Prosas

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Quase Declaração

Sol que ilumina minhas manhãs trazendo esperança em mais um dia de luta e vida até a noite mais estrelada. Seu sorriso é o verdadeiro sentido dos supremos sacrifícios realizados em seu nome. Beijei com meu olhar seu lindo rosto, tez de menina que o tempo não apaga e presença irradiante de amor que o coração nunca esquece.

Conversa.

Muito além das descrições de personalidade, das cartas registradas nas gavetas das eras, das paixões que não se correspondem e ainda assim enviam mensagens, das moças que gostam de se sentirem desejadas e não aceitam ouvir uma negativa, mesmo que dos corcundas e suas corcovas que saltam aos sustos, existe o vento do cotidiano, o medo da conta atrasada, o cobertor dos seguros de morte e conseqüência, as mães que escondem por debaixo de seus vestidos recatados mulheres de lava e magma, longe das infâncias perdidas ou qualidades evidentes. Fica difícil conciliar o sonho ao real. Graças ao bom Deus, há a desilusão do agnosticismo.

Homens, infiéis na essência da poligamia ancestral, se rendem para a sobrevivência de sua espécie fraca. Antes fossem esparsos. Tomaram como praga os cinco continentes geográficos, tendo bases fixas nos distantes pólos mais gélidos. Há os homens que possuem competência para se tornarem leões, e os que são como os pombos, monótonos e monogâmicos. Biologicamente o primeiro é melhor, e se reproduz facilmente. Um homem comum nunca vai chegar ao ápice de evoluir factualmente, nunca superará suas expectativas, sempre verá seu objeto de querer distante de seus braços, separado por um tapete de pregos e cacos de vidro. Resta, então, poupar dinheiro para a previdência social, ser corno e subempregado, tentar ter uma casa no litoral sul. Não há sequer como conviver com as despesas do seu velório, do seu enterro moral de aluguéis e despejos, seu pouco de orgulho em pertencer a uma sórdida periferia bandida. Há a indigência velada, a marginalidade dos que são preteridos no processo seletivo da vileza do destino.

Existem mulheres que passam a vida inteira sem receber uma declaração de amor, e moças que bocejam diante de várias delas. Existem pessoas que merecem uma chance, e não conseguem. Outras que imaginam um céu resplandecente no futuro, que a tão esperada felicidade vai lhes cair no colo uma hora ou outra, e estatelam a face na primeira cilada que o asfalto dos questionamentos impõe aos que se dirigem desavisados.

Que bom que a juventude acaba logo.

Foto de Arnault L. D.

Estatua Branca

Na beira de um estrada, aonde a grama se perdeu entre ervas daninhas, existe uma estatua branca. Agora nem tanto... Porque a Lua e o Sol seguindo a cruzar o céu, muitas, e muitas vezes, datas, anos, décadas, a tingiram de tempo.

Ela retrata um lindo rosto... com o olhar cheio de amor. E uma história, triste, que ninguém mais sabe, ou quase.

Figura alguem que fora muito e muito amada, e por estocadas, cuidadosas, de cinzel, este amor foi eternizado, talhado ao mármore frio. Uma ternura tanta, que não deixa espaço à duvida, e fala em voz alta, ser obra de quem lhe dedicou este amor.

E esta entrega foi tão linda e sincera... Que até mesmo os ateus veriam nela algo de divino.
Mas, infelizmente, acontece que o divino e o humano, são coisas distintas.... E ela se foi.

Além do amor, existem outras riquezas, riquezas estas que o homem do cinzel não possuía.
Mas, que um outro, sim.
E ela escolheu, e se foi.

Para ele, restaram aqueles olhos na pedra fria... talhada e branca, para mesmo assim teimar em pedir:
_ “...Volta, volta amor... !”
Mas, apenas a loucura respondia....
E repetiu por tanto tempo, que o tempo passou..., que o tempo acabou.

Quanto a ela, longe dali, muito longe... descobriu que o preço das “coisas” é sempre em metal, mas, o valor... não. Certos valores são incalculáveis. São pagos por primícia, presentes de Deus, coisas de divindade...

E muito rica, constatou esta verdade, e que sempre, não é para sempre. E envelheceu.
Para ela o tempo passou, na certeza gélida das coisas incompletas... Seus olhos nunca mais foram como na branca estatua.... Aquele olhar, aquele amor; preterido, diminuído...

E o tempo passou, e o tempo acabou...

Lá na beira de uma estrada, onde a grama se perdeu. Existe uma estatua branca.
Dizem que as vezes, quando o luar compete com as gotas de chuva, quem passa por ali, se prestar bem atenção, pode ver quando a agua a banhar o pálido rosto, empresta-lhe um pouco de vida, na forma de lagrimas...

Por seus olhos a chuva chora...
Na espera de um antigo amor, a pedir: Volta, volta...

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Minha Elis – Parte 1

O ano era 1996, para variar. Eu morava na favela com a minha família. Não havia muito o quê fazer. Na televisão, tinha a Xuxa, a Sandy, a Maria do Bairro, e, diferente das outras casas, na nossa elas não faziam muito sucesso. Nós recortávamos tudo aquilo que sabíamos que não tínhamos dinheiro para comprar, e colávamos num papel para pendurar no único armário da casa, de duas portas e metro e meio, pouco mais que uma fruteira. Mas a maior diversão não era essa. Meu pai fazia uma espécie de rádio de um hipermercado no centro da cidade. Quando havia alguma promoção, ele trazia o máximo de coisas possíveis para a gente. E também tinham os discos. Todos dele, material de apoio para o trabalho que apesar de desdenhar em certo ponto, ele fazia com competência extrema. Mas a realidade não era tão boa assim. Mas meu pai era bom no serviço, e sacana no lar. Quando eles se separaram, foi um alívio. Mas, com o litígio, perdi em certa medida a melhor parte da minha modesta, porém digna bagagem cultural. Meu pai é ator, tem como base da carreira o movimento da tropicália. Ouvíamos a MPB, como ela é rotulada, todos esses artistas consagrados, de Caetano a Gil, Raul a Tim, e principalmente Elis Regina. Minha mãe cantava quando nova e mesmo sem grandes lucros, chegou ao profissionalismo. Sempre vi a imagem da minha mãe relacionada com a de Elis Regina. Era como se uma existe em função da outra. Era assim, na época em que me dei por gente.

Com a separação, perdi o contato com a obra de Elis Regina. Minha mãe era reticente quanto ao resgate desse conteúdo; era momento de sobreviver, e não pensar em música. Mas Elis, no meu âmago, foi ganhando o status de lenda. Elis morreu em 1982. Evidente que a imprensa, sem material novo, já não dava a mesma repercussão ao trabalho da cantora. Eu queria Elis. Sempre quis Elis, com o perdão da rima fácil. Quanto menos tinha, mais queria. Volta e meia se preparava um programa especial de televisão ou rádio, e lá estava eu assistindo. Foi assim até 2008. Nessa época eu já trabalhava. Na internet, procurava músicas e dados biográficos de Elis. Não sou o maior seguidor de Elis Regina, nunca fui, mas não me ligo nisso. O que sabia era que a artista me fascinava e queria o máximo possível de informações dela.

Um dia, já em 2009, no caminho da minha escola encontrei um desses camelôs que vendem música pirateada. Estamos na era do MP3. Nunca me importei muito com compra de discos, até os falsificados são caros demais para meus parâmetros. Perguntei se tinha Elis. O gaiato me mostrou três discos, segundo ele, a coleção completa. Tinha tudo mesmo! E era por uns vinte reais. Desnecessário dizer, amigos, que duas semanas depois cometi o

que considero até hoje um “crime famélico”. Era isso, ou então empenhar tempo e esforço numa gigantesca extravagância financeira. Acreditem que não me arrependo nem um pouco com essa decisão.

Com a compra da discografia de Elis, vi que tinha adquirido também uma enxurrada de música brasileira de alta qualidade. Já escrevia, e influenciado pelos compositores que trabalharam com ela, tive um salto no teor das minhas criações. Percebi que Elis não era só sua música, era a história do meu país acontecendo diante da minha sensibilidade. Era questão de tempo até que fosse lembrada nos meus textos.

(Continua...)

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Muito Além da Rede Globo – Capítulo 12

Administrar um fundo monetário internacional na teoria é ter uma posição de muito poder e prestígio na realidade em que vivemos. Na teoria, é como se o sujeito fosse o chefe do banco do mundo, um Sílvio Santos melhorado, sem o sorriso forçado e o cheiro de circo mambembe. Administrar um fundo monetário internacional na teoria é ter dinheiro para dar e emprestar, colocar de joelhos nações continentais e influir diretamente na vida de milhões de pessoas. Administrar um fundo monetário internacional na teoria é fazer o planeta girar a sua volta, é ser presidente de algum país se desejar, ser o dono da bola, de modo literal ou não, é ser alguém que na teoria só pode ser atingido por forças maiores.

Não é bem verdade.

Administrar um fundo monetário internacional é carregar o duro carma de crianças que morrem de fome e miséria. É ter nas mãos o tabuleiro, sem de fato mover as peças. Administrar um fundo monetário internacional é deixar de ser humano em alguns aspectos, é se robotizar, tornar-se um cargo, um encargo. Um administrador de fundo monetário internacional na verdade é a caricatura de uma pessoa, na teoria não erra e tem as opiniões mais inteligentes possíveis, desperta inveja, e pode fazer da sua e de outras vidas o que quiser. Uma inverdade.

Administrar um fundo monetário internacional é ser gente do mesmo jeito. È sentir atração pela mulher mais próxima, tomar banho, não se vestir. Faltou bom senso àquele senhor de setenta anos, que se encorajou em ser tarado, certo de sua fiança. Administrar um fundo monetário internacional é ser rejeitado por ser velho e sentir-se humilhado por isso, também. Só que aquele homem não se lembrou disso. Nem todas as reservas financeiras curam a já conhecida sina de se ficar marcado negativamente. Isso sem contar no susto que a camareira levou, proposital ou não, nessa eterna incerteza que são todas as acusações.

É por isso que não somente o amor é injusto, a excitação também é.

Foto de ALEXANDRA LOPUMO SILVA

A musica da minha vida

Todo mundo tem uma musica que marcou uma coisa importante da sua vida, ou quase todo mundo, às vezes uma alegria, uma amor, uma separação, uma dor de cotovelo.
A musica tem esse poder, de trazer de volta uma lembrança, trazer do passado uma emoção já vivida, despertar sentimentos que julgavamos esquecidos, adormecidos.
Em tempos que grandes estrelas da musica internacional, descobrem o Brasil: U2, Paul MacCartney, Elton Jhon, etc, a musica que marcou minha vida, talvez esteja a altura desses grandes artistas, mas com uma brasilidade incomparável: Canção da América - Milton Nascimento.
Essa musica, fez fundo para minha entrada na adolescencia, e parecia que o mundo era meu, e eu poderia realizar tudo que sonhava, não consegui tudo o que queria, mas aprendi qua a vida, é bem mais que um sonho de uma adolescente.
E você, qual a musica que marcou sua vida?

Alexandra

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Muito Além da Rede Globo – Capítulo 11

Vou começar este texto por uma anedota. O filho chegou ao pai e pediu para que o deixasse trabalhar como cabeleireiro. O pai falou-lhe que era serviço para gay e o proibiu. Depois, o filho pediu para ser costureiro, e o pai desaprovou a idéia também. Depois o filho pediu para ser decorador, e o pai novamente deu-lhe a mesma resposta. Resultado: o filho tornou-se gay e não aprendeu a fazer nada.

Os mais perspicazes já sabem de quem estou falando. Por questão de fazer o texto mais charmoso não citarei o nome da Nossa Excelência. O pretenso fundador do Partido Nazista do Brasil, o elo perdido entre a época do telex e a das redes sociais. Parou no tempo, o “progressista”. Estacionou numa época de inquisição e repressão que de fato, nunca existiu.

Gente, a homossexualidade sempre existiu. Não estou defendendo aquele pensamento de que o mundo é gay e todos deveriam sê-lo. Longe disso. Mas esse negócio de que é novidade é a maior mentira. As instituições foram criadas depois de milênios de selvageria evolutiva. Lá, valia tudo. Nunca existiu Adão de roupa, pecado original, carruagem de fogo. O povo fazia suas lendas para aplacar o medo do desconhecido, criava deuses para explicar o que a mente ainda não podia ou não queria discernir. E lá, se uma pessoa desejava sexo com a outra, não tinha essa história de consentimento, as coisas podiam se resolver na violência. O mundo sempre foi dos mais fortes, mesmo após a consolidação da civilização.

Hoje, nos países um pouco mais livres, como é o caso do Brasil, as relações se dão com aceitação de ambas as partes. Se uma pessoa força a outra ao sexo, vai, na teoria, para a cadeia. A não ser que tenha muito dinheiro, mas isso fica para outra crônica. Se um político confunde homossexualidade com pedofilia, é no mínimo mal intencionado, ou está escondendo algo. É evidente, é só observar um pouco para ver que não há laços diretos entre as práticas. Ouso duvidar de seus propósitos.

Nossa sociedade tida como tão pacífica está repleta de violência. Ou seja, vamos ponderar: melhor dois homens se beijando do que trocando tiros. Se no paraíso que o deputado acha construir não há lugar para os gays, ou para os negros, que ele parece imaginar em uma nova situação de apartheid, está completamente equivocado. Vale lembrar que a representação mais famosa de Cristo que temos é a de Da Vinci. Uma mulher de barba, um anjo feito por um dos tantos artistas homossexuais que misturavam sua condição a sua obra, desde sempre. Uma criação para a qual todos nós os cristãos se ajoelham. Larga a mão de ser hipócrita, meu irmão.

Foto de João Victor Tavares Sampaio

Quase Supremo

Quem ama tenta se iludir. O mundo é muito grande, mas quem ama de verdade sempre tenta se iludir. Procura uma verdade oculta nos olhares distantes, aquele que ama, Procura satisfazer o desejo impossível de nunca dizer nunca, adeus, saudades de ti. Não coloco aqui a barreira do dinheiro, da paixão, das religiões. Quero apenas dizer que quem ama tenta se iludir, de um amor recíproco e sincronizado, único na sua diversidade.

O amor é injusto e desencontrado. Eu, e uso esse pronome sem medo desta vez, acredito sinceramente que esses anjos que atiram flechas nas pessoas são todos meio ceguetas. Uma mãe pode não amar um filho, e suplantar seu bem querer, ou seu tesão, com o brucutu ali da esquina. Cito em mais uma oportunidade o estilo quase agressivo rodriguiano. Copio, a bem da verdade. Lasque-se, odeio os palavrões desnecessários no texto! Se os suaves anjos da opinião, que acreditam em um amor puro, leve, matemático, acreditam que os sintomas são claros e que suas causas são igualmente lógicas, então me calo cínico diante das imagens dos santos, belos e perfeitos, imutáveis, criações frias do imaginário popular.

O amor é um sentimento doentio. Mente, rouba, mata, atravessa fora da faixa. O amor é ao mesmo tempo duro e sutil. Ele engana, e é exatamente isso o que queremos. Sentimos-nos bem, ao nos enganarmos com o amor! Talvez, vendo de um âmbito filosófico, lembramos que é do amor de um homem e uma mulher que se adia a morte. Perpetua-se a vida com mais uma vida, por meio do amor. E amamos quem queremos, mesmo que no inconsciente. Escondemos muitas vezes os sentimentos mais fortes para não demonstrar a fraqueza óbvia do amar. O coração bate mais rápido, levando nessa velocidade apavorante o tempo que temos. A carne esquenta. Um ser humano não é mais humano, é vulcânico. As descrições todas se tornam superficiais. Os parâmetros perdem seu maior crédito.

Quem ama gosta de se iludir, diante das mentiras mais absurdas. São as inverdades que nos sufocam, quando queremos o não e não o achamos, quando o sim é breve e aguarda um para sempre.

Foto de ALEXANDRA LOPUMO SILVA

Final de tarde

Final de tarde, como é lindo
O céu surpreende em cores
uma mistura de azul e rosa

O sol bate e aquece meu corpo
minha tristeza se derrete com o calor do sol
meu coração gelado
de tantas lágrimas sufocadas
lamentos, angustias e dores

Ele é o rei
O seu brilho ofusca minhas ideias sombrias
Dentro de mim uma paz, faz um sol de esperança nascer
Amanhecer de felicidade
Reina o sol
Reina a paz

Alexandra

Foto de ALEXANDRA LOPUMO SILVA

A máscara

Quem sou eu?
Não me vejo
Onde está meu rosto?
Não escuto minha voz
minha cabeça dói, no meio de meus pensamentos
não consigo arrancar esta máscara, que dói
grudada em meu rosto
enfincando na carne, na alma , em mim
quero ser eu, mas não sei mais quem sou
chego em casa cansada, consigo dormir
e, sonho comigo,
então eu me vejo
como está bonito meu rosto, limpo
sem máscara
escuto minha voz, estou cantando
e finalmente lembro quem sou eu

Acordo
Abro os olhos, mas não vejo nafa
A máscara me sufoca
Quero me libertar
Mas não posso, só quando sonho

Alexandra

Foto de ALEXANDRA LOPUMO SILVA

O fim é um começo

Recomeçar
Recontruir o que está destruido
juntar os caquinhos, e tentar montar o quebra cabeça
sim, eu posso, eu quero refazer o que está quebrado
Meu coração esmagado, um trator de dor me atropelou
o fim é uma ótima desculpa, para se recomeçar

Alexandra

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