3ºConcurso Literário de 2007-tema Eterna saudade-"um dia para sempre"
Quem sou? Uma louca? Ando de um lado para o outro sem nada a fazer, sem nada perceber…
Só me lembro daquele horrível dia… o dia em que te vi morrer… morrer aos poucos, ouvir as tuas palavras de socorro, e eu pouco podia fazer.
Sim, lembro-me como se fosse hoje!
Era fim da tarde, e tu ias-me levar a casa, ia-mos com aquele olhar que só nós tínhamos, que só tu conseguias provocar, e aquele sorriso único que só tu fazias que eu tivesse.
Sim, lembro-me de tudo, o tempo estava muito estranho nesse dia, e tu tudo fazias para que eu estivesse bem, sorrias e dizias que tudo farias para me ver sempre assim, com aquele brilho que só tu conseguias fazer nascer em mim.
Estava tudo bem, bem até me pedires para ir para casa só, sem ti… coisa que nunca farias…
Disses-te que ias ter com uns amigos, os mesmos que nos estavam a seguir até então. Estranhei, mas quando me fizeste prometer que não voltaria para traz por nada e que acontecesse o que acontecesse para nunca te esquecer, ai temi. Temi por ti, e por mim…
Sim foi a resposta que te dei, embora não concordasse com ela.
Deste-me um beijo, o ultimo beijo. Estavas sério, mas mesmo assim sorris-te apenas para me acalmar. Não consegui dizer nada, virei costas e comecei a andar, mas sempre muito atenta; os homens que nos tinham seguido tinham parado.
O meu coração batia depressa demais para pensar, deixei de ter controlo em mim, e quando virei a rua, só me lembro que o meu coração parou de bater; a rua estava deserta, e o teu grito ecoou por todo o lado, mas mesmo assim parecia que só eu o tinha ouvido.
Inevitavelmente os meus pés deram a volta, o meu corpo transpirava de medo e ansiedade.
Quando te vi, tudo em mim parou, deixei de ver tudo o resto, deixei de respirar até. Não senti o vento na minha cara, nem o meu cabelo a esvoaçar. O tempo parara quando te vi deitado no chão a jorrar sangue do corpo e aqueles homens com facas ensanguentadas do teu sangue. Tudo isto se passou numa fracção de segundo, pois logo depois o meu corpo, o meu ódio e a raiva respondiam por si. Gritei o mais que pude a pedir ajuda enquanto podia e atirei-me para cima do homem que te tentava novamente apunhalar.
No mesmo instante agarrei numa pedra e atirei-a a um outro homem que se aproximava de ti. Ele caiu no chão e não se mexeu mais. Os outros fugiram.
Estava finalmente a voltar a mim quando já estava a rua cheia de gente, já tinham chamado a ambulância que nos levou para o hospital. Incrivelmente ainda estavas vivo, mesmo depois de todo o sangue que perderas. Fui contigo na ambulância, nunca mais te ia deixar.
Mal chegamos ao hospital levaram-te para seres operado, e eu só queria chorar, mas as lágrimas estavam secas… como é normal perguntaram-me o que tinha acontecido e eu pouco consegui contar. E ainda faltava contar aos teus pais, mas só eu o podia fazer, por isso liguei-lhes. A voz deles mudou, a tua mãe chorou, desligou, e logo depois já estava comigo, e trazia com ela o teu pai, e os meus pais. Desesperei, a voz falhou, não consegui falar, imaginar tudo de novo era duro de mais. Para a minha salvação a médica explicou o que eu já tinha dito e assim eu não tive de falar. Quando a médica acabou de contar, vieram todos ter comigo, abraçaram-me e eu gritei, gritei e fugi…
Não queria sentir pena, eu é que afinal não estava lá contigo para te ajudar, queria trocar de lugar contigo, jamais me perdoaria se não sobrevivesses. Foram 5 horas nem mais nem menos, foi esse o tempo que estiveste no bloco operatório. Quando foste para o teu quarto ainda dormias, mas eu estive sempre lá contigo, e quando acordas-te eu estava lá, adormecida a teu lado, deste-me a mão, e chamas-te por mim.
A tua mãe que tinha ido apenas comer algo quando chegou e te viu acordado chamou-te e foi a voz dela que me acordou. Não podias falar, estavas muito fraco, no entanto notava-se que estavas melhor. O medico entrou no quarto e disse-nos que te ia examinar para ver como estavas e que por isso nós teríamos de sair. A tua mãe agarrou a tua mão, e depois largando-a ia recuando até à saída. Eu ia fazer o mesmo, mas tu não deixaste, voltei à tua beira, dei um beijo na tua face, sorri enquanto te olhava nos olhos... como sempre fazíamos para dizer que ia correr tudo bem. O teu olhar acalmou e eu vim embora… não sei o que se passou depois, visto que desmaiei por fraqueza e perda de sangue por ter sido também ferida quando me atirei para cima de um dos homens que te tinham posto assim. Quando acordei, estava tudo a minha volta. Vi o medo na cara de cada um deles. Preocupei-me. Levantei-me e embora fraca e tonta caminhei aos “Ss” pelos corredores até ao teu quarto. Ninguém me impediu. Sabiam que não valia a pena. Quando cheguei perto de ti tu estavas rodeado por toda a tua família, avos, tios, primos…
Finalmente as lágrimas ganharam vida e caíram face abaixo. Estavas em coma. O mundo caiu-me aos pés e nada o poderia levantar senão tu mesmo. Toda a tua família, excepto os teus pais, me culpou do teu estado. Fui por isso proibida a visitar-te. Toda a minha vida estava perdida, e eu estava morta, viva no vazio. Nada fazia realmente sentido, e a culpa era realmente minha, não tinha de te ter deixado.
Já estavas à 3 dias em coma quando me ligaram a dizer para ir ao hospital com urgência.
Eram 2 horas da manhã, mas nem isso me impediu, pedi aos meus pais e eles logo me levaram.
Quando cheguei corri para o teu quarto, passei por toda a gente e ouvi-te gritar o meu nome.
Agarrei a tua mão e tu acalmaste. Mais ninguém se atreveu a falar. Tu acordaras do coma a gritar o meu nome.
Adormeci a teu lado, não sai a tua beira até voltares a acordar.
Dormis-te imenso e por fim acordaste. Agarrei-te, não deu como não o evitar.
Chorei tudo o que até então não tinha chorado, e tu silenciaste-me e disseste que tudo estava como deveria estar, e acrescentas-te que voltavas a fazer o mesmo. Todos os que te ouviram choraram. Pediram para te deixar porque tais emoções te faziam mal. Tive medo de te voltar a largar, mas percebi a tua situação e achei por bem afastar-me.
Passaram-se mais 2 dias e eu não te pude ir ver, estive no tribunal para que os homens que eu feri depois de te esfaquearem fossem presos. Tudo correu bem. Passei por tudo mais duas vezes, mas voltava a repetir toda a história desde que eles fossem presos.
No sexto dia, desde que tinhas dado entrada no hospital, quando te fui ver, não me deixaram. Estava tudo a chorar, os teus avós rogavam-me pragas, e os meus pais tentavam levar-me para casa. Não percebi o que se passava, mas era algo muito mau, mas acabei por não conseguir resistir aos meus pais e fui para casa.
No dia seguinte o advogado da tua família quis falar comigo. Mais ninguém teve coragem para me falar.
O advogado disse-me que tinhas morrido, e sem esperar muito acrescentou que as tuas ultimas palavras tinham sido “amo-te” e logo depois o meu nome. Cai de joelhos, e bati com toda a minha força com os punhos no chão. A dor era tanta e o meu corpo já não respondia. Cada esperança ou recordação estavam a ser apagadas. Já não havia nada a fazer, e antes que eu me perdesse mais ainda, o advogado entregou-me três cartas. Disse que as tinhas escrito nos dias em que eu estive no tribunal. Não as abri. Em vez disso levei-as para junto dos teus familiares, e visto que os teus pais eram os únicos que me conheciam e me apoiavam, dei-lhes as cartas para eles as lerem para toda a gente. Foi a tua mãe que leu a primeira carta. Era um texto pessoal, mas mesmo assim toda a gente ouviu. Dizia o quanto gostavas de mim e que nunca mo tinhas dito por não quereres estragar a nossa amizade… contava histórias, momentos nossos, aquelas brincadeiras boas e más. Dizia também que eu tinha sido toda a tua vida e que se morresses não fazia mal porque sabias que eu viveria pelos dois, mas se fosse ao contrário, e morresse eu, tu não aguentarias e morrerias também. Toda a gente da sala limpava e escondia as lágrimas que ocasionalmente caíam face abaixo. Eu não chorei, queria chorar, mas não consegui.
A segunda carta foi bastante “chocante”. Disseste que todos os teus valores eram para mim. Porque? Tudo era para mim porque não gostavas da maneira da tua família tratar o dinheiro. Eles ficaram fulos e tu sabes disso.
A terceira carta, ninguém a quis ler e acabei também por me esquecer dela.
Fui com o advogado e disse para ele dar todos os teus bens a lares, para dar tudo em anónimo, os teus pais não se opuseram, e as tuas coisas pessoais foram todas doadas também, só fiquei com uma fotografia tua.
A tua família soube finalmente de tudo, da nossa história que ninguém percebia se era amor ou amizade, talvez porque era algo mais forte que isso, mais intenso. Tão importante que apenas bastava um olhar, ou aquele gesto para o coração bater mais depressa, mas embora isso, à face de todos não passava-mos de eternos apaixonados sem o admitir.
Embora por vezes nos quisesse-mos beijar, nunca o fazia-mos com medo de estragar o que já tínhamos. Podia-mos até nem nos tocar, mas fazíamo-lo no pensamento e isso bastava… como sempre…
Todos os teus familiares vieram ter comigo, pediram desculpa, e disseram para não faltar ao teu funeral.
Estive mesmo para ir… sim estive mesmo para ir, e tu sabes, mas no último momento a força falhou, a tristeza aumentou e ficou infindável… impossível de combater, e fui para o sítio onde mais perto de ti podia estar.
Sim, fui para o sítio onde nos conhecemos. Aquela praia à noite onde o meu irmão te levou com os vossos amigos e onde apenas tu olhas-te para mim sem ser apenas como rapariga, mas como irmã do teu melhor amigo que tu tinhas de respeitar.
Recordei todos os momentos, aqueles em que me apanhavas lá a chorar, ou aqueles em que nos atirava-mos para a areia e rolávamos praia abaixo até a água. Uma lágrima brotou, e um sorriso nasceu…
Passaram-se meses, em que eu permaneci calada, triste, meia morta e meia viva.
Hoje faz um ano desde que morreste, e eu olho para a fotografia da tua campa. Estou finalmente a recontar toda a história. Está cá o teu pai, a tua mãe, os teus tios, primos avós. Já ninguém chora, mas todos imaginam como teria sido a vida de cada um se tu estivesses vivo.
Eu já não penso nisso, sei que não gostavas que vivesse agarrada ao passado. Hoje tudo o que sou devo-o a ti, ainda sinto a culpa da tua morte, está cada vez mais leve, mas ainda me pesa nos ombros.
Tenho a terceira carta na mão e só hoje a vou finalmente abrir, mas quando a abrir será na praia, no nosso sítio, no nosso mundo.
Já tudo se afasta, e eu vou embora também. Mas sem nunca me esquecer de ti. Volto daqui a um ano, nem antes porque seria sinal de fraqueza e tu nunca me quiseste fraca, nem depois, porque seria sinal de esquecimento e eu nunca me vou esquecer de ti, por isso daqui a exactamente um ano vou estar de novo contigo aqui.
“O amor não se vive, sonha-se, o que se vive são os momentos de felicidade e esses quero vive-los contigo” foi a primeira frase que me disseste.
Adeus e até para o ano.
A.C. *
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Stacarca - Neiaxitah
Oi Neiaxitah, mas que conto mais triste o seu. Confesso que até arrepiou ao ler às cartas, estou impressionado com sua forma de escrever, você deixou tão real essa situação que eu emsmo me perguntei em certos pontos? Um conto ou uma lembrança? Espero que tenha sido apenas um conto. Meus sinceros parabéns.
Stacarca
Para Stacarca
o meu conto foi um misto de lembrança com o acrescimo de alguns outros promenores... mas o conto em si, foi todo real.
obrigado por o teres lido.. e mais aindo por teres gostado...
fico lisongiada... =))
abraços
A.C.
A.C.
Ceci/Neiaxitah
Promessa é dívida!! acabei de ser seu conto estou impressionada.
em certos momentos chega a arrepiar a gente,no seu comentário
acima vc diz que foi real...nossa tudo isso é muito triste,Mas sei
que as melhores e as mais doces lembranças jamais sairão do
seu coração. Parabéns seu conto é triste.mas lindo! ganhou uma
fã rsrs.
Bjão
(Ceci)
resposta a Ceci =)
sim as lembranças tanto boas como mas, nunca sairao do coraçao... porque sao as lembranças más que nos fazem saber o quanto bons foram os outros momentos...
ainda bem que gostas-te do conto.. =)
foi um dos momentos em que tive necessidade de deitar tudo ca para fora... =)
mas ainda bem que gostas-te.. =) muito lisongiada fico eu..
beijao
A.C.
A.C.
Carmen/neiaxitah
Se você passou por tudo isso em sua vida,com certeza é uma pessoa de grande coragem.Confesso que eu não conseguiria.Mas fico contente ao vê-la por aqui,escrevendo e revivendo tudo.Isso faz com que a ferida vá se cicatrizando.
Emocionou-me,querida.Beijos em sua alma.
Carmen
Carmen Lúcia
neiaxitah p/ Carmen Lúcia
a ferida que a vida provocou nao sara nunca... podemos esquecermo-nos que ja nao a temos, mas a qualquer altura da vida, ela abre, e voltamos a senti-la... nao tao intençamente, mas voltamos...
ha momentos em que nao sentimos nada, e nos esquecemos do passado, e outros em que ele pura e simplesmente volta.. e nos ficamos à deriva... perdidas nas lagrimas choradas ou por chorar...
uma coisa é certa, nao quero esquecer nunca o passado, porque é ele que faz de mim o que eu sou agora, todas as asneiras, todos os momentos, e por mais duro que tenha sido, esquece-lo seria apagar a minha existencia, por isso apenas o ultrapasso...
muito obrigado pelo tempo dispensado a ler o meu conto..
agradeço do fundo do coraçao..
beijos para uma grande poetisa..
A.C.
A.C.
Olá neiaxitah
Querida poetisa
Li muita tristeza é verdade, mas escreveu com nobreza
este teu conto da vida real tirei dele que a vida é apenas
um breve sonho e temos que dentro dele sonhar, porque
sonhando vamos amando e vivendo os momentos mágicos
de um amor verdadeiro e não esquecer que tudo na vida
passa até nós passamos por ela.
Admiro muito tua coragem em conseguir escrever porque
acredito que não tenha sido fácil ao teu coração e alma
reviver aqueles momentos, mas acredite escrevendo tira
um peso de ti. Nunca se sinta culpada porque este era o
destino dele infelizmente....Sinto muito amiga poetisa por
ter passado por momentos tão terríveis....
Parabéns por conseguir escrevê-lo
Beijo doce n'alma
ângela lugo
neiaxitah p/ angela lugo
não acredito que o destino está traçado, porem não posso ignorar que o que se passou comigo foi quase que pré-destinado..
se assim teve de ser, faria tudo de novo.. acho que as pessoas não devem de se arrepender do que fazem, mas sim do que não fazem. acho que as palavras não ditas são muito mais importantes do que aquelas não ditas.
além disso acho que as pessoas não devem de pensar muito, porque ao pensar a duvida instala-se e a dor aumenta, o sofrimento cresce, e torna-se dolorosa uma existencia assim.
Por isso gosto de fazer as coisas sem pensar muito nelas, porque assim a dor é muito inferior.. e passa-mos pelas coisas muito mais depressa.
o conto aconteceu verdadeiramente, mas nao foi por isso que o escrevi. Escrevi-o porque acho que as pessoas ficam muito agarradas ao passado, e deixam de viver o futuro..
para mim o presente nao existe, porque o presente é apenas uma fração de segundo, num instante é futuro, no outro já é passado..
há que aproveitar... e é isso que eu fasso.. sim sinto falta de muita coisa, e penso bastante no que passou, mas ja nao sinto muita dor, é mais angustia... mas há-de passar..
muito obrigado por ter li-do o meu texto. =)
beijos na alma.. para a poetisa que enche os corações de boas sensações.
A.C.
A.C.
Oi Andreia
Uma história de vida ou uma vida em uma história?
Deixa de ser um texto, deixa de ser um conto, passa pela nossa mente como imagens que se agitam ou gritam no embalo das palavras.
Nesta tua última frase está toda excência do amor, da história ou da vida, que em sonhos traçam passos, entrelaços, é onde goteja nossas lágrimas, que irriga os pedacinhos que fica do estilhaço de nossos corações.
“O amor não se vive, sonha-se, o que se vive são os momentos de felicidade e esses quero vive-los contigo”
Mesmo que seja tão triste, obrigada por dividir conosco.
Sem meandros de palavras te digo, tenho uma predileção especial por teus textos, se pensar um dia em editar, gostaria que fizesse contato com Poemas de Amor.
Grande abraço.
Fernanda Queiroz
Grande abraço.
Fernanda Queiroz
neiaxitah p/ Fernanda Queiroz
Muito obrigado, pelas suas palavras...
Fiquei simplesmente sem palavras... sem nada para poder dizer...
mas muito muito obrigada...
Quanto ao poder pensar em editar, acho que todos os meus textos não são de todo capazes de ser bons o suficiente para serem editados. Mas acho que também não sou eu que dito isso. São as pessoas que os leem.
Muito obrigada por tudo... são estas palavras que me enchem a alma, para continuar a escrever.
Um beijo
A.C.
A.C.