Segundos

Foto de Lou Poulit

O Trovão e o Sabiá Sereno

Sentada sob alpendre da mansão colonial, sua fortaleza de toda a vida, Sinhá havia se perdido em seus pensamentos. O dia havia se despedido há pouco, na apoteose fugaz de um céu prestante de cores e texturas, que de tudo o que pode tentou fazer para merecer a atenção da moça. Nem a sinfonia da passarada fez efeito. Tudo em vão, restaram as estrelas que nem sequer se aventuravam. A passarada se calou para dar a vez aos grilos, sapos e outros barulhentos notívagos. Sinhá revirava mecanicamente os fartos rendados da saia à sua volta, pois de fato não estava ali.

Então, passos arrastados vindos de dentro precipitaram-na do etéreo, de volta ao corpinho magoado pela posição pouco cômoda. De tão surpresa e assustada, não teve coragem de se virar. E esperou apenas, como seu sangue esperava dentro das veias. Aos poucos uma luz tênue, mas capaz de expulsar soberanamente a escuridão, se aproximou. Depois mais um pouco. A moça temeu que se aproximasse ainda mais e explodiu em gritos nervosos: Saia já daqui! O que quer de mim, demônio? Eu não lhe chamei aqui!

A pouca distância um caboclo mulato de aspecto impressionante, pele muito morena e os olhos claríssimos de uma onça enterrados no rosto embrutecido, como pequenas gemas raras no emboço úmido da terra adubada pelos séculos. O velho Sereno segurava a candeia, tentando compreender, tão próxima, a moça que à distância vira crescer, como flor única naquelas glebas. Durante parcos segundos, Sinhá não conseguiu balbuciar uma palavra. Tentava decifrar como aquela figura estranha havia invadido seu silêncio, que significado poderia ter dentro dele e se seria perigoso para as coisas ricas que guardava em segredo. Porém, achando que o silêncio era ainda mais insuportável, a moça voltou à carga: Quem lhe deu o direito de estar aqui? Ele tentou explicar: Vim só alumiá o negrume da noite pra vosmicê, Sinhazinha... Carecia de se assustá não... Não tenho medo de nada, ela empinou a própria fragilidade. Como poderia temer um empregado dentro da casa do senhor meu pai? Ademais, estava aqui com meus pensamentos...

O homem olhava com segurança os olhos escorridos de lágrimas da moça, cheios de brilhos amarelados pela chama da candeia. Sentia pena dela, mas sabia pelas décadas de convívio que não se devia manifestar piedade para com os senhores. Sereno sabe que está triste, Sinhá. Ma num pode fazê nada não, disse ele abaixando os olhos. Mas como pode saber disso? Não lhe dou esse direito. De onde você saiu?... Ainda com os olhos baixos, ele respondeu: Sempre estive aqui, Sinhazinha. Vim pra essas terras do senhor seu pai na barriga da minha mãe, que se foi embora amarrada naquele pé-de-jurema-branca, bem ali na direção onde a lua vai nascer já. Eu era desse tamaninho, cabia no cesto onde o alazão comia o seu mio. Naquele tempo o capataz era um homenzinho muito do ruim... Ela só queria alimentar a sua cria...

A moça se refez da letargia quando o ouviu falar no alazão, tornando a gritar: Não me fale do meu alazão. Eu amava o Trovão como se fosse uma pessoa! Ninguém montava nele além de mim! E acabaram de trazê-lo num arrasto de pau-de-mangue... Ele estava morto! E eu vou matar quem fez isso com ele... E a chorar convulsivamente ela recostou-se no portal, até sentar-se de novo no degrau do alpendre. Sereno continuou calado, imóvel, com os olhos cravados nas lages do chão. Como se sua alma cansada procurasse uma brecha para um imenso arrependimento.

Tentando descobrir em seu próprio silêncio o que deveria fazer naquela situação triste e constrangedora, o velho caboclo foi lentamente até a arandela pendurar a candeia. Não sabia o que fazer a mais. Durante quase vinte anos quisera ajudá-la em muitas situações de perigo, mas sempre chegava alguém antes. Sereno trabalhara sempre na plantação, às vezes tratando dos cavalos doentes e outras como mateiro. Amava a menina, antecipava os riscos que ela corria, mas haviam outros mais próximos dela. E agora o mesmo sentimento de proteção lhe parecia palpável de tão denso. E ironicamente, embora estivessem ali apenas os dois, simplesmente não sabia o que fazer.

Passados alguns poucos e imensos minutos, a moça quebrou o silêncio, mais calma, porém sem perder a altivez da voz: Como se chama? Sereno, Sinhazinha - disse ele. E porque está aqui, nunca lhe vi dentro de casa?... O velho empurrou a aba do chapéu para trás e coçou a calva rala e branca, como sempre fazia quando se sentia inseguro. Demorou um pouquinho mas respondeu: Eu vim de pés lá de trás da serra dos pastos... O senhor seu pai mandou que me alimentasse e ficasse por aqui até amanhecer. Ela insistiu: Mas por que veio de pés? Ah, Sinhazinha, parei no meio da mata para ouvir o sabiá-da-mata, tava cantando bem em cima de mim. Desde menino adoro os sabiás, num gaio da mangueira, por cima da minha palhoça tem um que fez ninho agora. Quando passo o café da tarde ele tá arrebentando os peitos, de tanto chamá uma fêmea pro seu ninho novinho e arrumadinho. Mas me distraí, meu cavalo assustou-se com a onça e saiu desembestado, nem sei pra onde. Mas vou lá buscar, pro seu pai meu senhor num ficá num prejuízo maió. Não é um bicho caro, é até meio capenga... Mas é um bom companheiro, num sabe? Vendo a perplexidade dela, ele perguntou: Que foi Sinhá, com essa boca aberta, quem nem peixe morto? A moça sussurrou: Onça?... Que onça é essa, Sereno?

O velho respirou profundamente. Não haveria mais de esconder. Ela que soubesse a verdade e que fizesse o que achasse justo. Disse a ela com segurança: a mesma que pegou o Trovão... Aquele sangue todo foi porque quando cheguei ela já tinha garrado no pescoço dele – disse caboclo limpando instintivamente as mãos grosseiras nas calças. A moça mostrou-se inconformada: E você não fez nada para ajudar o coitado? Não tinha uma arma, Sereno? Sinhazinha, ele caiu por cima da bicha, esperneava como um porco endemoninhado... Endemoninhado é você, miserável! Ele era o alazão mais valente que conheci... Só que havia uma onça mordendo o seu pescoço... E um homem medroso e inútil assistindo a sua morte desesperada! Que queria que o Trovão fizesse?... Sereno, se calou constrangido. E ela quis saber mais: E depois, Sereno?... Sinhazinha, num é nada fácil chegar perto de dois bichos grandes e raivosos... E eu só tinha mesmo o meu facão de mato e não queria ferir ainda mais o Trovão. Sim, mas o que você fez? – ela implacável. Eu nada, Sinhazinha, a onça é que resolveu desaparecer. Onça é um bicho covarde. Só pega pelas costas, sangra e espera morrer. Mas se sentindo insegura ela larga e fica de longe só espiando. Esperando a hora de comer sossegada. E o outro, que também é bicho, sabe que vai morrer e que ela vai vir lhe rasgar as tripas. É só uma questão de tempo... O mundo dos bichos é assim mesmo, Sinhá. Ninguém muda não. Vosmicê ta triste e eu também... Mas o Trovão tá não... Só tá esperando os primeiros lampejos do dia, pra correr por essas terras sem fim, pelos campos e pelas matas fechadas, num tem mais nada que lhe impeça... Vai conhecer todos os lugares onde nunca tinha ido, vai beber água do rio grande e vai saltar nas ondas da praia... Enquanto isso nós vai fica aqui chorando de tristeza, porque num pensa que ele ta livre como nunca foi... É que como nós só sente o sentimento da gente, só pensa com a cabeça da gente, então acha que o trovão ta sentindo e pensando a mesma coisa, Sinhazinha... Não tenha raiva não... Que ele não pode aparecer pra vosmicê e lhe contá como que é lá donde ele vem, ele vai ficar triste por causa da sua tristeza...

A moça se esforçava para aceitar aquela sabedoria estranha, que quase desdenhava os seus mais puros sentimentos, todas as coisas que aprendera a sentir. Mas, embora não tivesse coragem de dizê-lo, até que gostava muito de imaginar seu querido Trovão suando da correria que tanto amava, brilhando ao sol e ao luar. Ele amava o vazio dos espaços, os obstáculos que vencia, amava o vento revirando as suas crinas, enchendo-lhe os pulmões no peito enorme e musculoso, e depois expirava com força fazendo seu próprio vento, era quase um deus da natureza... Ah, como ele gostava disso... – dizia a si mesma. Alagada da própria ternura, disse então ao velho: Ele lutou até o último instante não foi, Sereno?

Ele era valente demais, eu o conhecia desde que era um potrinho muito abusado... Sou lhe muito grata, quero que fique, se alimente bem e descanse bastante. E depois vá buscar o pangaré, antes que essa onça o coma, já que não comeu o Trovão, pois que os homens foram buscá-lo antes disso... Sereno sentia-se mais à vontade agora, já sentado também no degrau de baixo. E completou: Vou Sinhazinha, antes de clariá vou atrás dele. E ai dela que se meta... Faça isso por mim, Sereno – ela pediu com raiva.

Não posso prometer, Sinhazinha... Não Sereno, não se arrisque, leve uma arma... E se ela lhe pegar pelo pescoço, como fez com o Trovão?... Vosmicê num fique triste não, Sinhá... Também sou meio bicho, já fiz muita coisa nesse mundo de meu Deus... Já matei oito onças, seu pai meu senhor pode lhe dizer... Uma delas ia morder era o pescoço dele... É que de uns anos pra cá elas estavam sumidas, que os cachorros farejam a catinga delas de longe... Gato tem raiva de cachorro e vice-versa, num sabe?

Eu prometo, Sereno. Vou contar para os meus netinhos essa estória. E vou me lembrar de dizer que você foi um herói, que não pode salvar o Trovão, mas veio de pés buscar homens, para que ele tivesse um enterro digno. Meus netinhos vão aprender a odiar todas as onças, porque essa matou o Trovão... Mas eis que tais palavras indignaram o velho filho-do-mato, e ele quis ser exato: Não, Sinhazinha... Isso não é certo, não é verdade não... Como, Sereno? Se ela não matou o meu alazão, então quem foi?... Fui eu mesmo, Sinhazinha... A moça de um pinote ficou de pé, com o dedo em riste, enfurecida lhe disse: Seu traidor! Vá embora, suma daqui! Nunca mais quero ver sua cara! Não vou lhe perdoar jamais! Vai... Antes que eu grite por alguém para lhe surrar no pé-de-jurema, desgraçado!

Naufragados novamente em profunda tristeza, ambos se foram. Ela para chorar na cama e ele no mato. Mas nenhum dos dois conseguiu dormir. A moça rolou na cama, sobre o lençol úmido das suas lágrimas, até que lhe viessem chamar para o almoço. Não foi. À tarde, na hora da refeição também não quis sair do quarto, deixando a todos apavorados. Seu pai começou a preocupar-se, vendo que as mucamas não paravam de cochichar pelos cantos. Resolveu-se a sacudi-la. Entrou no quarto como um furacão para intimidá-la e foi querendo saber o porque daquele drama. Sabia o porque, também sentia muito pelo alazão, sabia o valor que tinha, mas não queria perder também a filha. Sinhá estava desolada e não apenas pelo seu Trovão. As horas lentas da madrugada lhe convenceram de que havia sido injusta com o Sereno. Estava agora claro que quisera apenas poupar o animal de mais sofrimento. Não podia carregá-lo nas costas e com certeza não quis que o alazão assistisse a desgraçada da onça comer-lhe as carnes ainda vivas. Ela estava soterrada de remorso e com muito jeito fez o velho concordar em mandar buscá-lo. Assim também concordou em levantar-se para se banhar e voltar à vida normalmente.

Alguns dias depois estava novamente sentada no alpendre, mas dessa vez assistiu a obra da natureza que se comprazia em dispor da sua atenção. O dia terminou. Escureceu por completo. Ela se lembrou da noite em que se assustou com Sereno. Dessa vez queria imensamente que ele lhe trouxesse a candeia. Havia preparado algumas palavras para lhe pedir que perdoasse a grosseria. Ninguém lhe dissera uma palavra durante esses dias, tinha a impressão cada vez mais densa de que não lhe queriam falar a respeito. Uma luz veio de dentro, mas pelo andar sem botas não poderia ser Sereno. Era uma mucama, que foi dispensada. Sinhá só queria a luz do velho caboclo, como naquela noite. Agora queria gostar dele, da sua sabedoria e da sua paz. A lua começou a aflorar, derramando seu prateado pelas colinas que pareciam abraçar em segurança a mansão. De repente, algo mexia nas folhas do pé-de-jurema-branca, que pareciam lhe acenar variando o reflexo do luar. Então, para sua imensa surpresa ouviu com nitidez o canto mavioso de um sabiá... Mas como? Sabiá cantando há essa hora? Não pode ser... Não queria aceitar o que seu próprio silêncio lhe dizia, lutava contra com todas as suas forças... Então ouviu de novo, logo ouviu outra vez e de novo tornou a ouvir... As defesas que havia erguido em si própria foram ruindo a cada canto, como se fossem rojões de poderosos canhões. Até que não pode mais sustentar a certeza que preferia. O sabiá só podia estar feliz. Tão feliz que nem se importava com a noite, não queria esperar o amanhecer! Se quisesse vê-lo sempre feliz, devia afastar a tristeza. Libertá-lo do próprio peito para que fosse completamente livre, para que cantasse onde quisesse e quando quisesse. Seu canto não era triste como o de outros, mas vigoroso e doce como o de uma flauta da natureza. A mucama voltou com um semblante pávido, mas quedou-se quando à luz da candeia viu que o de sua Sinhazinha sorria para a lua, já em seu esplendor. A mucama lhe disse: Sinhazinha, o seu pai mandou meu irmão e me primo buscar o Sereno... Mas eles não querem falar, estão com medo. Medo de que? Diga logo... Não fica brava comigo não Sinhazinha... Fala de uma vez, mulher... É que a onça pegou o Sereno também, Sinhazinha...

Completamente perplexa, a mucama ouviu a Sinhá lhe dizer com doçura: Não fique assim tão triste. Há essa hora ele deve estar bem assobiando por aí... Por onde, Sinhazinha?... Pela natureza, pelo céu, pelo rio grande, ou se lavando nas ondas do mar... A pobre mucama não conseguia atinar com aquelas palavras surpreendentes e Sinhá completou: Anda, pode deixar a candeia na arandela e vá pra dentro. Se precisar eu lhe chamo, agora vá. Quando mais tarde seu pai veio lhe buscar para dentro, aliviado pelas falas da mucama, encontrou-a bem disposta, quase feliz para aquelas circunstâncias. Sinhá aproveitara o tempo para fazer uma prece emocionada, repleta de gratidão e amizade, pela alma do velho Sereno. Durante toda vida estivera bem ali e nem o havia notado. Mas havia sido de grande valia justo no momento que mais precisou. Se estava feliz a ponto de assobiar no galho do pé-de-jurema àquelas horas, então deviam estar todos felizes: O Sereno, sua pobre mãe e também o Trovão. Não, não queria mais pensar em tristezas. Foi quando seu orgulhoso pai, sentindo necessidade de participar daquele momento lhe disse: Deixe estar, querida... Aquela maldita onça não irá longe... Eu me encarregarei disso pessoalmente.

Lou Poulit
Direitos Exclusivos do Autor

Foto de Aline_Só sei amar

Tá doendo de Verdade

Você está acabando comigo, me matando por dentro, me tirando à calma, me deixando na ansiedade.
Você está acabando comigo, conforme passam os segundos e você não me diz nada.
Você está me matando por dentro, roendo meu coração e destruindo minha alma.
Você esta fazendo meus olhos arderem, meu sorriso secar e minhas lágrimas rolarem.
Você está interferindo em meus pensamentos, fazendo com que nada mais tenha sentido exceto ter você aqui comigo.
Você está invadindo minha vontade de viver, acabando com o que tinham deixado em mim.
Você está acabando com meu chão, bloqueando os meus passos e me deixando sem reação.
Você está me destruindo aos poucos, lentamente,
Está me fazendo sangrar e chorar, e isso está doendo muito.
Peço-te, por favor, te imploro.
PARE COM ISSO

Foto de weder

O Amor

Sabe, as vezes ouço as pessoas dizerem que o amor não existe, que o casamento não compensa... Sinceramente pra essas pessoas que não acreditam no amor talvez o casamento não compense mesmo... Se a bíblia diz que o amor é um dom de Deus, que tudo sofre, tudo suporta, tudo padece... e te faz eternamente feliz!!!
É esse o amor que eu procuro, que eu idealizo em meus sonhos... um alguém que faça meus segundos serem eternos, que eu encontre em seu sorriso a sinceridade e na sua presença a segurança que desejo.
Alguém que me mostre um novo “eu” refletido no brilho da tua face, que me ensine a conhecer o amor... Uma companheira... não só por um dia ou por uma noite, mas pelo resto da minha vida!
É isso que penso a respeito do amor, e é em prol disso que rogo a Deus todas as noites, eu confio que Deus é fiel, e por isso espero com paciência nele.

Foto de poetadefimdesemana

Ilusões?

Caminhando por aí nesta confusão imensa,
perdido entre a indiferença de outrora e a dependência de agora,
tento entender o porquê que sempre
que nos encontramos frente a frente
Sinto que o meu olhar necessita da tua imagem,
Mas quando caio na realidade... ela não passa de uma miragem...
Sinto que o meu tempo precisa dos teus segundos,
tal como o meu coração anseia por aqueles sentimentos profundos,
Sinto que o meu olfacto busca incessantemente o teu perfume,
mas nunca o encontra... tal como de costume...
E minha audição perdida numa maré de sons e melodias
busca aquela tua voz repleta de perfeição e maresia,
que me faz sonhar sem ter de adormecer...
E no meio de tantas outras sensações
Sinto que todas elas nunca passaram de meras ilusões...

Foto de Ritoxcas

O amor e como uma aventura

um dia estava deitada
mas ouvi alguem andar
levantei me da cama
e fui ver quem era
estava cheia de medo
nao konseguia parar de tremer
quando ia a abrir a porta
e vi quem era o meu
corpo parou de tremer
foi entao que o vi
era ele...lindo como sempre
os seus olhos brilhavam
e meu coração reconheceu
aquela cara
Nunca me vou esquecer
nessa noite que o meu
corpo nao parava de tremer
mas de repente tudo mudou
e um exemplo que quando tudo
parece correr mal nuns segundos
tudo pode mudar ou vice-versa
mas nao pode mos ter medo temos
de vencer o medo e arriscar
e como entrar numa aventura
podemos chegar ao fim ou
podemos ate mem chegar ao meio
o que enteça e lutar pelos
objectivos ir ate ao fim
e ficar contente consigo propria por isso...

Foto de Jorgejb

E de um poema nasceu 2

Deixou um poema em cima da mesa e saiu. Sabia que ela, ao sentir o frio do outro lado da cama, saltaria pronta, procurando onde tinham feito amor, a mesa nua e fria, ainda quente do seu corpo, sulcos de si própria espalhados nela, e assim, perceberia a folha cheia, acolhendo palavras para si.
Não, não era um recado, nem uma justificação, nem concerteza razões expressas de forma polida e omnisciente, desculpando-se. Era um poema, zurzido da consciência do impossível, dos pedaços dos dois, que ainda ontem pareciam não conseguir se despegar, iluminados da loucura que os prazeres quando libertados, emprestam aos corpos e lhes dão aquele brilho, que só os amantes sabem contar e explicar dentro dos seus corações.
Uma dolorosa e delicada expressão de amargura, empalideceu seu rosto, sentindo a solidão dos amantes traídos; olhou de lado a sua cama, desarrumada, os lençóis descaídos e soltos, as roupas espalhadas pelo chão, como um mapa, com pontos demarcados e uma história apensa a cada um.
Já sentada na beira da cama, contida no seu próprio corpo, escondendo seus seios em seus braços, as pernas geladas, vermelhas, unidas na estupefacção do seu próprio ruído interior, procuraram nas palavras uma nova força, um destino, uma alma.
Encontrou-o mais uma vez. Como sempre, arquitecto de palavras, demasiadamente doce para a sua manhã, o rosto dele na sua memória - definhando, e foi lendo, e lendo, sem compreender onde chegava.
Era a carta de um homem com medo do amor, como se não lhe tivesses deixado os seus portões abertos para entrar, era a carta de um homem preso ao espaço e à resignação do mundo que trouxera atrás de si, como se ela alguma vez tivesse ousado tocar em seus haveres, ou pronunciado a palavra passado. Era ele e seu mundo, e a irrazoável forma de dizer adeus cobardemente, como se num último rebate, abandonasse a prancha mais alta e recusasse o salto para um mar maior e mais azul.
Ela sorriu, arrumou o quarto, tremeu de frio, e percebeu o quanto tinha estado nua, agasalhou-se sentindo o conforto do seu xaile de seda, onde tantas vezes repousara o seu amante, e sorrindo mais uma vez, abriu a janela que dava para o meio da rua, o rio entrando pelas suas narinas, extasiado do fresco ar húmido e salgado que a abraçava, e convidando o Sol a entrar, escutou no seu rádio a sua música favorita, trauteando um novo canto, sem saudade, sem rancor. O amor, o seu amor haveria de chegar outra vez.
Ele, parado no meio da rua, queria perceber o que tinha escrito, a impulsividade que o dominava, o medo de magoar, de prolongar sonhos sem esperança. Doía-lhe o peito e a saudade dos lábios dela. A manhã não lhe dava tréguas, de ter sido acordada tão cedo, enregelou-lhe os ossos, como querendo que ele voltasse ao leito que tinha deixado. Sentia o perfume dela, abraçando-o, mas soube que a outra história devia estar destinado. Final de história, os passos levavam-no em frente. Sorriu na compreensão, do quanto ela ficaria no seu peito, na sua memória, e amou esse momento na plenitude de um grande final e do quanto os momentos são diferentes na medição do tempo e dos seus segundos. Veio-lhe à memória a mesma canção, que tocava em todas as janelas abertas, a sua canção, espalhada por todos os rádios, esperando que ela também o tivesse ligado, trauteou baixinho para ela, que o amor nunca irá partir, um dia o amor, o seu amor haveria de chegar outra vez.

Foto de clovisfereira

O jogo do amor

“Criança não vê que o jogo acabou”.
Esta foi à frase que a vida me falou.
E me Arrastou do jogo, não ouviu meus prantos,
Mas com o passar dos anos fui me acostumando.
Ouvi dizer que o tempo cicatriza todas as feridas.
Então, que dor e essa que carrego no meu peito?
E o doutor tempo, aonde anda?
O quê tem feito?

Hoje vou me fechar e esquecer do mundo,
De que o salário mínimo foi para trezentos e cinqüenta mangos,
De que a cesta básica já esta aumentando,
De que nossos jovens estão se drogando,
De que há uma bala perdida nos procurando.
Vou pensar em mim e traçar meus planos
Pois a vida é curta e eu já tenho muitos anos.
Amanhã Quero minhas asas, por favor, devolva,
Junto com meu filho e minhas roupas.

Vou voar bem alto pelo céu nublado,
Chorar por um amor eterno enquanto durou,
Rever a minha estrada, relembrar do passado,
Enterrar mais um pedaço de coração machucado.
Dizem que é bom para saúde expressarmos o que estamos sentindo
E se eu precisar do SUS posso acabar morrendo.

E duro perder, mas vou jogar de novo.
As marcas das batalhas exibo com orgulho
São olhos secos, coração partido, amontoado de sonhos destruídos
Às vezes um minuto vale mais que um milhão de segundos
Amor, meu grande amor, estou aqui de novo
tentando te encontrar no meio de tantos rostos
espero o seu olhar para recomeçar o jogo.

Foto de Deko

Chega a noite

Chega a noite...
Lentamente caio para dentro de mim,
me perdendo em algum lugar do passado,
onde o carrasco é o presente,
que flagela meus sentimentos
trazendo a tona a fria realidade...

Se pudéssemos mudar o passado?
Se o seu nome não tivesse guardado?
talvez hoje não seria condenado
e seguiria livre, na absolvição dos meus pecados...
Mas as horas passam, regredindo os milésimos,
devastando com o vento a vontade de gritar seu nome,
de ouvir sua voz...

Sou anestesiado pelas lágrimas
que insistem em reger ao silencio a mais bela sinfonia...
A Lua solitária entoa sua melodia...
Será que ela pode me ouvir?
Será que ela entende meus sentimentos?
Será que ela ouve meus lamentos?

Onde foram as estrelas?
Eu preciso de seus brilhos,
pois por enquanto é o mais próximo que posso chegar do seu olhar,
o mesmo que um dia passou por mim,
eternizando os segundos
e se prendendo para sempre em meu coração...

Chega a noite...
Na utopia noturna, a Lua me faz companhia...

Foto de Fernando Poeta

Sereia

O navio naufragou,
Fui lançado na imensidão azul do mar.
Não havia salvação, percebi o inexorabilidade da morte,
Nos poucos segundos que achava que ainda restavam.

Poupei meu fôlego,
Para conseguir, ante o fim iminente,
Guardar em minha mente,
A última impressão deste mundo.

A beleza descortinava-se à minha frente,
Com muita clareza conseguia ver,
O fim chegando,
Adornado pela beleza do oceano...

Não havia mais o medo,
Nem o desespero,
Apenas o extasiante estupor,
Ante o que contemplava.

Com o corpo dormente, a alma liberta,
A vegetação marinha a minha volta,
Cardumes coloridos de peixes, passando ao largo,
Observavam minha queda.

Ao fundo cheguei,
E aguardei o fim,
Então tão próximo dele,
Achei estar em um sonho, e percebi que delirava...

A minha frente rapidamente,
Algo se aproximava,
Com movimentos ondulantes e rápidos,
Conseguia perceber apenas a forma, e então meus sentidos foram embora...

O tempo, não sei dizer,
Vivo! Eu estava vivo,
Como isso aconteceu?
Qual a explicação para minha salvação?

Em meio a meus devaneios,
Ouvi um canto, belo, suave e atraente,
Atraiu meu olhar,
Para arrecifes formados ao longo da praia.

Avistei então uma lenda,
Avistei o que só poderia ser,
O que os antigos denominavam,
Sereia...

Cachos de cabelo negros como ébano,
Corpo sinuoso até o quadril,
E longa cauda escamada, verde como as águas claras,
Terminando em enorme nadadeira...

Olhava em minha direção,
Continuando seu canto,
Acariciando seus cabelos,
Mantendo nos lábios um sorriso cintilante...

Cantava minha salvação...

Encontra-me no seio de sua morada,
Chegou a mim,
Percebeu que morria,
Colou seus lábios as meus.

Arrastou-me assim,
através das águas frias,
Até deixar-me na praia,
Até deixar-me salvo.

Aguardara-me ver acordar,
Para dar-me adeus,
E então ao seu lar,
Poder retornar...

Lançou-se às águas,
Levando consigo,
O que então deixara,
Meu coração partido...

Foto de Leciani

Pensamentos

Penso em ti todos os segundos do meu dia
Será que pensas em mim agora
Será que, esta sozinho em seus pensamentos,
Assim como eu,

Estou em meu quarto
Ouvindo nossas canções,
Relendo nossas histórias...
Escrevendo minhas promessas a ti

Tudo é tão triste sem você,
Distante dos olhos,
Mas nunca do coração,

Queria você aqui, agora, comigo...
Parece-me tão fácil te amar
Mas é tão difícil expressar.

É como dizem: o amor,
Não pode ser escrito e nem descrito,
Só podemos senti-lo

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