurso Nacional de Literatura

Desejando a todos os participantes desta casa de poetas, muita inpiração e participação.

Grande abraço

Fernanda Queiroz

Foto de Rosinéri

PARA TODOS OS CASAIS

Aos casados há muito tempo
aos que não casaram, aos que vão casar,
aos que acabaram de casar,
aos que pensam em se separar,
...aos que acabaram de se separar,
aos que pensam em voltar...Por mais que o poder e o dinheiro tenham conquistado
uma ótima posição no ranking das virtudes,
o amor ainda lidera com folga.
Tudo o que todos querem é amar.
Encontrar alguém que faça bater forte o coração
e justifique loucuras.
Que nos faça revirar os olhos, rir à toa,
cantarolar dentro de um ônibus lotado.
Tem algum médico aí???
Depois que acaba esta paixão retumbante,
sobra o que?
O amor.
Mas não o amor mistificado,
que muitos julgam ter o poder de fazer levitar.
O que sobra é o amor que todos conhecemos,
o sentimento que temos por mãe, pai, irmão, filho.
É tudo o mesmo amor, só que entre amantes existe sexo.
Não existem vários tipos de amor,
assim como não existem três tipos de saudades,
quatro de ódio, seis espécies de inveja.
O amor é único, como qualquer sentimento,
seja ele destinado a familiares, ao cônjuge ou a Deus.
A diferença é que, como entre marido
e mulher não há laços de sangue,
a sedução tem que ser ininterrupta.
Por não haver nenhuma garantia de durabilidade,
qualquer alteração no tom de voz nos fragiliza,
e de cobrança em cobrança acabamos por sepultar
uma relação que poderia ser eterna.
Casaram. Te amo prá lá, te amo prá cá.
Lindo, mas insustentável.
O sucesso de um casamento
exige mais do que declarações românticas.
Entre duas pessoas que resolvem dividir o mesmo teto,
tem que haver muito mais do que amor,
e às vezes nem necessita de um amor tão intenso.
É preciso que haja, antes de mais nada, respeito.
Agressões zero. Disposição para ouvir argumentos alheios.
Alguma paciência... Amor, só, não basta.
Não pode haver competição. Nem comparações.
Tem que ter jogo de cintura para acatar regras
que não foram previamente combinadas.
Tem que haver bom humor para enfrentar imprevistos,
acessos de carência, infantilidades.
Tem que saber levar. Amar, só, é pouco.
Tem que haver inteligência.
Um cérebro programado para enfrentar tensões pré-menstruais,
rejeições, demissões inesperadas, contas pra pagar.
Tem que ter disciplina para educar filhos,
dar exemplo, não gritar. Tem que ter um bom psiquiatra.
Não adianta, apenas, amar.
Entre casais que se unem visando à longevidade do matrimônio
tem que haver um pouco de silêncio, amigos de infância,
vida própria, um tempo pra cada um. Tem que haver confiança.
Uma certa camaradagem, às vezes fingir que não viu,
fazer de conta que não escutou.
É preciso entender que união não significa,
necessariamente, fusão.
E que amar, 'solamente', não basta.
Entre homens e mulheres que acham que o amor é só poesia,
falta discernimento, pé no chão, racionalidade.
Tem que saber que o amor pode ser bom, pode durar para sempre,
mas que sozinho não dá conta do recado.
O amor é grande mas não é dois.
É preciso convocar uma turma de sentimentos
para amparar esse amor que carrega o ônus da onipotência.
O amor até pode nos bastar, mas ele próprio não se basta.
Um bom amor aos que já têm!
Um bom encontro aos que procuram!
E felicidades a todos nós.

Foto de cafezambeze

JOÃO PIRISCA E A BONECA LOIRA (POR GRAZIELA VIEIRA)

ESTE É UM CONTO DA MINHA DILETA AMIGA GRAZIELA VIEIRA, QUE RECEBI COM PEDIDO DE DIVULGAÇÃO. NÃO CONCORRE A NADA. MAS SE QUISEREM DAR UM VOTO NELA, ELA VAI FICAR MUITO CONTENTE.

JOÃO PIRISCA E A BONECA LOIRA

Numa pequena cidade nortenha, o João Pirisca contemplava embevecido uma montra profusamente iluminada, onde estavam expostos muitos dos presentes e brinquedos alusivos à quadra festiva que por todo o Portugal se vivia. Com as mãos enfiadas nos bolsos das calças gastas e rotas, parecia alheio ao frio cortante que se fazia sentir.
Os pequenos flocos de neve, quais borboletas brancas que se amontoavam nas ruas, iam engrossando o gigantesco manto branco que tudo cobria. De vez em quando, tirava rapidamente a mão arroxeada do bolso, sacudindo alguns flocos dos cabelos negros, e com a mesma rapidez, tornava a enfiar a mão no bolso, onde tinha uma pontas de cigarros embrulhadas num pedaço de jornal velho, que tinha apanhado no chão do café da esquina.
Os seus olhitos negros e brilhantes, contemplavam uma pequena boneca de cabelos loiros, olhos azuis e um lindo vestido de princesa. Era a coisa mais linda, que os seus dez anos tinham visto.
Do outro bolso, tirou pela milésima vez as parcas moedas que o Ti‑Xico lhe ia dando, de cada vez que ele o ajudava na distribuição dos jornais. Não precisou de o contar... Demais sabia ele que, ainda faltavam 250$00, para chegar ao preço da almejada boneca: ‑ Rai‑de‑Sorte, balbuciava; quase dois meses a calcorrear as ruas da cidade a distribuir jornais nos intervalos da 'scola, ajuntar todos os tostões, e não consegui dinheiro que chegue p'ra comprar aquela maravilha. Tamén, estes gajos dos brinquedos, julgam q'um home não tem mais que fazer ao dinheiro p'ra dar 750 paus por uma boneca que nem vale 300: Rais‑os‑parta. Aproveitam esta altura p'ra incher os bolsos. 'stá decidido; não compro e pronto.
Contudo não arredava pé, como se a boneca lhe implorasse para a tirar dali, pois que a sua linhagem aristocrática, não se sentia bem, no meio de ursos, lobos e cães de peluxe, bem como comboios, tambores, pistolas e tudo o mais que enchia aquela montra, qual paraíso de sonhos infantis.
Pareceu‑lhe que a boneca estava muito triste: Ao pensar nisso, o João fazia um enorme esforço para reter duas lágrimas que teimavam em desprender‑se dos seus olhitos meigos, para dar lugar a outras.
‑ C'um raio, (disse em voz alta), os homes num choram; quero lá saber da tristeza da boneca. Num assomo de coragem, voltou costas à montra com tal rapidez, que esbarrou num senhor já de idade, que sem ele dar por isso, o observava há algum tempo, indo estatelar‑se no chão. Com a mesma rapidez, levantou‑se e desfazendo‑se em desculpas, ia sacudindo a neve que se introduzia nos buracos da camisola velha, enregelando‑lhe mais ainda o magro corpito.
‑ Olha lá ó miúdo, como te chamas?
‑ João Pirisca, senhor André, porquê?
‑ João Pirisca?... Que nome tão esquisito, mas não interessa, chega‑te aqui para debaixo do meu guarda‑chuva, senão molhas ainda mais a camisola.
‑ Não faz mal senhor André, ela já está habituada ao tempo.
‑ Diz‑me cá: o que é que fazias há tanto tempo parado em frente da montra, querias assaltá‑la?
‑ Eu? Cruzes credo senhor André, se a minha mãe soubesse que uma coisa dessas me passava pela cabeça sequer, punha‑me três dias a pão e água, embora em minha casa, pouco mais haja para comer.
‑ Então!, gostavas de ter algum daqueles brinquedos, é isso?
‑ Bem... lá isso era, mas ainda faltam 250$00 p'ra comprar.
‑ Bom, bom; estás com sorte, tenho aqui uns trocos, que devem chegar para o que queres. E deu‑lhe uma nota novinha de 500$00.
‑ 0 João arregalou muito os olhos agora brilhantes de alegria, e fazendo uma vénia de agradecimento, entrou a correr na loja dos brinquedos. Chegou junto do balcão, pôs‑se em bicos de pés para parecer mais alto, e gritou: ‑ quero aquela boneca que está na montra, e faça um bonito embrulho com um laço cor‑de‑rosa.
‑ ó rapaz!, tanto faz ser dessa cor como de outra qualquer, disse o empregado que o atendia.
‑ ómessa, diz o João indignado; um home paga, é p'ra ser bem atendido.
‑ Não querem lá ve ro fedelho, resmungava o empregado, enquanto procurava a fita da cor exigida.
0 senhor André que espiava de longe ficou bastante admirado com a escolha do João, mas não disse nada.
Depois de pagara boneca, meteu‑a debaixo da camisola de encontro ao peito, que arfava de alegria. Depois, encaminhou‑se para o café.
‑ Quero um maço de cigarros daqueles ali. No fim de ele sair, o dono do café disse entre‑dentes: ‑ Estes miúdos d'agora; no meu tempo não era assim. Este, quase não tem que vestir nem que comer, mas ao apanhar dinheiro, veio logo comprar cigarros. Um freguês replicou:
‑ Também no meu tempo, não se vendiam cigarros a crianças, e você vendeu-lhos sem querer saber de onde vinha o dinheiro.
Indiferente ao diálogo que se travava nas suas costas, o João ia a meter os cigarros no bolso, quando notou o pacote das piriscas que lá tinha posto. Hesitou um pouco, abriu o pedaço do jornal velho, e uma a uma, foi deitando as pontas no caixote do lixo. Quando se voltou, deu novamente de caras com o senhor André que lhe perguntou.
‑ Onde moras João?
‑ Eu moro perto da sua casa senhor. A minha, é uma casa muito pequenina, com duas janelas sem vidros que fica ao fundo da rua.
‑ Então é por isso que sabes o meu nome, já que somos vizinhos, vamos andando que se está a fazer noite.
‑ É verdade senhor e a minha mãe ralha‑me se não chego a horas de rezar o Terço.
Enquanto caminhavam juntos, o senhor André perguntou:
- ó João, satisfazes‑me uma curiosidade?
- Tudo o que quiser senhor.
- Porque te chamas João Pirisca?
- Ah... Isso foi alcunha que os miúdos me puseram, por causa de eu andar sempre a apanhar pontas de cigarros.
‑ A tua mãe sabe que tu fumas?
‑ Mas .... mas .... balbuciava o João corando até a raiz dos cabelos; Os cigarros são para o meu avôzinho que não pode trabalhar e vive com a gente, e como o dinheiro é pouco...
‑ Então quer dizer que a boneca!...
‑ É para a minha irmã que tem cinco anos e nunca teve nenhuma. Aqui há tempos a Ritinha, aquela menina que mora na casa grande perto da sua, que tem muitas luzes e parece um palácio com aquelas 'státuas no jardim grande q'até parece gente a sério, q'eu até tinha medo de me perder lá dentro, sabe?
‑ Mas conta lá João, o que é que se passou com a Ritinha?
‑ Ah, pois; ela andava a passear com a criada elevava uma boneca muito linda ao colo; a minha irmã, pediu‑lhe que a deixasse pegar na boneca só um bocadinho, e quando a Ritinha lha estava a passar p'ras mãos, a criada empurrou a minha irmãzinha na pressa de a afastar, como se ela tivesse peste. Eu fiquei com tanta pena dela, que jurei comprar‑lhe uma igual logo que tivesse dinheiro, nem que andasse dois anos a juntá‑lo, mas graças à sua ajuda, ainda lha dou no Natal.
‑ Mas ó João, o Natal já passou. Estamos em véspera de Ano Novo.
‑ Eu sei; mas o Natal em minha casa, festeja‑se no Ano Novo, porque dia de Natal, a minha mãe e o meu avô paterno, fartam‑se de chorar.
‑ Mas porquê?
‑ Porque foi precisamente nesse dia, há quatro anos, que o meu pai nos abandonou fugindo com outra mulher e a minha pobre mãe, farta‑se de trabalhar a dias, para que possamos ter que comer.
Despedíram‑se, pois estavam perto das respectivas moradas.
Depois de agradecer mais uma vez ao seu novo amigo, o João entrou em casa como um furacão chamando alto pela mãe, a fim de lhe contar a boa nova. Esta, levou um dedo aos lábios como que a pedir silêncio. Era a hora de rezar o Terço antes da parca refeição. Naquele humilde lar, rezava‑se agradecendo a Deus a saúde, os poucos alimentos, e rogava‑se pelos doentes e por todos os que não tinham pão nem um tecto para se abrigar., sem esquecer de pedir a paz para todo o mundo.
Parecia ao João, que as orações eram mais demoradas que o costume, tal era a pressa de contar as novidades alegres que trazia, e enquanto o avô se deleitava com um cigarro inteirinho e a irmã embalava nos seus bracitos roliços a sua primeira boneca, de pronto trocada pelo carolo de milho que fazia as mesmas vezes, ouviram‑se duas pancadas na porta. A mãe foi abrir, e dos seus olhos cansados, rolaram duas grossas e escaldantes lágrimas de alegria, ao deparar com um grande cesto cheinho de coisas boas, incluindo uma camisola novinha para o João.
Não foi preciso muito para adivinhar quem era esse estranho Pai Natal que se afastava a passos largos, esquivando‑se a agradecimentos.
A partir daí, acrescentou‑se ao número das orações em família, mais uma pelo senhor André.
GRAZIELA VIEIRA
JUNHO 1995

Foto de HELDER-DUARTE

Sede

Oh vós, os que sede tendes!
Vinde às águas!...
E os que dinheiro, não tendes!
Vinde às águas!...

Vinde e comprai e tomai!
De graça, achai!...
E comei sem dinheiro!
O bom e o que é caseiro!

Vinde! Não gasteis mal,
O dinheiro! Vosso! Sim!
Pois é de Deus, também afinal!...

Vinde a ele às águas!
E bebei e comei mel, sem fim…
Vinde e lavai vossas mágoas!

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