Mar

Foto de LEOANDRADE

Navegar (Leonardo Andrade)

Eu sempre soube que jamais deixaria de navegar.

O cais, qualquer cais, sempre foi e sempre será uma pausa, um breve momento de descanso, uma utopia presa pela tênue corda de uma âncora que jamais se fixará.


Não há como fugir do mar, de seus mistérios, de suas aventuras, de suas amplas e irrestritas possibilidades.
Não há como ignorar o eterno canto da sereia chamando, o ritmo imprevisível das ondas e os ciclos sem fim das marés.
O mar faz refluxo em meu sangue e transborda em minha alma.
O chamado é mais forte do que eu, não há como lutar.
Não nasci para viver ancorado, limitado e preso em amarras invisíveis , mas profundamente dolorosas, preciso do cheiro do mar, dos pingos d´agua no meu rosto, do vento nos meus cabelos e da imprevisibilidade das tempestades.
Não sei viver só de calmarias.
Não se despeça de mim, deixe as ondas me levarem e quem sabem um dia me trazem de volta.
Guarde esse ciclo com carinho, lembre de tudo que vivemos com amor e saiba que foi perfeito e delicioso, mas como tudo, teve seu tempo e agora é hora de partir.
Guardo seu cheiro, seu sorriso pós amor e o gosto agridoce de seus beijos cheios de desejo.
Prometo fazer uma tatuagem em sua memória e contar

Foto de Romarj

Simplesmente

Deixa-me ser o senhor dos teus sonhos,
E partilhar todos os teus tormentos,
Deixa-me rir o teu riso,
E navegar no mar afoito que te cerca,
Permita-me amar as coisas que amares,
Ser tua sombra e acalentar-te quando o frio da noite invadir o teu corpo.
Deixa-me seguir teus passos por vales floridos ou por negros abismos,
Deixa-me percorrer teu doce corpo e refugiar-me no teu ventre e beber dos teus lábios
Aceita-me simplesmente,
Nada mais...

Carlos Roberto Silva 77/06/11

Foto de quimnogueira

Poema do esquecimento

Um dia ? Dois ?
Um minuto apenas e tu partiste !
Partiste e eu fiquei só e triste !
E agora o tempo corre vertiginosamente

e atropela o meu coração sangrento,
despedaçando-o contra as pedras do caminho;


o sangue correndo abrasador

tortura-me numa infinda dor...

As árvores do além, no silêncio da noite,

gemem baixinho:

imploram, com ternura, um beijo, um carinho.

As estrelas do céu cantam melodias, lentas,

plangentes...

Os astros não brilham, a lua já não sorri...

E tudo porque te vi partir !

E eu no silêncio da noite escura,

imaculadamente pura,

rezo, recordo e estremeço...

Um tic-tac lento despertou-me...

As horas terríveis continuam a correr,

fazendo-me sofrer por não te ver...

Elas marcam a hora em que me deixaste !

Escuto o meu coração implacável,

como esse relógio malfadado,

e sinto-o gemer também.

Tic-tac...tic-tac...

Queria fugir, fugir ao tempo,

perder-me no mar do esquecimento...

E...chorar, penar...

Fugir, fugir, perder-me com a minha dor

no mar que fora sempre cheio de amor,

em vez de tanta e tanta dor...

Corro então, corro mais que o tempo,

mais que o relógio; e na minha corrida

desenfreada, louca, eu já não choro,

já não sofro...

Os espinhos cravam-se em mim,

rasgam-me a pele e o sangue corre...

Tic-tac...tic-tac... Paro assustado!

O tempo afinal corre a meu lado

e me ultrapassa; fico para trás,

perdido no esquecimento...

Olho

Foto de Carlos

HEBRÉIA (António Castro Alves)

Flos campi et lilium convallium.

Cant. dos Canticos

Pomba d'esp'rança sobre um mar d'escolhos!

Lírio do vale oriental, brilhante!

Estrela vésper do pastor errante!

Ramo de murta a rescender cheirosa! ...



Tu és, ó filha de Israel formosa...

Tu és, ó linda, sedutora Hebréia...

Pálida rosa da infeliz Judéia

Sem ter o orvalho, que do céu deriva!

Por que descoras, quando a tarde esquiva

Mira-se triste sobre o azul das vagas?

Serão saudades das infindas plagas,

Onde a oliveira no Jordão se inclina?

Sonhas acaso, quando o sol declina,

A terra santa do Oriente imenso?

E as caravanas no deserto extenso?

E os pegureiros da palmeira

Foto de Patrícia

Canção Perdida (Guerra Junqueiro)

Hálitos de lilás, de violeta e d'opala,

Roxas macerações de dor e d'agonia,

O campo, anoitecendo e adormecendo, exala...

Triste, canta uma voz na síncope do dia:

Alguém de mim se não lembra

Nas terras de além do mar...

Ó Morte, dava-te a vida

Se tu lha fosses levar!

Ó Morte, dava-te a vida

Se tu lha fosses levar!


Com o beijo do sol na face cadavérica,

Beijo que a morte esvai em palidez algente,

Eis a Lua a boiar sonâmbula e quimérica...

Doce, canta uma voz melancolicamente:

O meu amor escondi-o

Numa cova ao pé do mar...

Morre o amor, vive a saudade...

Morre o Sol, olha o luar!

Morre o amor, vive a saudade...

Morre o Sol, olha o luar!

Lactescente a neblina pálida flutua,

Diluindo, evaporando os montes de granito

Em colossos de sonho, extasiados de Lua...

Flébil, chora uma vez no letargo infinito:

Quem dá ais, ó rouxinol,

Lá para as bandas do mar?

É o meu amor que na cova

Leva as noites a chorar!

É o meu amor que na cova

Leva as noites a chorar!

A Lua enorme, a Lua argêntea, a Lua calma

Imponderalizou a natureza inteira,

Descondensou-a em fluido e embebeu-a em alma.

Triste, expira uma voz na canção derradeira:

Ó meu amor, dorme, dorme

Na areia fina do mar,

Que em antes da estrela d'alva

Contigo me irei deitar!

Que em antes da estrela d'alva

Contigo me irei deitar!

Guerra Junqueiro (1850 - 1923)

Foto de quimnogueira

Poema do grito...(Quim Nogueira)

Na solidão do meu remorso do bem que pude fazer e não fiz,

porque não pude ou porque não quis ?...

Eu revejo meus erros e me transformo em borracha;

borracha que apague a razão de aqui estar !

Na solidão do meu erro, do cometido consciente

ou do inconsciente assumido,

eu choro pelo vazio não preenchido,

pela vaga existente...

Por ficar, não ter ido...


Na solidão da minha mágoa sentida eterna e cadente,

eu revejo a ternura que em ti vive,

o carinho ardente do amor que busquei e... não tive.

Parto então em nuvens de gritos abafados

dum coração que arde sangrando,

não pela cruz que carrego mas pela cruz que outros,

irmãos meus, vão transportando.

As nuvens abafam meus gritos

sufocando as gargantas dos Deuses,

que nos seus pedestais,

me negam suas existências para num só Deus,

eu me mergulhe no cais.

Cais onde aporto meu arfar;

cais onde aporto meu ardor;

cais onde me fico, onde me sinto,

onde sou aquilo que sou !

As amarras então se me soltam e do cais me vejo partir...

Para onde vou ?...

Se é aqui que sinto que sou !...

Então, me agarro mais uma vez

e as ondas me embalam devagarinho...

ora fortemente, ora docemente...

E, então, o frio me invade.

Mas é nesse frio que me aqueço;

no frio das lágrimas dos que lentamente

enchem os sulcos do meu mar, deixando antever,

num só olhar, os adeuses perdidos

os choros sentidos

dum barco, só...a navegar !

E as amarras se me soltam...

e as ondas se revoltam...

e os outros barcos nunca mais aportam !

E na solidão do meu remorso do bem que pude fazer e não fiz,

sinto-me voar em altos céus

desejando vencer a inércia do meu desejo,

lutar a teu lado, meu Deus,

sentir-me junto, como um afago,

vencendo os medos,

vencendo os choros,

vencendo as ondas,

vencendo os gritos !

Quim Nogueira

Foto de LEOANDRADE

Volta ao Começo (Leonardo Andrade)

Hoje eu não quero questionamentos nem explicações, se o amor não possui esses vocábulos em seu dicionário, por que deve tê-los ?
Não quero desculpas nem meias palavras, quero que os sentimentos fluam intensamente como o mar invadindo a praia e ignorando todos os obstáculos

Foto de LEOANDRADE

Abandono (Leonardo Andrade)

A tarde cai numa onda vermelha

Ao longe um solo de sax

lúgubre, triste, blues da tarde

O mar cor de chumbo parece resignado

Não tenta invadir a praia

Ondas arrastam-se preguiçosamente

Nunca transpondo o ponto anterior

cada vez a incidência é menor

a insistência desaparece ...

o cansaço impera...

Eu, mero reflexo da cena, ou vice-versa

não encontro mais forças para lutar

a noite que chega não me permitirá ver

para onde você foi.

a chuva que se anuncia

apagará todos os seus rastros

as nuvens impedirão as estrelas

de me guiar.

Você veio como uma brisa

de forma lenta e suave,

tomou-me por completo

e alojou-se no meu sangue

Agora se foi ... silenciosa,

último acto de quem já tinha partido,

não em palavras, mas em atitudes e sentimentos

que eu não quis enxergar...

Não adianta te procurar

se o que você quer é partir

se nossos caminhos são opostos

nosso encontro será numa trilha distante

em algum lugar do solo

desse planeta redondo

que nos suporta e nutre.

A música cessa

é hora de ir

Apenas caminhar e tentar seguir algum caminho,

qualquer caminho

que um dia cruzará o seu ...

Que nesse dia distante

mar e céu reflitam amor

não a dor e a solidão

desse momento ...

Leonardo Andrade

Foto de LEOANDRADE

Carla ou Despedida de (e em) Venice (Leonardo Andrade)

A Piazza está vazia

As folhas mortas e caídas pelo chão

assimétricas, desordenadas

o vento balança suavemente os brinquedos vazios

vã tentativa ...

os pássaros silenciosos sequer voam ...

o mar adormecido não avança nas calçadas

As nuvens permanecem imóveis

não há som, não há luz

não há música, o ar parece pesado...

as gôndolas estacionadas não dançam nos canais

as cores desbotam rapidamente

o vinho escorre pelas mãos

mas não fecunda a terra

agora estéril, sem vida

sem você Venice é morta

Per tutti la mia vitta

Leonardo Andrade - 1984

Foto de LEOANDRADE

Liberdade (Leonardo Andrade)

NA LIBERDADE DAS ÁGUAS AZUIS,

SÓ O LIMITE DO CÉU QUANDO CINZA,

DELIMITA MEU ESPAÇO....

CORAÇÃO TROPICAL, PEITO DE AÇO

AS ONDAS ASSOLAM;

OS VENTOS AÇOITAM;

EU RESISTO, INSISTO;

NUNCA DESISTO.



SEI DESFRUTAR A CALMARIA,

SEI SEGURAR AS VELAS NA VENTANIA.

ME DELICIO COM A TEMPESTADE,

COM A NATUREZA E SUA VORACIDADE.

VELEJAR CONTRA A CORRENTEZA,

SER REBELDE, É A MINHA NATUREZA.

CRONOLOGIA DE ONDAS E MARÉS

SEM NUNCA FIXAR OS PÉS.

PERNOITAR EM ALGUM CAIS ERRANTE,

AO AMANHECER, VOLTAR A SER O VIAJANTE,

SEM MARCAS, CICATRIZES OU SINAIS,

SEM FICAR POUCO TEMPO, SEM FICAR DEMAIS.

CONTAR ESTRELAS SOZINHO NO INFINITO DO CÉU,

SER COBERTO PELA NOITE E SEU VÉU,

TER COMO CONFIDENTE O MAR E SEUS SEGREDOS,

DIVIDIR COM ELE MINHAS INCERTEZAS E MEUS MEDOS.

VELEJAR É PRECISO, É VITAL,

ETERNA BUSCA DO CAIS IDEAL,

ONDE A ÂNCORA SE FIXE DE FORMA PERFEITA,

E A DEPENDÊNCIA DO MAR ESTEJA DESFEITA.

ESQUECER MAPAS, ROTAS, PLANOS,

CONTABILIZAR ACERTOS E ENGANOS,

GUARDAR PRAIAS E ENSEADAS COM CARINHO,

ESQUECER ATALHOS, ME CONCENTRAR NO NOVO CAMINHO.

USAR O QUE APRENDI COM VENTOS, MARÉS E LUAS,

PARA À NOITE SOBRE AS SUAS COSTAS NUAS,

MAPEAR NOSSA EXISTÊNCIA DE FELICIDADE,

E APRENDER QUE SÓ COM VOCÊ ... ESTOU EM LIBERDADE.

VOCÊ QUER SER MEU ETERNO CAIS ???

DESTE, PROMETO, NÃO PARTIREI JAMAIS !!!

EU TE AMO DEMAIS,

MUITO MAIS QUE DEMAIS.....

ETERNAMENTE, ALÉM DE ERAS E VIDAS .....

SEMPRE SEU ....

Leonardo Andrade

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