Rosa pálida, em meu seio
Vem querida, sem receio
Esconder a aflita cor.
Ai! a minha pobre rosa!
Cuida que é menos formosa
Porque desbotou de amor.
Pois sim...quando livre, ao vento,
Solta de alma e pensamento,
Forte de tua isenção,
Tinhas na folha incendida
O sangue, o calor e a vida
Que ora tens no coração,
Mas não era, não, mais bela,
Coitada, coitada dela,
A minha rosa gentil!
Curvam-na então desejos,
Desmaiam-na agora os beijos...
Vales mais mil vezes, mil.
Inveja das outras flores!
Inveja de quê, amores?
Tu, que vieste dos céus,
Comparar tua beleza
Às folhas da natureza!
Rosa, não tentes a Deus.
É vergonha...de quê, vida?
Vergonha de ser querida,
Vergonha de ser feliz!
Porquê? Porquê em teu semblante
A pálida cor da amante
A minha ventura diz?
Pois, quando eras tão vermelha
Não vinha zângão e abelha
Em torno de ti zumbir?
Não ouvias entre as flores
Histórias de mil amores
Que não tinhas, repetir?
Que hão-de eles dizer agora?
Que pendente e de quem chora
É o teu lânguido olhar?
Que a tez fina e delicada
Foi de ser muito beijada,
Que te veio a desbotar?
Deixa-os: pálida ou corada,
Ou isenta ou namorada,
Que brilhe no prado flor,
Que fulja no céu estrela,
Ainda é ditosa e bela
Se lhe dão só um amor.
Ai! deixa-os e no meu seio
Vem, querida, sem receio,
Vem a frente reclinar.
Que pálida estás, que linda!
Oh! quanto mais te amo ainda
Dês que te fiz desbotar.
Almeida Garrett (1799 - 1854)