Agarro as palavras, arrasto-lhes o sentido,
pronuncio-as prudentemente,
silencio-lhes a aspereza e o mêdo,
pego-lhes de rompante,
como quem apanha uma serpente...
Viscosas, enrolam-se, estrangulam-me,
numa roda que gira entrecurtada
por silêncios que ruminam
sem propósito ou destino...
Rumo em direcção aos lugares
famintos de dôr e amor,
carentes de vida e de sonho...
Debruço-me donde vislumbrava
horizontes e marés...
Estemeço na vertigem,
irmã do abandono...
Olho-te no caminho da memória,
revejo a tua expressão,
sem vida...
Assusto-me nas palavras que não digo,
como quem ama em segredo...
Adormeço na tarde ainda quente
da tua presença colorida...
Adivinho a manhã que se recusa a nascer,
olhando a madrugada morta...
Abraço o vazio, num gesto sem nexo,
amarro memórias,
imagens, lugares, paisagens...
Recolho o último vestígio,
como quem emoldura
a sua própria imagem...
Ondulo o espanto no desencanto
do canto...
Navego na espuma dos dias
em busca de um navio fantasma...
Barão de Campos