Migrantes

Foto de AjAraujo poeta humanista

O passaporte de final de ano

O teu segredo é fraco!
É vago, é tolo.

O teu remédio é placebo!
É amargo, é puro engano.

O teu amigo é falso!
É agiota, é tombo certo.

O teu retrato é velado!
É apagado, é sombrio.

O teu extrato é negativo!
É sem crédito, é puro falso.

Todavia, repara: o mundo ainda não acabou!
nem a mulher dos teus idílios
nem a cidade-fantasma dos teus pesadelos
nem a taberna de teus porres homéricos
nem a livraria de tuas fugas intelectuais

Mas, é fato: O teu mundo mudou!
seria a roda gigante do circo da infância?
seria a dançarina ou o palhaço da alegria?
seria o trapezista ou o domador da fera?
seria o remendo da calça na festa junina?

Teu uísque é rótulo falso!
É cefaléia certa, é ouro de tolo.

Teu protesto é puro ócio!
É chuva de verão, chope no Amarelinho

O teu amor é passageiro!
É somente sexo ficante, por natureza vazio.

O teu motor é trem de subúrbio!
É sufoco certo, da Central à Deodoro.

O teu sorriso é puro ensaio
É fogo de palha, ator sem teatro

E agora? O que pensas fazer
Vais ficar ou partir?

Não penses em Minas!
pra minas se foi José, nada mais,

Não penses em Maria!
Maria foi pra Bahia, pro terreiro de mãe-meninha

Não penses em fugir!
As ruas alagadas, estradas tomadas, que fazer?

Não penses em ajuda!
Todos se foram para Arraial D'Ajuda

Fique aqui "curtindo" ou vá para Brasília!
Capital dos ratos do serrado central
Da farra geral dos "políticos" e lobbistas
Da barra pesada dos candangos e migrantes,
E dos esotéricos e anjos emudecidos em geral.

AjAraújo, o poeta humanista.

Foto de Wilson Madrid

AS FORMIGAS APRESSADAS

*
* CRÔNICA
*
*
18:30' de um dia do mes de abril de 2003.

Estação Sé do metrô de São Paulo, uma das cinco cidades mais habitadas do planeta, com cerca de quinze milhões de habitantes.
No saguão interno da estação, acontece uma exposição denominada “Êxodos – a humanidade em transição – 1993-99”, trabalho de Sebastião Salgado, fotógrafo brasileiro consagrado internacionalmente pela sua arte fotográfica, voltada para os problemas sociais da humanidade, expondo fotos das vítimas e refugiados das recentes guerras e conflitos sociais ocorridas em vários países do mundo.
Sucesso de crítica e de público em vários países, a apresentação do trabalho informa que “movido pelos milhões de refugiados, migrantes e destituídos do mundo, o fotógrafo Sebastião Salgado documentou a situação em 41 países durante quase sete anos. Por quê? "Espero que tanto como indivíduos, grupos ou uma sociedade, façamos uma pausa para pensar na condição humana na virada do milênio. Na sua forma mais brutal, o individualismo continua sendo uma fórmula para catástrofes. É preciso repensar a forma como coexistimos no mundo."
Mesmo sendo gratuita para os milhares de usuários que passavam pelo local, apenas cinco ou seis pessoas apreciavam a obra prima do excepcional artista, cidadão do mundo e profeta da injustiça social mundial.
Ao lado da exposição, uma multidão de pessoas passava apressadamente, ignorando completamente tão importante trabalho.
Naquele horário, aquele local parecia um “formigueiro” de pessoas preocupadas em chegar logo aos seus destinos, provavelmente, algumas indo para o trabalho, outras para a escola e a maioria, certamente, retornando do trabalho e indo para as suas residências, onde, após o jantar, costuma dedicar algumas horas da noite assistindo a nossa programação de tv, repleta de futilidades e tão carente de programas educativos e culturais.
Foi impossivel deixar de me lembrar do “maluco beleza” Raul Seixas, que algum dia deve ter sentido o que mesmo que senti naquele momento e denunciou ao compor S.O.S.: “Lá por detrás da triste e linda zona sul, vai tudo muito bem, formigas que trafegam sem por quê...”.
Quanto aos cinco ou seis "desocupados" que dedicaram parte do seu tempo apreciando a exposição, tenho a certeza de que sairam enriquecidos no conhecimento do quanto o individualismo e o egoísmo humano é capaz e do quanto é urgente e imprescindível conscientizar as pessoas para o combate à toda e qualquer injustiça pessoal ou social, cada um fazendo o que estiver ao seu alcance para o bem comum, porque a injustiça social é gerada pela somatória das injustiças pessoais, na esperança de um dia ver toda e qualquer injustiça varrida da face da terra, para a humanidade, finalmente, poder assumir o seu direito natural e divino de poder viver em paz.
Para os que ainda não conhecem ou não souberam da realização da exposição de tão importante trabalho naquela oportunidade, ainda existe a possibilidade de conhecê-lo através do site www.terra.com.br/sebastiaosalgado.
Quanto aos demais componentes do “formigueiro”, deduzi que ocorreu uma falha grave por parte dos organizadores, no que diz respeito ao despertar do interesse geral pela exposição: esqueceram-se de contratar algumas recepcionistas com peitos e bundas de silicone; alguns seguranças "sarados" e espalhar pelo chão, em torno dos painéis que continham aquelas impressionantes fotografias, algumas pitadas de açúcar, misturadas com um pouco de fama, dinheiro e poder...
Porque as “formigas apressadas” aprenderam que “tempo é dinheiro” e que “o importante é levar vantagem em tudo, certo?” e o que elas ganhariam perdendo seu "precioso tempo" ou que vantagem levariam para ver umas fotos em branco e preto, feitas por um tal de Salgado, de algumas pessoas amarguradas, desconhecidas, pobres e excluidas do direito à dignidade humana, que nem sequer participaram do Big Brother Brasil?

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