Vazio

Foto de Agamenon Troyan

Lágrimas de areia

Lágrimas de areia
Agamenon Troyan

Lá estava ela, triste e taciturna
Testemunha de efêmeros conflitos
Com um olhar perdido no tempo,
Não exigia nada em troca
A não ser um pouco de atenção.

Sentia-se solitária; oca.
Os homens admiravam-na
Pelos seus dotes
As crianças, em sua eterna plenitude,
Admiravam-na muito mais além...
... Mais humana!

De sua profunda melancolia
Lágrimas surgiram.
Elas não umedeceram o seu rosto
Mas secaram o seu coração,
O poço da alma,
Aumentando cada vez mais
A sua sede.

E lá ela permaneceu; estática, paralisada!
Esperando que o vento do norte a levasse
Para bem longe dali...

O dia começou a desfalecer
Seu coração, outrora seco e vazio,
Agora pulsava em desenfreada arritmia.
Desespero!
A maré estava subindo...

Em breve voltaria a ser o que era:
Um simples grão de areia.
Quiçá um dia levado pelo vento,
Quiçá um dia!
Em um porto seguro.

Foto de THOMASOBNETO

Sentimentos da Alma

Sentimentos

Voa pensamento voa!
Deslize pelas sendas dos bosques,
Buscas em um leito solitário...
Uma alma jaz mortificada, em sonhos!

Olhos que se escondem, turbilhões de lágrimas.
Choradas ao frio vento, soluços e sofrimentos!
Momentos que são lenços de despedidas mal acenados...
Fazem rotas indecisas, farrapos de coração apaixonado!

Braços que se alongam em buscas, do nada.
Bocas que beijam o vazio desta vaga existência...
Atributos de loucura a uma frágil alma desiludida!

Alfombras de rosas que não desabrocham,
Luas que não desejam sol, ou noites de estrelas!
Vida que se apagou como uma chama, no candeeiro!

THOMAZ BARONE NETO.

Foto de angela lugo

Vida vazia

Você se foi nada me deixou
Somente saudade do teu amor
Neste dia o vento que soprava calou
O sol aos poucos perdeu seu brilho
A chuva que vinha ficou inibida
E lamentou derramando suas lágrimas
Em meu jardim ressequido pela dor
Dor que maltrata a minha alma
Que me faz infeliz sem ter você
Entristeço... Empalideço ao lembrar
Da ultima vez que estivemos juntos
Tantas alegrias assassinadas em covardia
Não por suas mãos que estavam vazias
Pelo sentimento de rejeição que carregava
Em teu peito sem qualquer razão
Pura tontice imaginar que te traia
Nem mesmo poderia te amava em demasia
E até mesmo esquecia que o amor doía
Minha vida está completamente vazia
Sem você a me fazer galanteios em primazia
Uma parte de mim ficou em ti
Vagueio por entre vidas que não são minhas
Não me conheço mais sem você
A temperança do tempo anda inclemente
Vejo-me envolta num mar de recordações
Sem ti sinto-me como águas gélidas
Nas profundezas do meu coração
Por onde andarás o teu amor
Que um dia pertenceu somente a mim?
O que faz teu coração vibrar sem o meu?
Que juntos formávamos uma sinfonia de amor
Quem o está balançando em meu lugar?
Qual o nome da nova canção que o faz acelerar?
Será que pensando que eu o tivesse traindo
Simplesmente já estava a trair-me há muito tempo
Porque amenizou tão facilmente a minha falta
Esquecendo completamente do nosso amor?
Deixando minha vida completamente sem vida
E um coração vazio sentido dentro do peito

Foto de Enise

Amar é...

Amar é enaltecer uma ilusão
É assoprar num fogo morto
Mesmo quando sabe-se - é em vão!
Amar é buscar-se no fundo da alma
É festejar uma alegria ilusória
Mesmo na solidão...
Amar é plantar um afeto
É colher um vazio
Mesmo que escorra um desafeto pelas mãos...
Amar é fazer um amigo crescer
É estar em paz consigo
Mesmo na escuridão...
Amar é sorrir, é ter rimas para florir
Mesmo com o peito em lágrimas, na desolação...
Amar é ter quietude pra desejar
É dizer palavras para acalmar
Mesmo com a angustia em prontidão...
Amar é entrar numa luta impossível
Combater numa batalha imperdível
Mesmo que o tempo diga não...
Amar é agigantar uma esperança
Sem pensar numa cobrança
Que se espera sem razão ...
Amar é compreender
É não ter opção para escolher
Mesmo que o caminho seja o perdão...
Amar é um estado de vida
É preparar-se para cada despedida
Dos que entram e partem do coração...

Copyright 2007 by Enise

Foto de Enise

amar é...

Amar é enaltecer uma ilusão
É assoprar num fogo morto
Mesmo quando sabe-se - é em vão!
Amar é buscar-se no fundo da alma
É festejar uma alegria ilusória
Mesmo na solidão...
Amar é plantar um afeto
É colher um vazio
Mesmo que escorra um desafeto pelas mãos...
Amar é fazer um amigo crescer
É estar em paz consigo
Mesmo na escuridão...
Amar é sorrir, é ter rimas para florir
Mesmo com o peito em lágrimas, na desolação...
Amar é ter quietude pra desejar
É dizer palavras para acalmar
Mesmo com a angustia em prontidão...
Amar é entrar numa luta impossível
Combater numa batalha imperdível
Mesmo que o tempo diga não...
Amar é agigantar uma esperança
Sem pensar numa cobrança
Que se espera sem razão ...
Amar é compreender
É não ter opção para escolher
Mesmo que o caminho seja o perdão...
Amar é um estado de vida
É preparar-se para cada despedida
Dos que entram e partem do coração...

Copyright 2007 by Enise
Todos os direitos reservados a autora

Foto de Camillinha

Ser humano

Momento fossa gente!
Espero que vocês entendam...

Queria ser um ser humano vazio.
Um ser humano que só é capaz de ver com os olhos.
Mas que não consegue sentir com o coração.
Um ser humano diferente dos outros seres
Um ser humano completo.
Um ser humano capaz
Um ser humano único
Aquele que não chora
Aquele que manda no coração e esse obedece sem contestar.
Aquele que consegui ver por trás das coisas, pessoas (essência).
Aquele que não erra.
Aquele que não sente saudades.Essa palavra alias, nunca houve no seu dicionário.
Aquele que faz do tempo, um tempo passado.Aproveitando cada momento como um momento só seu.
Deixando de se preocupar com os outros e preocupando-se mais consigo mesmo.
O que não faz de alguém egoísta, mas realizado consigo mesmo.
Que não seja acomodado, mas que seja compreensivo.
Que seja realista, pois assim terá os pés no chão.
Um no chão vivendo o presente e um outro pé no futuro.Lutando desde cedo por seus ideais, seus sonhos, idéias, planos.
Para que esses possam se concretizar num futuro próximo.
Afinal, ninguém vive de sombra e agia fresca.
Pode até viver, mas estamos falando de ser humano.
Acredito que a maioria dos seres humanos, perfeitos ou não querem o melhor para si e para suas vidas. Ou então esquece ninguém é perfeito!

Foto de pedacinhos de mim poemas

Jamais direi Adeus...

Entre lembranças recentes e antigas, me afoguei em lágrimas de saudades, e na pausa de cada suspiro, senti na corrente sanguínea cada momento de prazer que você me proporcionou, que nos proporcionamos. E neste momento de tanto vazio, que o coração agora se faz presente...só a sua doce lembrança é o que me resta. E a certeza do meu amor que, como mágica, no êxtase do seu feito, vislumbro a tua imagem tão próxima, tão dentro de mim... Como cascatas de sonhos que nascem discretamente e se tornam tão gigantes, tão perfeitas, assim foram os nossos encontros.
Você é este meu mundo de sonhos e contentamento, porque foi em teus braços que me senti feliz, plena, mulher. Que bom que existes, que bom foi poder ser tua, mesmo que, por 21 dias.... eternos e inesquecíveis 21 dias.
Celia Torres

Foto de Maggie

Sussurro

Uma sombra no vazio
Esmorece a minha queda.
Por que não me chama?
Não pergunto porque não me clama.
Pudera!
Sussurrar não é mentir,
É apenas um eterno admitir
De que se ama
Desta fraca forma humana.

Foto de Lou Poulit

Trovão e o Sabiá Sereno

Aos Leitores e Amigos.

Antes de qualquer palavra, quero dizer que será um prazer partilhar com vocês os meus textos e que sou grato ao Poemas de Amor pela confiança que em mim depositaram.

Há alguns anos venho escrevendo contos. Mas vinha fazendo isso como quem armazena sementes, ou seja, sem permitir que elas brotassem antes da hora. Quando esse Site me ofereceu o blog, quis crer que não mais se justificava guardá-los só para mim. Até porque, talvez a partir de agora eu possa ter percepção de como eles tocarão outras subjetividades, diferentes da minha. Alguns serão postados tal como foram criados, enquanto que outros serão adaptados para que se tornem mais congruentes com os objetivos do Site, que não eram prioritários para a formação original da identidade do escritor.

Espero que gostem já desse primeiro conto, pelo menos tanto quanto eu. Mas como não vejo no conjunto deles, ainda, uma maturidade completa, antecipo que conhecer o que despertam nos leitores será motivo de gratidão da minha parte.

Abraços a todos e, desde já, muito obrigado pela gentil acolhida.

LOU POULIT
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Sentada sob alpendre da mansão colonial, sua fortaleza de toda a vida, Sinhá havia se perdido em seus pensamentos. O dia havia se despedido há pouco, na apoteose fugaz de um céu prestante de cores e texturas, que de tudo o que pode tentou fazer para merecer a atenção da moça. Nem a sinfonia da passarada fez efeito. Tudo em vão, restaram as estrelas que nem sequer se aventuravam. A passarada se calou para dar a vez aos grilos, sapos e outros barulhentos notívagos. Sinhá revirava mecanicamente os fartos rendados da saia à sua volta, pois de fato não estava ali.

Então, passos arrastados vindos de dentro precipitaram-na do etéreo, de volta ao corpinho magoado pela posição pouco cômoda. De tão surpresa e assustada, não teve coragem de se virar. E esperou apenas, como seu sangue esperava dentro das veias. Aos poucos uma luz tênue, mas capaz de expulsar soberanamente a escuridão, se aproximou. Depois mais um pouco. A moça temeu que se aproximasse ainda mais e explodiu em gritos nervosos: Saia já daqui! O que quer de mim, demônio? Eu não lhe chamei aqui!

A pouca distância um caboclo mulato de aspecto impressionante, pele muito morena e os olhos claríssimos de uma onça enterrados no rosto embrutecido, como pequenas gemas raras no emboço úmido da terra adubada pelos séculos. O velho Sereno segurava a candeia, tentando compreender, tão próxima, a moça que à distância vira crescer, como flor única naquelas glebas. Durante parcos segundos, Sinhá não conseguiu balbuciar uma palavra. Tentava decifrar como aquela figura estranha havia invadido seu silêncio, que significado poderia ter dentro dele e se seria perigoso para as coisas ricas que guardava em segredo. Porém, achando que o silêncio era ainda mais insuportável, a moça voltou à carga: Quem lhe deu o direito de estar aqui? Ele tentou explicar: Vim só alumiá o negrume da noite pra vosmicê, Sinhazinha... Carecia de se assustá não... Não tenho medo de nada, ela empinou a própria fragilidade. Como poderia temer um empregado dentro da casa do senhor meu pai? Ademais, estava aqui com meus pensamentos...

O homem olhava com segurança os olhos escorridos de lágrimas da moça, cheios de brilhos amarelados pela chama da candeia. Sentia pena dela, mas sabia pelas décadas de convívio que não se devia manifestar piedade para com os senhores. Sereno sabe que está triste, Sinhá. Ma num pode fazê nada não, disse ele abaixando os olhos. Mas como pode saber disso? Não lhe dou esse direito. De onde você saiu?... Ainda com os olhos baixos, ele respondeu: Sempre estive aqui, Sinhazinha. Vim pra essas terras do senhor seu pai na barriga da minha mãe, que se foi embora amarrada naquele pé-de-jurema-branca, bem ali na direção onde a lua vai nascer já. Eu era desse tamaninho, cabia no cesto onde o alazão comia o seu mio. Naquele tempo o capataz era um homenzinho muito do ruim... Ela só queria alimentar a sua cria...

A moça se refez da letargia quando o ouviu falar no alazão, tornando a gritar: Não me fale do meu alazão. Eu amava o Trovão como se fosse uma pessoa! Ninguém montava nele além de mim! E acabaram de trazê-lo num arrasto de pau-de-mangue... Ele estava morto! E eu vou matar quem fez isso com ele... E a chorar convulsivamente ela recostou-se no portal, até sentar-se de novo no degrau do alpendre. Sereno continuou calado, imóvel, com os olhos cravados nas lages do chão. Como se sua alma cansada procurasse uma brecha para um imenso arrependimento.

Tentando descobrir em seu próprio silêncio o que deveria fazer naquela situação triste e constrangedora, o velho caboclo foi lentamente até a arandela pendurar a candeia. Não sabia o que fazer a mais. Durante quase vinte anos quisera ajudá-la em muitas situações de perigo, mas sempre chegava alguém antes. Sereno trabalhara sempre na plantação, às vezes tratando dos cavalos doentes e outras como mateiro. Amava a menina, antecipava os riscos que ela corria, mas haviam outros mais próximos dela. E agora o mesmo sentimento de proteção lhe parecia palpável de tão denso. E ironicamente, embora estivessem ali apenas os dois, simplesmente não sabia o que fazer.

Passados alguns poucos e imensos minutos, a moça quebrou o silêncio, mais calma, porém sem perder a altivez da voz: Como se chama? Sereno, Sinhazinha - disse ele. E porque está aqui, nunca lhe vi dentro de casa?... O velho empurrou a aba do chapéu para trás e coçou a calva rala e branca, como sempre fazia quando se sentia inseguro. Demorou um pouquinho mas respondeu: Eu vim de pés lá de trás da serra dos pastos... O senhor seu pai mandou que me alimentasse e ficasse por aqui até amanhecer. Ela insistiu: Mas por que veio de pés? Ah, Sinhazinha, parei no meio da mata para ouvir o sabiá-da-mata, tava cantando bem em cima de mim. Desde menino adoro os sabiás, num gaio da mangueira, por cima da minha palhoça tem um que fez ninho agora. Quando passo o café da tarde ele tá arrebentando os peitos, de tanto chamá uma fêmea pro seu ninho novinho e arrumadinho. Mas me distraí, meu cavalo assustou-se com a onça e saiu desembestado, nem sei pra onde. Mas vou lá buscar, pro seu pai meu senhor num ficá num prejuízo maió. Não é um bicho caro, é até meio capenga... Mas é um bom companheiro, num sabe? Vendo a perplexidade dela, ele perguntou: Que foi Sinhá, com essa boca aberta, quem nem peixe morto? A moça sussurrou: Onça?... Que onça é essa, Sereno?

O velho respirou profundamente. Não haveria mais de esconder. Ela que soubesse a verdade e que fizesse o que achasse justo. Disse a ela com segurança: a mesma que pegou o Trovão... Aquele sangue todo foi porque quando cheguei ela já tinha garrado no pescoço dele – disse caboclo limpando instintivamente as mãos grosseiras nas calças. A moça mostrou-se inconformada: E você não fez nada para ajudar o coitado? Não tinha uma arma, Sereno? Sinhazinha, ele caiu por cima da bicha, esperneava como um porco endemoninhado... Endemoninhado é você, miserável! Ele era o alazão mais valente que conheci... Só que havia uma onça mordendo o seu pescoço... E um homem medroso e inútil assistindo a sua morte desesperada! Que queria que o Trovão fizesse?... Sereno, se calou constrangido. E ela quis saber mais: E depois, Sereno?... Sinhazinha, num é nada fácil chegar perto de dois bichos grandes e raivosos... E eu só tinha mesmo o meu facão de mato e não queria ferir ainda mais o Trovão. Sim, mas o que você fez? – ela implacável. Eu nada, Sinhazinha, a onça é que resolveu desaparecer. Onça é um bicho covarde. Só pega pelas costas, sangra e espera morrer. Mas se sentindo insegura ela larga e fica de longe só espiando. Esperando a hora de comer sossegada. E o outro, que também é bicho, sabe que vai morrer e que ela vai vir lhe rasgar as tripas. É só uma questão de tempo... O mundo dos bichos é assim mesmo, Sinhá. Ninguém muda não. Vosmicê ta triste e eu também... Mas o Trovão tá não... Só tá esperando os primeiros lampejos do dia, pra correr por essas terras sem fim, pelos campos e pelas matas fechadas, num tem mais nada que lhe impeça... Vai conhecer todos os lugares onde nunca tinha ido, vai beber água do rio grande e vai saltar nas ondas da praia... Enquanto isso nós vai fica aqui chorando de tristeza, porque num pensa que ele ta livre como nunca foi... É que como nós só sente o sentimento da gente, só pensa com a cabeça da gente, então acha que o trovão ta sentindo e pensando a mesma coisa, Sinhazinha... Não tenha raiva não... Que ele não pode aparecer pra vosmicê e lhe contá como que é lá donde ele vem, ele vai ficar triste por causa da sua tristeza...

A moça se esforçava para aceitar aquela sabedoria estranha, que quase desdenhava os seus mais puros sentimentos, todas as coisas que aprendera a sentir. Mas, embora não tivesse coragem de dizê-lo, até que gostava muito de imaginar seu querido Trovão suando da correria que tanto amava, brilhando ao sol e ao luar. Ele amava o vazio dos espaços, os obstáculos que vencia, amava o vento revirando as suas crinas, enchendo-lhe os pulmões no peito enorme e musculoso, e depois expirava com força fazendo seu próprio vento, era quase um deus da natureza... Ah, como ele gostava disso... – dizia a si mesma. Alagada da própria ternura, disse então ao velho: Ele lutou até o último instante não foi, Sereno?

Ele era valente demais, eu o conhecia desde que era um potrinho muito abusado... Sou lhe muito grata, quero que fique, se alimente bem e descanse bastante. E depois vá buscar o pangaré, antes que essa onça o coma, já que não comeu o Trovão, pois que os homens foram buscá-lo antes disso... Sereno sentia-se mais à vontade agora, já sentado também no degrau de baixo. E completou: Vou Sinhazinha, antes de clariá vou atrás dele. E ai dela que se meta... Faça isso por mim, Sereno – ela pediu com raiva.

Não posso prometer, Sinhazinha... Não Sereno, não se arrisque, leve uma arma... E se ela lhe pegar pelo pescoço, como fez com o Trovão?... Vosmicê num fique triste não, Sinhá... Também sou meio bicho, já fiz muita coisa nesse mundo de meu Deus... Já matei oito onças, seu pai meu senhor pode lhe dizer... Uma delas ia morder era o pescoço dele... É que de uns anos pra cá elas estavam sumidas, que os cachorros farejam a catinga delas de longe... Gato tem raiva de cachorro e vice-versa, num sabe?

Eu prometo, Sereno. Vou contar para os meus netinhos essa estória. E vou me lembrar de dizer que você foi um herói, que não pode salvar o Trovão, mas veio de pés buscar homens, para que ele tivesse um enterro digno. Meus netinhos vão aprender a odiar todas as onças, porque essa matou o Trovão... Mas eis que tais palavras indignaram o velho filho-do-mato, e ele quis ser exato: Não, Sinhazinha... Isso não é certo, não é verdade não... Como, Sereno? Se ela não matou o meu alazão, então quem foi?... Fui eu mesmo, Sinhazinha... A moça de um pinote ficou de pé, com o dedo em riste, enfurecida lhe disse: Seu traidor! Vá embora, suma daqui! Nunca mais quero ver sua cara! Não vou lhe perdoar jamais! Vai... Antes que eu grite por alguém para lhe surrar no pé-de-jurema, desgraçado!

Naufragados novamente em profunda tristeza, ambos se foram. Ela para chorar na cama e ele no mato. Mas nenhum dos dois conseguiu dormir. A moça rolou na cama, sobre o lençol úmido das suas lágrimas, até que lhe viessem chamar para o almoço. Não foi. À tarde, na hora da refeição também não quis sair do quarto, deixando a todos apavorados. Seu pai começou a preocupar-se, vendo que as mucamas não paravam de cochichar pelos cantos. Resolveu-se a sacudi-la. Entrou no quarto como um furacão para intimidá-la e foi querendo saber o porque daquele drama. Sabia o porque, também sentia muito pelo alazão, sabia o valor que tinha, mas não queria perder também a filha. Sinhá estava desolada e não apenas pelo seu Trovão. As horas lentas da madrugada lhe convenceram de que havia sido injusta com o Sereno. Estava agora claro que quisera apenas poupar o animal de mais sofrimento. Não podia carregá-lo nas costas e com certeza não quis que o alazão assistisse a desgraçada da onça comer-lhe as carnes ainda vivas. Ela estava soterrada de remorso e com muito jeito fez o velho concordar em mandar buscá-lo. Assim também concordou em levantar-se para se banhar e voltar à vida normalmente.

Alguns dias depois estava novamente sentada no alpendre, mas dessa vez assistiu a obra da natureza que se comprazia em dispor da sua atenção. O dia terminou. Escureceu por completo. Ela se lembrou da noite em que se assustou com Sereno. Dessa vez queria imensamente que ele lhe trouxesse a candeia. Havia preparado algumas palavras para lhe pedir que perdoasse a grosseria. Ninguém lhe dissera uma palavra durante esses dias, tinha a impressão cada vez mais densa de que não lhe queriam falar a respeito. Uma luz veio de dentro, mas pelo andar sem botas não poderia ser Sereno. Era uma mucama, que foi dispensada. Sinhá só queria a luz do velho caboclo, como naquela noite. Agora queria gostar dele, da sua sabedoria e da sua paz. A lua começou a aflorar, derramando seu prateado pelas colinas que pareciam abraçar em segurança a mansão. De repente, algo mexia nas folhas do pé-de-jurema-branca, que pareciam lhe acenar variando o reflexo do luar. Então, para sua imensa surpresa ouviu com nitidez o canto mavioso de um sabiá... Mas como? Sabiá cantando há essa hora? Não pode ser... Não queria aceitar o que seu próprio silêncio lhe dizia, lutava contra com todas as suas forças... Então ouviu de novo, logo ouviu outra vez e de novo tornou a ouvir... As defesas que havia erguido em si própria foram ruindo a cada canto, como se fossem rojões de poderosos canhões. Até que não pode mais sustentar a certeza que preferia. O sabiá só podia estar feliz. Tão feliz que nem se importava com a noite, não queria esperar o amanhecer! Se quisesse vê-lo sempre feliz, devia afastar a tristeza. Libertá-lo do próprio peito para que fosse completamente livre, para que cantasse onde quisesse e quando quisesse. Seu canto não era triste como o de outros, mas vigoroso e doce como o de uma flauta da natureza. A mucama voltou com um semblante pávido, mas quedou-se quando à luz da candeia viu que o de sua Sinhazinha sorria para a lua, já em seu esplendor. A mucama lhe disse: Sinhazinha, o seu pai mandou meu irmão e me primo buscar o Sereno... Mas eles não querem falar, estão com medo. Medo de que? Diga logo... Não fica brava comigo não Sinhazinha... Fala de uma vez, mulher... É que a onça pegou o Sereno também, Sinhazinha...

Completamente perplexa, a mucama ouviu a Sinhá lhe dizer com doçura: Não fique assim tão triste. Há essa hora ele deve estar bem assobiando por aí... Por onde, Sinhazinha?... Pela natureza, pelo céu, pelo rio grande, ou se lavando nas ondas do mar... A pobre mucama não conseguia atinar com aquelas palavras surpreendentes e Sinhá completou: Anda, pode deixar a candeia na arandela e vá pra dentro. Se precisar eu lhe chamo, agora vá. Quando mais tarde seu pai veio lhe buscar para dentro, aliviado pelas falas da mucama, encontrou-a bem disposta, quase feliz para aquelas circunstâncias. Sinhá aproveitara o tempo para fazer uma prece emocionada, repleta de gratidão e amizade, pela alma do velho Sereno. Durante toda vida estivera bem ali e nem o havia notado. Mas havia sido de grande valia justo no momento que mais precisou. Se estava feliz a ponto de assobiar no galho do pé-de-jurema àquelas horas, então deviam estar todos felizes: O Sereno, sua pobre mãe e também o Trovão. Não, não queria mais pensar em tristezas. Foi quando seu orgulhoso pai, sentindo necessidade de participar daquele momento lhe disse: Deixe estar, querida... Aquela maldita onça não irá longe... Eu me encarregarei disso pessoalmente.

Lou Poulit
Direitos Exclusivos do Autor

Foto de fer.car

Ama-me

Ama-me quando não lhe restarem mais forças
Ama-me em silêncio, na dor e na doença
Fala-me de seus devaneios, de seu vazio interior diante das maldades da vida
Acolha suas mãos sobre a minha, sacie seu corpo no meu corpo
Fala-me tudo que eu necessito ouvir
Dance mais esta valsa comigo
E juntos vamos criar nossa própria dança
Cala-me quando eu precisar me calar
E fala-me do amor quando eu não mais acreditar
Ama-me mesmo que nada lhe demonstre
Pois só eu sei como preciso ser amada
Sou um ser carente que procura por uma alma muito alma que saiba amar
Quando eu chorar que você enxugue minhas lágrimas
E me diga que vale a pena sonhar
Quando eu não souber o que fazer que você me ensine o caminho a percorrer
E quando eu cair que vc me levante e me carregue em seus braços
E apenas mostre que está ao meu lado em todos os momentos em que eu precisar
Ama-me mesmo que isto lhe fira
Mesmo que este amor lhe seja demais
Porque preciso de você, amor
E na ausência foi quando eu mais quis você aqui ...
Perto de mim
Por isso apenas ama-me

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