Quando eu morrer...
Que seja sem aviso,
Que seja breve e bem longe de olhares.
Porque eu não quero ter que ouvir de alguém o tempo que me resta.
Um,
Dois,
Três meses para viver á pressa.
Não!
Que seja breve!
Não quero ter tempo para despedidas,
Telefonemas consecutivos,
Ter a pressa,
De novo a pressa,
De contar aos amigos.
Não quero ter que pedir á minha esposa
Que cuide bem dos meus filhos,
Que arranje um marido.
Não quero ter que reuni-los
E um a um lhes fazer um pedido.
"Cuida dos teus irmãos".
Não quero ir assim,
Escondendo aos netos.
Não quero ter que ouvir os talheres á mesa,
O silêncio,
Ver lábios tremendo,
Olhares desviando.
Não quero ter a família me limpando a casa,
Fazendo o pouco que podem fazer por mim.
Não!
Não quero ficar olhando para a televisão,
Vendo o jogo da jornada,
A novela que já não diz nada,
Sentir o quanto insignificante tudo se torna de repente.
Ver o meu futuro.
Não, não quero ter que ir trabalhar para pagar
Os medicamentos e cada prego do meu caixão.
Não quero chegar á terceira semana de "vida" em que tudo é caimbrã,
Em que o ar não chega e a dor não passa
E pedir morfina,
Cura e sentença.
Meter cunha e pedir ao filho
Que a vá buscar á pressa.
Pois há pressa.
Ver meu amigo condoído,
Chorando,
Me injectando,
Consciente do perigo.
Ambulâncias.
Noite que nem imagino.
Madrugada.
Premonição.
Dia de visita.
Desorientação.
"Senta-te".
"O Pai morreu".
Como pode?
Não!
Não quero isso!
Quero morrer bem longe.
Que ninguém me encontre.
Não quero voluntários para reconhecer meu corpo.
"Meu Deus! Pai?!"
Pra quê?
Não!
Não quero velório.
Fato velho e caixão pobre.
Onde tudo é amarelo, algodão e morte.
Onde o silêncio só se quebra com uma mão no peito (como que cobrando vida)
E o choro de um adulto.
Foto em café,
Hora marcada,
Gente de pé,
A corda levando,
Uma mão de terra,
Uma pá de terra,
Dez pás de terra,
Um monte inteiro de terra pelas mãos de um estranho,
A pedra tapando,
As flores rodeando,
O regresso a casa,
Um nó me apertando,
A roupa dobrada,
A parteleira meia de leite vitaminado,
(Que não serviu para nada)
Um sem fim de saudade
A lágrima que não me lembro de ter chorado.
Quando eu morrer
Data de publicação:
Quarta-feira, 5 Julho, 2006 - 00:42
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Comentários
poeTrabis
Eu não gosto de falar de morte,até porque é a nossa única certeza..Eu prefirriria virar purpurina..ou morrer de amor...Mas,já que isso é certo,ter que morrer,quero morrer,em um unico suspiro,sem ddor,aaapenas com aamor...e já avisei..aqui em casa..caaaprichem no meu visual..rs..qquero chegar fashion,pra onde eu for...e nada de flores..não sou jardim..para ter flor por cima de mim...Mas nem quero pensar nesse dia não! Mas a familiaa tb já sabe..que eu sendo doidinha,vou morrwer gagazinha em algum asilo psiquiatrico por ai...e o bom é que nem vou saber que morri...Vida longa aos insanos..e ao amigos dos insanos(vc esta nessa,Trabis)Beijocas..vivinhas em ti
Olá Trabis
Sem querer vc me fez lembrar dos últimos dias da pessoa mais importante da minha vida...
E realmente se ver obrigado a passar por tudo é muito castigo, muito doido, muito....sei lá...
Enfim com a nossa única certeza aprendi a lidar (Até que venha a próxima, Deus me livre) por enquanto... Nem imagino de que jeito gostaria de morrer... não mesmo... adorei seu texto... me emocionei demais...
Abraços,
~;-)
Sra. Morrison
Sra. Morrison
Trabis,
Este teu poema é ..de morte.
Puxa, estava vendo meu próprio filme. Sinto como vc, morrer por morrer quero-a sem saber, que venha rápido.
Muito bom mesmo.
Olá!
A morte é sempre um tabu, mesmo quando acreditamos que a vida continua depois. Mas, não tem jeito... Você foi forte e emocionou na forma como escreveu. Parabéns, cara! Um abraço amigo e vamos aproveitar a vida!!! LeandroCesar (Cesare)
Cesare (LeandroCesar)
TrabisDeMentia
Aqui retratas o desejo de muitos (ou, quiçá, de todos).
Entendo bem do que falas, porém nem pensar em partir por ora, rsrs.
Meu voto, com louvor!
Beijos.
Goreti