EROSÃO
Tenho, cá comigo, a leve impressão
de algo perdido em algum lugar.
De algum dia de felicidade guardado
onde? Não posso lembrar com exatidão.
O coração, falésia, fica acabando devagar
na esperança de que a mão alcance
onde a emoção se esconde
para que não eroda de vez o que resta a amar.
Fico com medo, essa incrível ausência de amor
que arranca de mim a coragem para o gesto
que seria na verdade a salvação do náufrago
imóvel enquanto o barco salvador vai ao largo.
Talvez, quando nada mais reste a sentir
e sobreviva apenas o pensar no porvir
descubra que nada era dígno de ser tão sofrido
tão ameaçadoramente vivido.
Restam poucas coisas a serem vistas ou sentidas.
O que passou deixou restos, aluvião,
onde chafurdo o presente que é minha vida.
Viver com medo é viver pela metade cada emoção