Poemas

Foto de carlosmustang

CINZAS NA PUREZA DO AMOR

Lembra-se quando disse que me amava pra valer
Depois de tanto tempo de Amizade, a conquistei
Agora meus pés não tocavam o chão
A explosão de Amor demais

Ai em tanta felicidade, flutuando ao redor do mundo
Numa linda viajem de ilusão
Você me chamou e disse:
Eu estou grávida, eis a surpresa

O coração como um vaso de cristal estraçalhou
Perdoa amor, não posso gerar um filho
E não diga que é milagre
Mulher, talvez nem exista Deus sem amor

É lindo sua barriga crescendo
Não gosto do seu semblante triste
Mas não diga que é obra dos céus
Eu já não acredito no Deus sem amor

Volto a ser apenas amigo, pra deixar vc sorrir
Mas não diga mais que é milagre
Que meu coração virou pedra
Porque não vai haver outro milagre de Amor.

Foto de Gui❤Lari

Senhor do destino

Toda noite que olho para o céu e vejo a lua cheia.
Lembro que em uma noite ela iluminava nosso caminho.
Juntos ou separados ela continua a iluminar.
Deixar de te amar impossível!
Parar de sonhar improvável!
Te amo como sempre ou ainda mais desde o dia que nós entregamos um ao outro.
Sonho mesmo acordado...
Com seu beijo molhado...
Com seus olhos brilhantes...
Com seu abraço apertado...
Com nossos corpos suados ao se completarem.
A vida segue, não sei se você consegue.
Mais sempre me pego pensando em você.
Saudades mil...
Do nosso amor bandido...
Mais incontestavelmente correspondido.
As vezes acordo a noite meio perdido.
Pensando ter ouvido você me chamar.
Isso por hora me basta
E já me pego sorrindo.
Minha flor, minha princesa.
A vós declamo meu amor, amor pela sua rara beleza.
O tempo é Rei.
E que o amor seja Senhor do destino.
Meus lábios continuam fechados.
Mais meus olhos não conseguem esconder o brilho,
De quando estou pensando em você.

Foto de Arnault L. D.

Minha linda

Minha linda, meu pensar em ternura,
a que me volta se penso no amor
e que se alonga através das histórias.
Permanece sobre as marés, flui segura
feito ponto de luz as nuvens a transpor
sobre o céu nublado das memórias.

E se esta névoa me torna isolado,
nasce então de dentro da cegueira.
Pois meus olhos não me levam à fora;
dentro, minha linda é ao meu lado.
Se não corro me alcanço, me alcança inteira,
tal sombra ao meio dia, que em si mora.

Foto de Sónia Ribeiro

Lágrimas

As lágrimas são
Sangue da alma.

Foto de Jardim

não fui o primeiro a comer-te

não fui o primeiro a comer-te
a tantos fizeste juras de amor eterno
com tantos tiveste a certeza
de ter encontrado teu par.
com a tua mesma antiga convicção
ouvi as mesmas promessas.
fui apenas mais um
entre os tantos que comeram-te.
se em algum tempo desejei-te
agora é tarde para cobiçar-te.
já não arde a antiga chama
nem teus lábios aplacariam
a sede que já não existe
em minha boca antes ansiosa por provar-te
a desejar-te tanto, tanta a vontade.
a fome de ti que antes me consumia
nem minha podia ser
tantos foram os que a provaram.

Foto de Jardim

a língua lambe as pétalas

a língua lambe as pétalas
da rosa vermelha exposta
até desabrochar
entre gemidos, gritos, rugidos,
enfurecidos,
até encontrar seu oculto botão.

a língua lambe, ativa,
a rosa úmida, viscosa e rubra.
onde termina o quarto e começa o infinito?
atinges o paraíso, o nirvana
do orgasmo, do instante infinito
que reúne corpo e desejo, língua e clitóris.

Foto de Jardim

sussurraste aos meus ouvidos

sussurraste aos meus ouvidos
a palavra exata
contida em meu sexo,
ao longo dos teus gestos
desmedidos.
decifrei-te: puta.

cuidadosamente devassa
abri-te as coxas
e penetrei-te como um fauno selvagem,
nossos gritos ecoaram
por toda cidade nua.
traduzi-te: puta.

Foto de Jardim

são paulo

são paulo,
cafetina das putas da praça da luz,
mortas vivas movidas a cocaína.
ocultas sombrios subterrâneos,
berço das bichas ricas,
algoz inumano das bichas pobres.
teu concreto te fez menos humana.
quem aqui é feliz?
com teus meninos de rua,
vira-latas, meretrizes, mendigos,
haverá luz no fim do túnel?
és pródiga para quem abriga tuas mentiras,
para os que se vendem.

são paulo
dos políticos e da imprensa marrom,
da tua face as lágrimas desembocam no tietê.
sé, vila matilde,
vila guilherme,
vila leopoldina,
vila mariana,
a diversidade que emana
das lojas e butiques,
de tua periferia,
com tuas minas, com teus manos,
com tuas avenidas e faróis
sempre em movimento e mudança.

são paulo
espólios e legados centenários
que passam de pai para filho,
de geração em geração,
teus bardos, teus trovadores
teus rappers, teus pichadores,
teu samba tristonho e lento.
aqui tudo é evidente e sombrio,
na tua jornada sinistra na calada da noite
teus filhos se reproduzem e morrem sem viver.
a cidade não para, a cidade não dorme,
és a voz do minotauro
procurando a presa em teus labirintos.

são paulo
terra do café, do engarrafamento,
da tubaína, da caipirinha,
os dentes brancos da fome gargalham
em teus guetos,
cidade que abriga do 1º ao 5º mundo.
são paulo revisitada:
nunca me deste nada,
tudo me tiraste,
nada sois para que por ti
algo eu sinta
vagando sem rumo
por tuas esquinas de solidão.

Foto de Jardim

eu já conheço os passos dessa estrada

eu já conheço
os passos dessa estrada
pela cidade esquiva.
vejo suas indignações,
suas traições,
seus gritos abafados,
sua imensa idade,
sua profanação.
conheço suas acusações,
suas necrópoles,
suas ruas insepultas,
sua arrogância e a aspereza
de sua alma.

eu já conheço
os passos dessa estrada.
cidade furtiva,
ultrajante,
medíocre.
sem compaixão devoras
o que não te decifra.
os credos, o espanto
aqui fundiram-se
em raças, mentiras, mitos,
inexplicáveis farsas e doutrinas.

eu já conheço
os passos dessa estrada.
cidade austera,
teus monstros
armados até os dentes
com fuzis e baionetas
já não assustam.
corrompidas trevas
a se moverem
por tuas rápidas trilhas,
por teus becos obscuros.

eu já conheço
os passos dessa estrada.
cidade arrogante
em tua torre de marfim
estão impressos
teus segredos,
desvendam tua face
ornada de vaidade,
acalenta
tua indignidade.

eu já conheço
os passos dessa estrada.
qual teu destino?
qual a parcela
de tua grandeza?
uníssona e tardia
digeres
tuas crias.
por tuas calçadas
nos resta suportar
tua esplêndida virulência.
ó cidade profana
o vento que nos varre
é o mesmo que nos traz o amanhã.

Foto de Jardim

chernobyl

1.
sons de violinos quebrados vinham das montanhas,
uivos de lobos noturnos,
varriam as imagens das imaculadas ninfas
enquanto se ouviam as vozes dos náufragos.
o príncipe das trevas desceu disfarçado de clown,
bailava num festim de sorrisos e sussurros.
a nuvem envolvia a cidade com seus círculos febris,
se dissolvia nas ruas em reflexos penetrantes,
coisa alguma nos rios, nada no ar e sua fúria
era como a de um deus rancoroso e vingativo.
a morte com seus remendos, oxítona e afiada,
distribuía cadáveres, penetrava nos ossos, na pele,
nos músculos, qualquer coisa amorfa,
alegoria da inutilidade das horas.
agora este é o reino de hades
os que um dia nasceram e sabiam que iam morrer
vislumbravam o brilho estéril do caos que agora
acontecia através del siglo, de la perpetuidad,
debaixo deste sol que desbota.
o tempo escorre pelos escombros,
o tempo escoa pelos entulhos de chernobyl.

2.
meu olhar percorre as ruas,
meus passos varrem a noite, ouço passos,
há um cheiro de sepultura sobre a terra úmida,
um beijo frio em cada boca, um riso
estéril mostrando os dentes brancos da morte.
não foram necessários fuzis ou metralhadoras.
mas ainda há pássaros
que sobrevoam as flores pútridas.
aqueles que ainda não nasceram são santos,
são anjos ao saudar a vida diante da desolação
sob este céu deus ex machna.
aos que creem no futuro
restaram sombras, arcanos, desejos furtados,
resta fugir.
uma nuvem de medo, ansiedade e incerteza
paira sobre o sarcófago de aço e concreto da usina.
asa silente marcando o tempo
que já não possuímos.
pripyat, natureza morta, vista através das janelas
de vidro dos edifícios abandonados
sob um sol pálido, ecos do que fomos
e do que iremos ser.
pripyat, ponto cego, cidade fantasma,
os bombeiros e suas luvas de borracha e botas
de couro como relojoeiros entre engrenagens
naquela manhã de abril, os corvos
seguem em contraponto seu caminho de cinzas
sob o céu de plutônio de chernobyl.

3.
e se abriram os sete selos e surgiram
os sete chifres da besta,
satélites vasculham este ponto à deriva, seu nome
não será esquecido, queimando em silêncio.
os quatro cavaleiros do apocalipse e seus cavalos
com suas patas de urânio anunciam
o inferno atômico semeando câncer
ou leucemia aos filhos do silêncio.
os cães de guerra ladram no canil
mostrando seus dentes enfileirados, feras famintas,
quimeras mostrando suas garras afiadas,
como aves de rapina, voando alto,
lambendo o horizonte, conquistando o infinito.
eis um mundo malfadado povoado por dragões,
a humanidade está presa numa corrente sem elo,
sem cadeado, enferrujada e consumida pela radiação.
vidas feitas de retalhos levadas pelo vento
como se fossem pó, soltas em um mundo descalço.
vidas errantes, como a luz que se perde no horizonte,
deixam rastros andantes, vidas cobertas de andrajos,
grotescas, vidas famintas e desgastadas,
que dormem
ao relento nas calçadas e que amanhecem úmidas
de orvalho, vidas de pessoas miseráveis,
criaturas infelizes, que só herdaram
seus próprios túmulos em chernobyl.

4.
mortífera substância poluente, complexa,
realeza desgastada que paira nos ares
da pálida, intranquila e fria ucrânia
envolta no redemoinho dos derrotados.
gotas de fel caindo das nuvens da amargura,
sobre a lama do desespero, sobre o vazio
da desilusão, no leito do último moribundo.
cacos, pedras, olhos mortiços, rastros cansados,
inúteis, o sol das estepes murchou as flores
que cultivávamos, descolorindo nossas faces.
seguem os pés árduos pisando a consciência
dos descaminhos emaranhados da estrada,
na balança que pesa a morte.
no peso das lágrimas, que marcaram o início da dor,
restos mortais, ossos ressecados, sem carne,
devorados pela radiação, almas penadas
no beco maldito dos condenados, herdeiros
da abominação, mensageiros da degradação,
horda de náufragos, legião de moribundos.
o crepúsculo trouxe o desalento e as trevas, a vida
agora é cinza do nada, são almas penadas que fazem
a viagem confusa dos vencidos em chernobyl.

5.
ainda ouvimos os gritos daqueles que tombaram,
e os nêutrons sobre a poeira fina dos vales,
os pés descalços sobre pedras pontiagudas,
ainda ouvimos o choro das pálidas crianças,
a fome, a sede e a dor,
o estrôncio-90, o iodo-131, o cesio-137.
vazios, silêncios ocos, perguntas sem respostas,
degraus infernais sobre sombras, rio de águas turvas,
quimera imunda de tanta desgraça,
fantasia desumana sem cor,
transportas tanto mal, conduzes a todos
para a aniquilação neste tempo em que nada sobra,
em que tudo é sombra, é sede, é fome, é regresso,
neste tempo em que tudo são trevas,
onde não há luz.
cruzes no cemitério, uma zona de sacrifício,
sob um céu sem nuvens,
a morte em seu ponto mutante.
no difícil cotidiano de um negro sonho,
restaram a floresta vermelha,
e os javalis radioativos de chernobyl.

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