A FILA DO LEITE
(Paulo Gondim)
Num sonho, vi pobres mulheres
Com surradas sacolas de supermercados.
Sacolas plásticas e pequenas,
Porque pequenas também eram suas poucas compras.
Enfileiravam-se de forma sinuosa,
Olhares “compridos” por sobre os ombros das outras,
Como se esperassem um pequeno milagre.
Milagre este que se resumia em dois saquinhos de leite.
Vinham tristes, caladas e de semblante fechado,
Como se fecharam também seus corações
Pela brutalidade de maridos pobres,
Que lhes geraram muitos filhos (ainda mais pobres).
E saíam da mesma maneira que chegavam...
Sem um sorriso, com a roupa humilde, o olhar perdido;
A esperança desfeita, os sonhos castrados
De pessoas que pouco têm e tudo lhes faltam.
E no sonho eu via suas dores diárias,
A rotina de fome, o ciclo de miséria.
E voltavam na mesma fila do pequeno milagre.
Olhavam-se caladas e saíam caladas
Prá viverem mais um dia de escassez,
Que a injusta pobreza lhes reservara.
E do sonho acordei e me assustei,
Quando vi, do outro lado da rua,
A mesma fila de mulheres sofridas,
Mal alimentadas e mal vestidas
Com suas pequenas sacolas de supermercado
(Aquelas que pensava só existirem nos sonhos)
E pegavam um litro de leite quase mendigado.
Comentários
Stacarca - Paulo Gondim
Oi Paulo Gondim, sei que não tem nada a ver uma coisa com a outra, mas confesso que esse seu poema fez-me lembrar Lord Byron (trevas), apenas com máscaras diferentes, achei magnífico. Parabéns!
Stacarca
Oi, Stacarca
Confesso que não conheço a obra apontada.
Este texto foi feito com base em fatos reais, e ainda continuam na cidade de São Paulo, as famosas entregas de leite, fornecido pelo Governo Estadual. Não sei se é motivo de satsifação ou de humilhação. Mas é do jeito que descrevi. Lamentavelmente...
Abraços e grato pela visita e pelo comentário!
Paulo Gondim
Paulo Gondim