Como foi bom não te ver. Não te encontrar quando pensei que iria. Confesso que a princípio meus olhos te procuraram e meu coração esperava, como um bandido quando vai roubar, o momento de acelerar descontroladamente quando deslumbrasse a tua imagem. Mas a esperança apagou tão rápido que me espantei por não ter doído. Eles (meus olhos e coração) simplesmente se conformaram sem dor nenhuma. E isso foi fantástico! Enfim estou de volta! Você de uma vez por todas retornou à posição que realmente merece – insignificância – e eu estou no controle novamente...
Sim, como é bom estar no controle. Por cinco ou seis dias você me tirou do comando e bagunçou um pouco meus compartimentos sentimentais. Ahh... eles são quase sempre intocáveis e eu tenho sido – há muito tempo – a única que põe ou tira qualquer coisa deles. Eu organizo tais compartimentos de uma maneira em que eu saiba exatamente onde está o que procuro, por isso às vezes sou tão fria, porque organizo meus sentimentos. Pow... é isso mesmo! Eu or-ga-ni-zo meus sentimentos. Daí você do nada, chega impondo regras e ditando ordens, querendo mudar minha forma de arranjar cada sentido e emoção fazendo eu me perder dentro daquilo que é meu e que praticamente só é tocado por mim... Ousado, invasivo, espaçoso e atrevido! E a pior parte, você foi tudo isso sem fazer ideia! Foi bem estranho pra mim essa “invasão” súbita. Eu vinha em minha vida calma e sob controle, tudo de acordo com o calculado, sem surpresas ou imprevistos. Eu podia ver a minha vida sentimental na palma da minha mão, como um pequeno quebra-cabeças montado. Então o susto de olhar e além de bagunçado vê-lo incompleto foi desnorteador! Por um momento fiquei parada de olhos arregalados tentando entender o que estava ali. Mas depois fui me acalmando e tentando encontrar a melhor solução. Aos poucos juntei algumas peças que estavam próximas e depois fui encontrando outras pelo chão e pela cama até que estava com todas as peças novamente, só faltava terminar de juntá-las. E hoje, ao perceber que tua ausência – e indiferença – não me causou mais nada, que nenhum tremor fez balançar as prateleiras das minhas dependências emocionais, coloquei a última pecinha que faltava no seu devido lugar.
Mas sabe que, olhando – sentindo – por outro lado eu diria que foi maravilhoso! Afinal, você pode me perguntar que graça tem viver assim. Sem um “abalo” desses de vez em quando (se não daqueles que causam estragos enormes e fazem você mudar tudo, pelo menos uns pequenininhos assim, que lhe faz repensar no mínimo em “pintar as paredes de outra cor”). Realmente é gostoso não saber o que falar, ter medo de ouvirem a batida no seu coração de tão forte que ele pulsa, ficar lembrando minunciosamente de cada olhar e toque por mais bobo que tenha sido, fazer de cada detalhe de contato parecer avassalador... se apaixonar. Sim, é muito gostoso. E admito que foi bom pra mim esse “tremor” inesperado. Eu pude sentir que ainda sou vulnerável, que não perdi minha sensibilidade nem me tornei uma calculista egocêntrica. Que ainda choro por não ser desejada como gostaria, que nem sempre sou desejada... Que nem sempre consigo medir meus passos e pronunciar palavras ensaiadas, manter a postura ‘perigosa e dominadora’ e acabar sendo a preza fácil e indefesa. Que meu coração ainda consegue gritar mais alto que minha razão e se deixar levar pelas emoções. Que nem sempre estou no controle...
Mas ainda prefiro ter o quebra-cabeças montado na palma da mão.