Meu doce amargo,
Os meus olhos despes
ao não te ver neste largo
onde à muito me deste
um anel de noivado.
Lembro-me,
como eras doce,
como me veneravas.
Como lá pelas doze
aqui comigo te encontravas.
Recordo-me,
do teu olhar cintilante,
onde me via reflectida.
Do teu espírito jovem e inquietante,
que me deixava sem saída.
Daqueles teus afagos,
logo pela manhã.
Daqueles doces e amargos,
que fizeram de mim, tua romã.
Sentada,
aguardando-te neste largo,
onde boas lembranças já não habitam…
Acabada,
num calor pardo,
as tristezas me ressuscitam.
Como és amargo,
em ir sem nada me dizer…
deixando-me a meu próprio cargo,
depois de ao céu me teres feito erguer.
Como és cruel,
em te demolires a meu peito…
Vou tirar este anel,
não mereces o meu respeito.
A correr e a chorar lá vai aquele rosto
de menina…
Entre o morrer
ou um bom aconchegar,
está a minha pequenina.
(disse o seu pai vendo o repetido episódio e lamentando)
Acabou assim a primavera,
de enlaces.
O inverno apresava uma nova era
sem esperar que para ele te preparasses.
Passaram-se meses, anos…
E como as suas lembranças
naquela casa ainda eram tão assistas.
Ainda habito nas esperanças,
daqueles imensos planos,
aos quais deste as tuas desistas.
O livro de receitas,
aparecia sempre que cozinhava.
Para evitar os meus enganos,
naquelas feitas
como meu homem sempre me lembrava.
Aquele meu pente,
que nunca o deixava no lugar,
tinha agora um ar reluzente,
quando nos meus cabelos o fazia tocar.
...Como se tu fosses ele.
Adoravas os meus cabelos…
E assim comecei a acreditar,
que com fé talvez ele se revele,
e voltemos aos tempos belos,
da primavera a espreitar.
Numa noite,
na qual as trovoadas rompiam os céus.
Sai de casa sem desajeite,
fui para aquele largo proteger os meus,
antes que aquele tempo os desrespeite.
Pesada, daquela chuva,
por entre tremeliques de frio.
Senti tocar-me uma luva
e o iluminar do meu fio
onde tinha a aliança.
Conforto-me e aqueço-me,
naquela esperança,
incandescente.
Quando sou atingida por um raio…
Fico inconsciente...
e ergo-me.
Afasto-me do meu corpo,
vejo-o irreconhecível no chão…
Quando ia para soltar um grito louco,
sinto um aperto de mão.
Era ele, a minha doce amargura.
Sorriu e disse-me: ‘tontinha, achas mesmo que
te ia deixar?’
E uma tamanha injustiça me perfura,
como pude eu me conformar?
Como se ele lê-se os meus pensamentos,
disse: ‘Minha princesa,
peço que me perdoes por ter ido sem avisar
mas, quero
que saibas que estive em todos os momentos,
só esperava que nisso acreditasses,
para te poder vir buscar,
à muito que te espero.’
As palavras afagavam-se
no iluminar daquelas almas que falavam por si.
Os seus medos ausentaram-se,
mas, esta história não acaba aqui.